Do “esqueçam o que eu escrevi” ao “esqueçam que eu governei”

É simplesmente uma piada de salão, bem ao gosto deste tipo de intelectual, a afirmação de que "não dá para aceitar que os setores mais pobres da população sejam abandonados à própria sorte ou transformados em consumidores, em vez de cidadãos"

É simplesmente uma piada de salão, bem ao gosto deste tipo de intelectual, a afirmação de que "não dá para aceitar que os setores mais pobres da população sejam abandonados à própria sorte ou transformados em consumidores, em vez de cidadãos"
É simplesmente uma piada de salão, bem ao gosto deste tipo de intelectual, a afirmação de que "não dá para aceitar que os setores mais pobres da população sejam abandonados à própria sorte ou transformados em consumidores, em vez de cidadãos" (Foto: Leopoldo Vieira)


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No dia 16 de outubro, alguns intelectuais lançaram o manifesto "ESQUERDA DEMOCRÁTICA COM AÉCIO NEVES", noticiado como um grupo de pensadores históricos ligados ao PT supostamente descontentes com os rumos do país.

Em 10 tópicos, tudo o que foi escrito serviu para tentar fundamentar quatro sofismas:

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1) "A campanha petista no primeiro turno valeu-se de táticas e subterfúgios que desonram o bom debate. Caluniou, difamou e agrediu moralmente a candidatura de Marina Silva, sob o pretexto de que seria preciso fazer um "aguerrido" confronto político";

2)"A aliança programática que se constituiu em torno de Aécio Neves, impulsionada por PSDB, PSB, PPS e PV, entre outros partidos, e pelo apoio de militantes da Rede e de lideranças políticas expressivas, como Marina Silva, será importante para que se consolide uma perspectiva de renovação. Agregará mais pessoas comprometidas com a democracia. E ajudará a que se supere o quadro de estagnação polarizada em que se encontra a política nacional, criando um polo progressista novo, alargado e requalificado";

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3)"Aécio Neves e aliados representam uma oportunidade para que se retomem os fios rompidos da vasta tradição do reformismo democrático no Brasil. Seu governo poderá dar seguimento às vitoriosas políticas sociais dos últimos anos"; e

4)"Não aceitamos que se aprisione a sociedade num maniqueísmo "povo" x "elite", que leva os cidadãos a simplificar o que não pode ser simplificado".

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Em resumo, tentam passar um verniz sobre o transformismo da Marina Silva, que aderiu de mala e cuia, no primeiro turno, ao programa econômico do PSDB e, no segundo, ao próprio candidato tucano e refundar o messianismo pelo qual a Divina Providência a ungiria chefa da nação. Só que, agora, a simples presença dela seria a redenção dos pecados tucanos, uma espécie de perdão diluviano.

Ou, então, trata-se de intelectuais que, como dizia um "filósofo" – Olavo de Carvalho - que neste momento está no mesmo campo destes signatários: são meramente "umbigocêntricos".

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O que quer dizer estes quatro extratos do documento?

Que a eleição mais programática da história recente é uma farsa, tudo porque Marina perdeu o debate neste campo, motivo pelo qual ficou fora do segundo turno. E perdeu porque optou por ter seus minutos de pólo, expressando, de modo efêmero, as classes e grupos sociais às quais o PSDB historicamente representa no país. Culpa das escolhas dela, não do PT. Melhor seria Marina ter se declarado neutra ou nem ter chegado num vale-tudo para ganhar.

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Que a polarização elite x povo seria uma farsa montada por um partido autoritário, da "velha esquerda" que opera pela "velha política", quando na verdade ela é a dimensão sócio-econômica da polarização política PT X PSDB. Ou o que está em jogo não é a renda e a democratização das oportunidades? Ou, no fundo, o PSDB, seus ideólogos, apoiadores e líderes, não consideram nordestinos ignorantes, são contra as cotas, taxam o Bolsa-Família de "bolsa-esmola" e "sustentação de vagabundos", tentaram declarar o ProUni inconstitucional, incomodam-se com as bermudas nos aeroportos, preferem demonizar Cuba à permitir que médicos cheguem ao Brasil Profundo etc e tal?

Quem vê as assinaturas nota que poucos dali realmente ainda estavam com o PT. Emblemático disso é a assinatura de Francisco Weffort, que rompeu com o PT ainda pelos idos de 1994 para integrar o governo FHC.

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O recado almejado é simplório: "Nas eleições de 2014, nos decepcionamos com o PT", cumprindo um papel sinistro de levar a base social e eleitoral de Marina, que resiste em desembarcar no apoio a Aécio Neves, a esta encalacrada da consciência.

Eles sabem que manter programas sociais é incompatível com "não sei o que vai sobrar" dos bancos públicos, com a autonomia do BACEN e a inevitável crescente da taxa SELIC, com salários e empregos subordinados à inflação de 3%. Sabem que é mentira a afirmação dos próprios, portanto, de que "programas de grande impacto social, como o Bolsa Família, o Mais Médicos e o Minha Casa Minha Vida, podem e devem ser aperfeiçoados, reestruturados e ampliados". E sabem que não foi isso que os tucanos fizeram quando governaram. Fernando Henrique, nos anos 80, na discussão dos estatutos do PMDB, dizia que a verdadeira posição é a posição concreta. Pois é...vale para os tucanos após experimentarem oito anos de governo e para estes intelectuais ao analisarem aqueles governos tucanos.

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Quem declarou que o Estado precisava ser terceirizado e privatizado, que a Era Vargas deveria ser enterrada, não pode se comprometer com a ideia de que "o Estado precisa continuar a ser recuperado como fator de regulação econômica e de promoção do progresso social".

Eles sabem que nunca se fez tantas conferências nacionais, com tantos temas e criando tantos conselhos, além da Política Nacional de Participação Social e escutas à sociedade na elaboração e monitoramento do PPA e das leis orçamentárias. Sabem, então, que são desonestos ao dizer que "nossa meta é ajudar a que tenhamos um País onde o governo dialogue com a sociedade, onde haja mais participação e os movimentos sociais sejam ouvidos". Quando desenham um país "onde não se criminalizem as mobilizações populares", fingem esquecer que foi FHC que, em 2000, tentou enquadrar o MST na famigerada Lei de Segurança Nacional e que quem começou a espancar manifestantes na Paulista, em 2013, foi o governo de Geraldo Alckmin.

Eles sabem que não há comparação com os investimentos em saúde, educação, seguridade social, políticas para as mulheres, jovens, pretos, LGBTs, quilombolas. Mas, preferem dizer que Aécio significa um governo onde serão respeitadas "as minorias, étnicas e de gênero, as sociedades indígenas, as comunidades quilombolas e seus territórios, valorizando-se a educação, a saúde, a previdência e a Seguridade Social".

Pedem "um Brasil onde todos possam viver, trabalhar e conviver em paz", mas estão dispostos mesmo a bancar uma candidatura que põe 3% de inflação acima dos 20 milhões de empregos gerados nos últimos 12 anos. Ou será que esquecem, de novo, que a FGV detectou, no final da Era FHC, que o Brasil chegara a 50 milhões de indigentes?!

É simplesmente uma piada de salão, bem ao gosto deste tipo de intelectual, a afirmação de que "não dá para aceitar que os setores mais pobres da população sejam abandonados à própria sorte ou transformados em consumidores, em vez de cidadãos". Ou que "os direitos humanos não são negociáveis e nem se pode postergar a expansão dos direitos sociais e dos trabalhadores, seja mediante o aumento e a qualificação dos empregos, seja mediante a melhoria geral das condições de vida". Tiramos 28 milhões da extrema pobreza e alçamos 36 milhões à classe C, com um extenso portfólio de institucionalização de novos direitos nas mais diversas áreas, do torcedor à juventude. Chegou-se a mais de 60% de formalização dos postos de trabalho.

O desfecho é cínico como o pedido de Aécio para que não se olhe no retrovisor (e se passe do "esqueça o que eu escrevi" ao "esqueça que governei"): "Ela [a candidatura Aécio Neves] se mostra hoje o melhor caminho para a reforma da política, a recuperação das boas práticas de governo e a preservação das conquistas sociais tão duramente alcançadas nas últimas décadas". Como assim, "Bial"? Com a The Economist, a Standard & Poor's e seus patrocinadores? Com Malafaia e Bolsonaro?

Estes senhores fingem ser reflexão crítica o que é mais uma Teoria do Desenvolvimento Dependente, de um premiado sociólogo brasileiro (pela Biblioteca do Congresso dos EUA): uma encomenda da "Fundação Ford".

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