JN diz que lei de FHC para Petrobrás é boa, contanto que PT não use

Na "escalada" que abre o telejornal da Globo, a apresentadora Renata Vasconcellos, em tom melodramático, anuncia que "este ano, 90% dos contratos da Petrobrás foram feitos sem licitação"



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Acabou a campanha eleitoral (?), mas não parece. Na imprensa escrita do eixo São Paulo-Rio segue a artilharia contra o governo federal e, sobretudo, a Petrobrás. Em São Paulo, os dois grandes jornais (Folha e Estadão) e a revista semanal dos adeptos da "intervenção militar" não conseguem produzir praticamente nada que incomode o governo reeleito do PSDB.

Sobre o Estado mais rico e desenvolvido da Federação, aliás, além de não ter fiscalização da imprensa tampouco a oposição, na Assembleia Legislativa, poderá exercer de forma minimamente eficiente a fiscalização democrática do Executivo, já que diminuiu consideravelmente na última eleição.

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Aliás, a grande mídia – que tem estrutura para fiscalizar o poder – tem jornalistas "setoristas" acompanhando cada ato dos governos federal e da capital paulista, que são do PT, mas não há cobertura permanente do governo paulista. No Palácio dos Bandeirantes e na Assembleia Legislativa de São Paulo a grande mídia pouco dá as caras.

Enquanto isso, a maior emissora de televisão do país continua trabalhando duro para desmoralizar a Petrobrás enquanto empresa de economia mista. Em vez de mostrar como está sendo desbaratado um esquema criminoso na empresa que dura décadas incontáveis, o Jornal Nacional, na noite da última quarta-feira, tratou de inventar uma "irregularidade".

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Na "escalada" que abre o telejornal da Globo, a apresentadora Renata Vasconcellos, em tom melodramático, anuncia que "este ano, 90% dos contratos da Petrobrás foram feitos sem licitação". A frase de efeito chama atenção do espectador. "Sem licitação" significa que não foram exigidos critérios como menor preço e melhor qualidade na aquisição de equipamentos ou serviços.

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Em seguida, porém, a nova âncora do JN explica que "não tem nenhuma ilegalidade, nisso" porque "existe um decreto há 16 anos que permite a dispensa de licitação".

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Ah, bom... Mas, então, onde está o problema? Renata explica que, apesar da legalidade das contratações sem licitação, "há quem conteste a frequência com que isso tem sido feito nas condições atuais do mercado de petróleo".

A pergunta óbvia é sobre quais são essas "condições atuais do mercado de petróleo" que tornam inadequado o uso de um instrumento legal para dispensa de licitações. Em vez de explicar, a apresentadora do JN prefere responder, em nome do PSDB, à argumentação da Petrobrás de que o instrumento de dispensa de licitações não é novidade, pois foi criado em 1998 pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso:

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"(...) Um decreto do presidente Fernando Henrique Cardoso, de 1998, permite que a Petrobras siga um regime diferenciado nas contratações. Na época, foi uma saída para que a empresa tivesse mais agilidade nas tomadas de decisão e pudesse concorrer em igualdade de condições com empresas privadas (...)".

A "explicação" do Jornal Nacional faz sua a explicação do PSDB – ou até do próprio FHC. O telejornal, assim, converte-se em assessoria de imprensa.

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Contudo, ainda é preciso "explicar" ao telespectador por que uma lei que era boa no governo do PSDB é ruim no governo do PT. É nesse momento que entra em campo a decenal estratégia do JN para conferir um ar de verdade inquestionável às suas teses políticas: o recurso aos "especialistas".

Nesse caso, trata-se de Jerson Carneiro, professor de Direito do IBMEC. Seu diagnóstico, eivado de injunções políticas, explica por que uma lei que era boa quando usada no governo do PSDB é ruim ao ser usada no governo do PT:

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"A lei é boa, o problema é que as pessoas usaram esse fim, esse benefício, para que participasse do mercado mais ativamente para fins contra a causa republicana, que é o desvio de verbas que você está acompanhando"

Por "as pessoas", leia-se o governo Dilma Rousseff. A tese dele é a de que a Petrobrás sob o governo petista usa a dispensa de licitações criada por FHC para "desvio de verbas".

Foi preciso ir buscar um obscuro "especialista" de um obscuro Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) para "fazer o serviço" porque, segundo congratulações de seus alunos no Facebook, é raro que a instituição e seus quadros tenham uma boquinha como essa na mídia.

 

E a reportagem do JN prossegue.

"(...) A partir de 2008, com a descoberta do pré-sal, essa liberdade da Petrobras para celebrar contratos passou a ser cada vez mais questionada. O novo regime de exploração do petróleo determina que a estatal seja a operadora única em todos os blocos do pré-sal, limitando a competição com empresas estrangeiras (...)"

Bingo! Eis a razão da reportagem sobre nada, ou seja, sobre a Petrobrás usar um instrumento legal criado pelo governo FHC: o regime de partilha para exploração do pré-sal e a consequente determinação desse regime de que a Petrobrás seja a única empresa a operar a reserva petrolífera".

O que o Jornal Nacional chama de "limitar a competição" na verdade significa não deixar grupos estrangeiros obterem ganhos imensos só para perfurar e sugar sem risco o petróleo brasileiro já detectado nos campos do pré-sal.

E tome "especialistas". Agora, é Adriano Pires, diretor do CBIE, que faz outra lenga-lenga político-ideológica:

"Essa situação, onde a legislação é para um mercado de concorrência, e o mercado na prática é um mercado monopolista, cria uma atmosfera propícia para esses eventos que estamos vendo, que estão sendo revelados pela Operação Lava Jato"

Mais uma vez, a investigação de antigos esquemas de corrupção na Petrobrás é associada ao regime de exploração do pré-sal. O que o "especialista" chama de "mercado monopolista" é um regime de exploração que não entrega o petróleo a grupos estrangeiros que não correriam risco algum ao investirem na extração de petróleo em campos onde a existência do "ouro negro" já está assegurada.

Ao contrário do que dizem os especialistas, porém, o suposto uso mais intenso da dispensa de licitações neste ano se deve ao exponencial crescimento da empresa desde que o PT chegou ao poder. Em 2002, o faturamento da Petrobrás foi de 69 bilhões de reais; em 2013, foi de 304 bilhões de reais.

O Jornal Nacional fez, apenas, um ataque político-ideológico à Petrobrás que visa, meramente, o pré-sal. "Escandalização" de um processo de depuração de empresa comandado pela política de Dilma de investigar a fundo a corrupção pretende reverter o regime de partilha das novas reservas de petróleo brasileiras e nada mais. Tudo em atenção a interesses estrangeiros.

Ao fim da matéria de mais de três minutos sobre nada, porém, aparece outro "especialista" colocando as coisas no seu devido lugar. Gustavo Binenbojm, professor da Faculdade de Direito UERJ, mostra como o que fez a matéria do JN foi mais uma edição da boa e velha "escandalização do nada" que a Globo pratica contra governos do PT:

"Eu temo que se queira curar a febre colocando o termômetro na geladeira. Na medida em que os escândalos de corrupção que existem em licitações no Brasil, acometem tanto as licitações sujeitas à lei geral de licitações, a lei 8.666, quanto dentro da Petrobras licitações submetidas a esse decreto simplificado. Então é preciso encontrar um meio termo, encontrar uma solução de um regulamento de licitações que seja ágil o bastante para dotar a intervenção do Estado do domínio econômico de eficiência respeitando princípios básicos de impessoalidade, de moralidade e de transparência"

Eis o que acontece: coibindo a dispensa de licitações, a Petrobrás terá muito mais dificuldade em extrair petróleo do pré-sal. Licitações são demoradas, sofrem contestações na Justiça etc. Com isso, perde o país e ganham os que querem ganhar gordas comissões para entregar o petróleo às multinacionais através do sistema de concessão.

O regime de exploração de Petróleo que vigia no Brasil até que os campos do pré-sal fossem mapeados e as reservas de petróleo fossem confirmadas era o de concessão. Por ele, a empresa estrangeira vem, suga o petróleo, leva embora e só paga os impostos. O país fica com menos de um terço do lucro, enquanto que no regime de partilha fica com mais de dois terços.

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