Para a turma do Aécio, a guerra fria não acabou

Expressões rasteiras de conservadorismo circulam com frequência, tais como a "sovietização do Brasil" e a "ditadura comunista"

Expressões rasteiras de conservadorismo circulam com frequência, tais como a "sovietização do Brasil" e a "ditadura comunista"
Expressões rasteiras de conservadorismo circulam com frequência, tais como a "sovietização do Brasil" e a "ditadura comunista" (Foto: Roberto Bitencourt da Silva)


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Ideias descabidas têm sido veiculadas por amplos setores que aderiram à campanha de Aécio Neves. Expressões rasteiras de conservadorismo circulam com frequência, tais como a "sovietização do Brasil" e a "ditadura comunista". Pretensos argumentos que deixariam ruborizados alguns arautos do liberalismo brasileiro, como Eugênio Gudin e Roberto Campos. Em todo caso, personagens folclóricos como o roqueiro Lobão, e entidades caquéticas, como o Clube Militar, despudoradamente mobilizam o fantasma do "totalitarismo comunista", contra o PT e a candidata Dilma Rousseff.

Nos debates eleitorais promovidos essa semana, pela Band e o SBT, o próprio Aécio lançou mão de uma bobagem disseminada nos jornalões e nas redes sociais: "o governo federal está gastando dinheiro público com Cuba". Ora, convenhamos, um economista, formado por uma universidade reconhecida por sua excelência acadêmica, a PUC-MG, reiterar publicamente essa pseudodenúncia, é de uma pobreza intelectual incompatível com a instituição que o formou. Em nada contribui para o debate público. Pelo contrário. Apresenta uma expressiva veia despolitizante, ruminando preconceitos políticos arcaicos.

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O tal "financiamento cubano" nada mais é do que exportação de capital. Uma prática muito conhecida e utilizada pelas próprias potências capitalistas, que sempre auferiram altos lucros com isso. Recursos com retornos lucrativos ao Brasil, como prescreve a lógica capitalista. Nada de "comunismo".

Acompanhando os recursos financeiros exportados, aquecem-se os setores de serviços e demais atividades econômicas complementares do próprio país que viabilizou o empréstimo. No caso, tratando-se de porto e aeroportos na heróica ilha caribenha, ficam estimulados os serviços de engenharia brasileira. Aécio e a sua turma parecem conhecer apenas um capitalismo subserviente e passivo. Percebem o Brasil somente como destino do capital estrangeiro. Cabeças colonizadas.

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O elitismo da turma do Aécio, com suas histéricas desvalorizações das classes populares e trabalhadoras – as "massas ignaras" que "não sabem votar" e "não possuem racionalidade política" – guarda estreita relação com o pensamento do velho Gustave Le Bon. Mas, vejamos o suposto "comunismo" do PT.

Do ponto de vista econômico, o governo petista revela certos traços keynesianos. Apoiado no uso dos fundos públicos, no intervencionismo estatal, visa dinamizar a economia e incrementar a acumulação capitalista. Contudo, procura contemplar os ganhos empresariais com a geração de empregos e salários. Ademais, tem adotado uma política salarial que favorece o aquecimento do mercado consumidor interno. A tributação progressiva esposada por Keynes, no entanto, desde 2003, sequer é sinalizada pelo PT. Parafraseando a fórmula de André Singer, poderíamos classificar a sequência de governos Lula/Dilma como um keynesianismo tímido. Noves fora a inibição, trata-se de inspiração econômica em um ícone das reformas do capitalismo. Não da sua superação "comunista".

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O PT tem operado igualmente com preceitos neoliberais no terreno econômico. Um dos famosos ingredientes do tripé macroeconômico, o superávit primário, gera a alegria do setor financista e parasitário. Outro traço, não perceptível à turma do Aécio, diz respeito ao Bolsa-Família. O programa é expressão de um item do neoliberal Consenso de Washington, traduzindo uma política compensatória de garantia de renda mínima, para conter as mazelas geradas pela abertura comercial, o desemprego e as privatizações. Começou nos anos 1990 e foi ampliado, ganhando novos contornos, possivelmente transcendendo o próprio sentido neoliberal originário. Hoje contribui para a ampliação do consumo e dos negócios no mercado brasileiro. As águas não deixam de mover o moinho. Mas, para a turma do Aécio, isso é "comunismo" e "sustentação de vagabundos": uma curiosa "elite" que não entende muito bem o que é esse tal capitalismo que tanto dizem defender.

Sob o ângulo propriamente político, o PT tem governado com base nos pilares da democracia representativa. Afastou-se dos movimentos sociais e não adotou qualquer iniciativa que lembrasse a vaga da democracia participativa. Mergulhado no jogo da "governabilidade", busca ampla coalizão partidária para dar sustentação ao seu governo. Os próprios escândalos de corrupção em que se envolveu, revelam, como efeito colateral, o seu apreço às regras exclusivas da democracia representativa. Um sistema político que macula a imagem de qualquer partido, inclusive, com grande destaque, o próprio PSDB da turma de Aécio. Onde estão os "perversos" fantasmas do "bolivarianismo" e do "comunismo" que visam "atacar as instituições representativas"? No PT? Faltam óculos para a turma que se intitula "diferenciada".

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PT e PSDB são iguais? Entre segmentos mais radicalizados das esquerdas é comum ler e ouvir afirmações nesse sentido. A turma do Aécio acha que não. Alega que o PT possui o monopólio da corrupção, fonte de todos os males da política nacional. Uma piada de mau gosto. A privatização da Vale do Rio Doce, no governo FHC, bastaria como exemplo da corrupta dilapidação do patrimônio público pelos tucanos.

Uma política salarial estabelecida anos a fio pelos sucessivos governos petistas tem permitido a elevação da massa salarial e condicionado os setores privado e público – nas diferentes esferas da administração – a acolher as demandas dos trabalhadores por revisões sistemáticas dos salários. Uma política externa altiva e não subserviente aos EUA representa outro importante legado petista. Dois robustos diferenciais em relação ao PSDB.

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Concluídos 50 anos do golpe empresarial-militar de 1964, os setores conservadores veem "comunismo" por toda parte. Pensam que estão, como nos tempos de Jango, em meio à guerra fria. Veem "comunismo" no simples fato de que milhões de brasileiros não mais passam fome e conseguiram superar as barreiras da miséria. Décadas atrás, a mesma turma que hoje fecha com o Aécio, dirigia os seus ressentimentos elitistas contra as reformas de base lideradas pelo presidente João Goulart.

O alvo conservador e anticomunista em nossos dias é o PT e o seu modesto, mas importante, combate à miséria, entre outros manifestado no Bolsa Família. É oportuno lembrar, então, que nenhum item das reformas de base janguistas está posto na mesa petista. Reformas agrária, urbana, bancária, tributária, controle do capital estrangeiro. Reformas colocadas de lado. O fantasma "comunista" do PT não possui qualquer sentido. Entretanto, Aécio e a sua turma estão revivendo o elitismo e o vazio moralismo lacerdista. Considerando que a cantilena de Aécio e sua turma ainda atrai Dilma e o PT para esse terreno de discussão, empobrecem demasiadamente o debate político e a agenda pública da nação.

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