Repressão contra a maconha não funciona, diz FH

Ex-presidente volta a defender a descriminalização da droga em artigo publicado na revista Marie Claire; "Pessoas que usam drogas não são criminosos a ser trancafiados em prisões", escreve o tucano, que sugere a regulação da erva; "Regular não é liberar, mas criar um sistema de controle"; diz não defender o uso da maconha, mas lembra que ela causa menos danos que drogas reguladas, como tabaco e álcool

Repressão contra a maconha não funciona, diz FH
Repressão contra a maconha não funciona, diz FH (Foto: Edson Lopes Jr.)


✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

247 - Num artigo publicado no site da revista Marie Claire, da editora Globo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso volta a defender a descriminalização da maconha e a regulação de toda a cadeira de produção da droga, a fim de "reduzir os danos sociais de sua proibição e enfraquecer o crime organizado". Alerta para o fato de que não incentiva o uso da erva, mas lembra que ela provoca mais danos do que drogas reguladas, como o cigarro e o álcool.

Leia abaixo a íntegra:

FHC: "Maconha provoca menos danos que tabaco"

continua após o anúncio

Quando fui Presidente da República, segui o senso comum sobre o tema drogas: investi em repressão, tentei erradicar cultivos e lutei contra o narcotráfico. Não esqueci da prevenção e criei a SENAD, cujo propósito era ensinar e não reprimir. Como tempo, percebi que, apesar dos esforços políticos, recursos investidos e vidas perdidas, a oferta e o consumo de drogas continuavam estáveis ou aumentando no Brasil e no resto do mundo.

Me dei conta de que a política de guerra às drogas não funcionava e havia transformando esse mercado ilegal em um fator de desequilíbrio social e político, principalmente na América Latina. Passei a estudar o assunto. A repressão às drogas, estruturada em torno da Convenção Única de Drogas da ONU, já dura mais de cinco décadas. Um tabu foi criado, alimentando a guerra, estigmatizando usuários e nos colocando na grave situação em que nos encontramos hoje.

continua após o anúncio

Nos últimos anos, com maior acesso à informação e acúmulo de conhecimento científico, o tabu começou a ser quebrado. Para ajudar a abrir e aprofundar o debate, lancei a Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia que deu lugar, em 2011, à Comissão Global de Política sobre Drogas. A primeira recomendação da Comissão Global é por fim à criminalização do usuário. Pessoas que usam drogas não são criminosos a ser trancafiados em prisões. Os dependentes devem ter acesso a tratamento e reintegração. A Comissão propõe também reavaliar a classificação de cada droga de acordo com seu dano.

A atual classificação de risco adotada pela ONU foi elaborada há 50 anos com base em evidências científicas limitadas. Os mais modernos estudos mostram que a maconha é uma droga que provoca menos danos e dependência do que substâncias lícitas e reguladas como tabaco e álcool. As estatísticas indicam que cerca de 80% das pessoas que usam drogas ilícitas consomem maconha e também revelam que o conceito de que a maconha leva ao consumo de outras drogas é mito: quem induz o usuário a provar entorpecentes mais pesados é o traficante.

continua após o anúncio

Por tudo isso, a sugestão é que governos experimentem com modelos de regulação da maconha para reduzir os danos sociais de sua proibição e enfraquecer o crime organizado. Regular não é liberar, mas criar um sistema de controle efetivo sobre toda a cadeia produtiva e de distribuição da maconha, com claras restrições de idade, preço e pontos de venda e acompanhado de forte trabalho de prevenção e educação.

Tem gente que diz que isso nunca funcionaria no Brasil, mas o sucesso da política de redução de danos do cigarro nos últimos anos mostra que é possível regular para reduzir o consumo. Por aqui, persiste a desinformação e certa tendência conservadora que associa a questão das drogas à pobreza e faz vista grossa para o consumo da classe média.

continua após o anúncio

Nunca fui usuário e não defendo o uso da maconha, nem de qualquer outra droga. Porém, sou pragmático e reconheço que a repressão falhou em seu objetivo de diminuir o mercado de drogas. Precisamos tentar novos caminhos. Países vizinhos como Uruguai, Argentina e Colômbia tem avançado na adoção de políticas mais humanas e eficazes de prevenção; até os EUA estão dando sinais claros de que apenas reprimir não resolve.

Fernando Henrique Cardoso é sociólogo e foi Presidente do Brasil de 1994 a 2002.

continua após o anúncio
continua após o anúncio

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Comentários

Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247

continua após o anúncio

Ao vivo na TV 247

Cortes 247