Uma breve história de Jango e Pelé
Um trecho do livro de João Vicente Goulart, filho do ex-presidente João Goulart, deposto por nosso outro golpe, o de 1964, exemplifica um pouco o que está em jogo quando o assunto futebol cruza a política brasileira; Vicente conta uma história entre Jango e Pelé, quando em um amistoso no Uruguai; Piazza foi dar um abraço em Jango e deu falta de Pelé; o relato de João Vicente revela o porquê
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247 – Um trecho do livro de João Vicente Goulart, filho do ex-presidente João Goulart, deposto por nosso outro golpe, o de 1964, exemplifica um pouco o que está em jogo quando o assunto futebol cruza a política brasileira. Vicente conta uma história entre Jango e Pelé, quando em um amistoso no Uruguai. Piazza foi dar um abraço em Jango e deu falta de Pelé. O relato de João Vicente revela o porquê.
“Certa vez a seleção brasileira estava em Montevidéu, hospedada no Hotel Plaza na Plaza Independencia, para um amistoso contra a seleção uruguaia, e os jogadores, então, decidiram ir ao nosso apartamento na Leyenda Patria para levar um abraço do Brasil ao meu pai.
Lembro que foi uma festa para os meus amigos, todos queriam ir lá. O capitão Wilson Piazza disse a meu pai: – Presidente, como vai? Os jogadores queriam vir aqui lhe trazer um abraço. Viemos almoçar no Cangaceiro e resolvemos todos vir até aqui convidá-lo para assistir ao jogo de quarta à noite.
– Eu te agradeço muito, Piazza. Isso para quem está longe de seu país é um gesto inesquecível – disse Jango, sorrindo e com um olhar muito doce.
Piazza, que era uma pessoa bem esclarecida, foi logo se desculpando. Jango não sabia do que se tratava e perguntou: – Mas o que houve, Piazza? Estou muito contente com a presença de vocês.
– Pois é, presidente, mas peço desculpas pela ausência de nosso Pelé. Ele disse que estava indisposto. Ele é muito medroso nessas questões e tem receio de ser mal interpretado pelos militares brasileiros.
– Não te preocupes, capitão. Só a presença de todos vocês aqui já me deixa muito orgulhoso, e tua coragem mais ainda.
Meu pai entendeu o medo do Pelé, mas eu, não. Só vim a entender depois, porque, na época, mesmo sendo ele um grande ídolo do futebol brasileiro, disse não se importar que o Brasil não tivesse eleições para presidente, governadores, senadores etc., porque o povo brasileiro não sabia votar mesmo. E essa era a mesma justificativa usada pela ditadura.”
João Vicente Goulart: Jango e eu: memórias de um exílio sem volta
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