Época produz 'jornalismo para ser esquecido'
"Quanto tempo deve durar uma reportagem de capa numa revista semanal de informação? Teoricamente, uma semana, a se considerar que a periodicidade de uma publicação determina o nível de profundidade dos temas tratados em cada edição, de modo a se manter o interesse de um grande número de leitores e fazer com que eles esperem pelas novidades da próxima edição", diz Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa, ao comentar a acusação recente de Época contra Lula, que fracassou em seu intento; "A rigor, o assunto começou a morrer no mesmo dia do lançamento"
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O jornalismo para ser esquecido
Não é por outro motivo que, em todo o mundo, as revistas são o meio mais vulnerável, entre os veículos tradicionais, no confronto com a mídia digital. O mais recente estudo da agência ZenithOptimedia, que avalia a eficácia dos investimentos em marketing e publicidade, mostra um cenário devastador para a media tradicional, no curto prazo.
A projeção da distribuição das verbas de publicidade entre 2014 e 2017 mostra que a internet móvel vai evoluir muito rapidamente, enquanto as plataformas fixas, como TV por assinatura, jornais e revistas, entram num período de pouca evolução ou de estagnação.
Curiosamente, o Brasil é apontado como um dos países com potencial para subir no ranking dos maiores investimentos em publicidade, ocupando a sexta posição numa lista que tem, logo acima, Estados Unidos, China, Japão, Alemanha e Inglaterra.
O cenário é bem distinto do que apregoam dirigentes das grandes empresas brasileiras de mídia, como se pode ler em artigo publicado na edição de terça-feira (5/5) da Folha de S. Paulo pelo presidente da Associação Nacional de Jornais (ver aqui), no qual o dirigente comemora o fato de algumas das maiores empresas da internet, como Google, Facebook e Apple terem aumentado seus anúncios em televisão, outdoor e jornal.
O cenário apontado por ele se refere principalmente aos Estados Unidos e à Inglaterra, onde esses grandes protagonistas do mundo digital adotaram a estratégia de relacionar seus serviços à credibilidade de alguns títulos tradicionais de maior presença global, como o New York Times,Financial Times e The Guardian. O passo seguinte será se apropriar dos conteúdos informativos e opinativos dispersos na internet e passar a ancorá-los para os antigos leitores de jornais e revistas.
Acusações, suspeitas, pesquisa
Por que outra razão as gigantes do mundo digital usariam as mídias tradicionais? Tem razão o presidente da ANJ ao dizer que “as grandes empresas do admirável mundo novo da comunicação buscam as mídias tradicionais para consolidar as marcas que construíram com tanta competência”. Ganhar a confiança do leitor de bons jornais é a maneira mais fácil e rápida de fechar o ciclo, somando a grande audiência trazida pelo relacionamento horizontal entre os usuários à credibilidade das melhores marcas da imprensa.
Mas, atenção: a utilidade dos veículos tradicionais se limita exatamente por sua credibilidade. Então, voltando à vaca fria e à decadência das revistas nesse cenário de alta competitividade, vamos exemplificar como a reportagem de capa de Época, citada nesta espaço na segunda-feira (ver “O jornalismo claudicante”), é jornalismo para ser esquecido.
Quanto tempo durou a edição da revista, a se considerar seu tema principal, que acusava o ex-presidente Lula da Silva de haver praticado tráfico de influência internacional em favor da empreiteira Odebrecht?
A rigor, o assunto começou a morrer no mesmo dia do lançamento, com um esclarecimento do Instituto Lula dizendo que havia respondido as perguntas da revista na quinta-feira (30/4), antes do feriado, explicação que foi depois ampliada no site da entidade (ver aqui).
Na terça-feira (5), o Estado de S. Paulo (ver aqui a versão digital, com título diferente da edição em papel) publica texto informando que a procuradora do Ministério Público Federal responsável pelo caso afirma que não há provas contra Lula e que ela não cogita tomar medidas como a quebra de sigilo, considerando que a reportagem que deu origem ao procedimento preliminar é tida uma notícia anônima.
O assunto foi levantado inicialmente pelo jornal O Globo, em abril, e depois explorado pela revista Época (ver aqui). Em seguida, o Globo obtém declarações de políticos oposicionistas dizendo que a reportagem vai justificar adesões a uma proposta de CPI para investigar o BNDES, que teria favorecido a Odebrecht (aqui).
O esquema é o usual: produzir um factoide, atrair o interesse de um integrante do Ministério Público e depois publicar novas reportagens, já apresentando o assunto como tema oficial de investigação.
A melhor análise dessa prática do jornalismo partidário pode ser apreciada na charge do cartunista Laerte (ver aqui), na Folha: como semear acusações, regar com suspeitas e colher com pesquisas.
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