Comandante, Fidel Castro é revolucionário ou ditador?

Com o ‘espírito’ do revolucionário e intelectual cubano José Martí e a mão de Ernesto Guevara de Lar Serna, médico nascido na Argentina que entrou para a História das revoluções do século XX como ‘Che’, o advogado Fidel Castro Ruz, preso no assalto ao Quartel de Moncada, após insurreição fracassada em 1953, chegou aos 90 anos e acredita que a ‘História o absolverá’

Com o ‘espírito’ do revolucionário e intelectual cubano José Martí e a mão de Ernesto Guevara de Lar Serna, médico nascido na Argentina que entrou para a História das revoluções do século XX como ‘Che’, o advogado Fidel Castro Ruz, preso no assalto ao Quartel de Moncada, após insurreição fracassada em 1953, chegou aos 90 anos e acredita que a ‘História o absolverá’
Com o ‘espírito’ do revolucionário e intelectual cubano José Martí e a mão de Ernesto Guevara de Lar Serna, médico nascido na Argentina que entrou para a História das revoluções do século XX como ‘Che’, o advogado Fidel Castro Ruz, preso no assalto ao Quartel de Moncada, após insurreição fracassada em 1953, chegou aos 90 anos e acredita que a ‘História o absolverá’ (Foto: Gisele Federicce)


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Renato Dias, especial para o 247

- Pátria livre ou morte!

Com o ‘espírito’ do revolucionário e intelectual cubano José Martí e a mão de Ernesto Guevara de Lar Serna, médico nascido na Argentina que entrou para a História das revoluções do século XX como ‘Che’, o advogado Fidel Castro Ruz, preso no assalto ao Quartel de Moncada, após insurreição fracassada em 1953, chegou aos 90 anos e acredita que a ‘História o absolverá’.

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- Como revolucionário ou ditador?

O doutor da Universidade Federal Fluminense [UFF], especialista em História Contemporânea, revoluções, socialismos e esquerdas revolucionárias e reformistas, o maior historiador da atualidade no Brasil, diz, com exclusividade ao Brasil 247, que uma avaliação mais ponderada - e definitiva – sobre o ‘velho barbudo’ ainda depende de tempo.

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Apesar disso, o escritor celebrado diz que Fidel Castro entrou para a história da América Latina como um notável líder nacionalista. Ele inscreve-se, porém na tradição nacional-esta­tis­ta de ‘Nuestra America’, frisa. ‘El Comandante’ também se asso­ciou à certa concepção revolucionária, a que chamo de ‘catas­tró­­fica’, muito em voga no século XX, explica o pesquisador.

- Concepções que sempre desembocaram na construção de ditaduras políticas.

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Ex-guerrilheiro urbano do MR-8 à época da ditadura civil e militar, um dos participantes da captura do embaixador dos EUA no Brasil, em 4 de setembro de 1969, Charles Burke Elbrick, um liberal, afirma que estas ditaduras, de início claramente revolucioná­rias, pelas transformações radicais ensejadas, metamorfosearam-se, gradativamente, em ditaduras conservadoras’

- No sentido próprio do termo - conservam uma ordem e um poder. 

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O estudioso avalia que, na galeria dos ditadores latino-americanos, Fidel Castro teve uma trajetória revolucionária, antes de se converter em conservador. O comunista manteve, no entanto, até hoje, apesar da longevidade desgastante de todo exercício de poder, um largo apoio popular, devido ao fato de ter sabido encarnar - e interpretar - o sentimento nacional, diz

 - Assim como as demandas por reformas sociais. Por isso tornou-se, como Getúlio Vargas [Presidente da República que fez a revolução de 1930 no Brasil, implantou a ditadura do Estado Novo e suicidou-se em 1954], e Juán Domingos Perón [Presidente da Argentina, marido de Evita, que morrera em 1974], um ditador amado, pelo menos por importantes segmentos da população cubana.

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Já o doutor e professor de Relações Internacionais da Uni­versidade Federal do ABC, Gilberto Maringoni, é taxativo: Fidel Castro entrará para a História como o último grande esta­dista do século XX e personagem lendário do século XXI. Não é um lí­der construído a partir de uma campanha de marketing, mas definido no calor das lutas internas e externas ao seu país, pontua ele.

Não há na História alguém, como ele, que tenha permanecido no primeiro plano na cena planetária por mais de cinco décadas, relata. Não é apenas líder inconteste de um enfrentamento heroi­co com a superpotência hegemônica, os EUA, mas um intelectual de rara envergadura, sublinha o também jornalista. Diante dele, a maioria de seus homólogos contemporâneos fica menor, destaca.

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- É um homem que colocou um país, diminuto e atrasado, no mapa da geopolítica mundial.

Diretor editorial do site nacional www.operamundi.uol.­com.br, especialista em Geopolítica Mundial, o jornalista Breno Altman afirma que o personagem se consolida, acima de tudo, como um líder disposto a desafiar as mais poderosas forças do planeta para defender o processo de transformações por ele comandado em Cuba. Uma pequena ilha no Caribe com 11 milhões de habitantes.

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Marxista, cometeu erros importantes, mas foi uma das principais referências, nos últimos cem anos, para quem repudia o capitalismo como destino intransponível da humanidade, analisa. Ganhou o respeito dos povos porque sempre foi um lutador incansável, que não se dobrava diante de seus inimigos e não recuava nem sequer para tomar impulso, enfatiza o repórter.

Vladimir Ilich Ulianov, advogado que emoldurava o seu rosto com um ‘indefectível cavanhaque’ e que adotara o codinome Lênin [Líder ao lado de Liev Davidovich Bronstein, ‘nom de guerre’ Leon Trotsky, da insurreição operária de outubro de 1917, na Rússia] foi a grande liderança revolucionária da primeira metade do século XX e Fidel Castro a da segunda metade, crê Breno Altman.

- Ainda influenciando fortemente as forças progressistas que brotaram no alvorecer do século XXI. 

Doutor do departamento de História da Universidade Federal de Goiás [UFG], David Maciel, aponta que o dirigente da revolução de 1º de janeiro de 1959, em Cuba, até então um ‘quintal dos Estados Unidos, que se tornou socialista em 1961, entrará para a história como o líder e principal animador da mais importante revolução social ocorrida na América Latina.

Uma revolução que trouxe avanços políticos e sociais impensáveis num país atrasado, colonial e periférico como era Cuba, antes de 1959, registra o professor. Uma revolução que mandou pelos ares a estratégia ‘etapista’ defendida pelo stalinismo e seus partidos comunistas, dispara. Deste ponto de vista a revolução cubana foi um feito notável, fuzila ele.

- Já que evidenciou que, com base no apoio e na mobilização populares, é possível desencadear uma revolução de perfil socializante tendo contra si condições tão desfavoráveis e por tanto tempo (lembremos o bloqueio econômico imposto pelos EUA ainda vigora!) Além disso, a revolução cubana irradiou-se para outras regiões periféricas não apenas pelo exemplo, mas pela prática internacionalista mais consequente.

De linhagem marxista, David Maciel, especialista em Redemocratização do Brasil, Nova República, Impeachment de Fernando Collor de Mello e da Era PT, analisa que, o fato de que ao longo do tempo a revolução perdeu seu viço e o processo revolucionário degenerou na criação de um capitalismo de Estado sob o governo autoritário da burocracia, não elimina este feito.

- Além disso, é importante frisar que de modo nenhum repetiu-se em Cuba o terror stalinista ocorrido na URSS [A extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, 15 países sob a hegemonia da Rússia Vermelha]. Em termos históricos, portanto, o Fidel Castro revolucionário é mais importante que o governante e o burocrata. Afinal, Cuba não é a URSS!

Marxista renovado, Romualdo Pessoa Campos Filho, historia­dor e doutor em Geografia, professor da UFG, especialista em Guerrilha e ditadura no Brasil, diz crer que a melhor maneira de compreen­der o papel desempenhado por Fidel Castro, na transfor­ma­ção geopolítica da América, é conhecer o significado da Ilha de Cuba para os interesses econômicos da elite estadunidense.

- Inclusive para grupos mafiosos que usavam dos cassinos para lavar dinheiro do crime organizado e, principalmente, entender o controle que os EUA exerciam sobre praticamente todo o continente americano, numa época de intensa guerra fria e delimitação de controle entre as duas potências que polarizavam o domínio geopolítico mundial – EUA & URSS.

A América Latina era vista, desde o final do século XIX - quando os espanhóis foram expulsos daqui na época do ‘big stick’ - como o quintal dos EUA, fuzila. O escritor de A Esquerda em Armas’, referência para Elio Gaspari, renomado jornalista, recorda-se da expressão ‘a América para os americanos’.

- Obviamente, aí entendido, ‘americanos’ como estaduniden­ses.

A ousadia de um grupo de guerrilheiros, posteriormente convertidos ao comunismo, e a liderança exercida de forma carismática por Fidel Castro, e também por Che Guevara, vitorio­sos na derrocada do poder do Império na pequena Ilha de Cuba, após intensa guerra de guerrilhas, tornaram-os personagens da história sempre presente por todos esses anos, avalia ele.

- O que os inseriram em vida nas páginas da história mundial e, principalmente, da América Latina.

Doutor da Universidade Federal de Goiás, [um trotskista que faz parte da seção brasileira da Quarta Internacional [Liga Socialista Revolucionária, LSR, controlada por André Ferrari, central mundial da revolução fundada por Liev Davidovich Brons­tein, em 1938, na França] Fernando Lacerda afirma que Fidel Cas­tro entra no século XXI com um legado profundamente contraditório

Fidel Castro Ruz, como todo lutador anti-imperialista que dialogou com o movimento comunista herdeiro do stalinismo, de um lado, representa os erros daqueles que milhares de lutadores socialis­tas herdaram no século XX, observa. Para assegurar a sobrevi­vência de Cuba, ele reproduziu o modelo do partido único, preconceitos stalinistas (como as concepções racistas, machistas e LGBTfóbicas) e sustentam, até hoje, dogmas do marxismo, atira.

- E da revolução.

No entanto, Fidel Castro e os trabalhadores de Cuba representam a resistência contra séculos de opressão e explora­ção, explica Fernando Lacerda. O que demonstra, na prática, que uma vida melhor é possível, mesmo em uma pequena e pobre ilha que enfrenta as danosas consequências do embargo econômico imposto pelos EUA [Estados Unidos da América], metralha.

- Este legado de luta e resistência é o que há de melhor para se aproveitar a partir da heroica revolução cubana.

Velho professor de História das redes pública e privada de ensino em Goiás, Reinaldo Pantaleão lembra que  o processo em Cuba, de 1959 a 2016, foi revolucionário. Erros até se estabelecerem as bases do socialismo, houveram, admite. Negar, porém,  a Fidel Castro a condição de um dos maiores líderes do século XX é desconhecer a história contemporânea, registra.

O bloqueio determinado pelos EUA é um crime, acredita o militante socialista desde a década de 1960 do século XX [Ele foi da Ação Libertadora Nacional, ALN, satélite de Cuba]. Fidel Castro teve pulso e coragem para enfrentar a situação, diz. Pela sua determinação, entrará para a história com um grande revolu­cionário, atira o ‘enfant terrible’. ‘Vida longa ao comandante’!.

Advogado, como Fidel Castro, o comunista Bruno Pena diz ao Brasil247.com que, como o homem que desafiou o impossível, venceu, e mostrou que a esperança de dias melhores não é uma utopia, Fidel Castro entrará para a galeria dos personagens dos séculos XX e XXI.  Um dos homens mais determinados de que tive notícia e pelo qual tenho profunda admiração e respeito, afirma.

- Enquanto nações distribuem soldados pelo Mundo, Fidel Castro distribuiu médicos. Tenho um retrato seu na parede do meu escritório.

O doutor em Ciências Sociais sob orientação do marxista Michael Lölwy, brasileiro radicado na França, Flávio Sofiati, é incisivo. Fidel Castro entrará para a História como um militante de esquerda que cumpriu o seu papel de sujeito revolucionário, insiste. Ele apropriou-se dos instrumentos de luta disponíveis em sua época e realidade social concreta, aponta o sociólogo.

Especialista em Geopolítica Mundial e em questões militares, o jornalista graduado pela Alfa, Frederico Vitor de Oliveira, informa ao Brasil247.com que Fidel Castro entrará para a história como uma das figuras mais importantes do século 20. Apesar de envolto às controvérsias, acusado de crimes contra a humanidade, será lembrado como ícone de resistência.

- Da luta pela emancipação social da América-Latina contra o imperialismo estadunidense.

A bancarrota econômica de Cuba teria se iniciado com o colapso soviético e agravado pelo embargo econômico imposto pelos EUA, registra. “Mesmo que sua figura esteja registrada nos livros de história como um líder tirânico que permaneceu à frente de Cuba por 49 anos, não se pode apagar sua importância como personagem que retirou uma pequena ilha do Caribe do isola­mento absoluto para o protagonismo mundial sob a Guerra Fria”.

- Ainda não sabemos se a história o absolverá. 

Serviço

Dica de leitura

Livro: ‘Pequenas Histórias – Cuba, hoje – Uma revolução envelhecida ou a reinvenção do socialismo. O reatamento das relações entre Havana e a Casa Branca’

Autor: Renato Dias

Fotografias: Juliana Dias Diniz

Para adquirir: [email protected]

 

Saiba mais

Cronologia

13 de agosto de 1926 - Fidel Castro Ruz nasce no vilarejo de Biran, leste de Cuba. Nascido na Galícia, Espanha, fronteira com Portugal, Seu pai era um rico proprietário de terras.

26 de julho de 1953 - Fidel Castro Ruz lidera um levante popular contra o ditador ligado aos EUA Fulgencio Batista, com um ataque derrotado aos quartéis de Moncada, Santiago de Cuba.

Maio de 1955 - Depois de ter ficado preso por causa do ataque e do célebre discurso de que a História o absolverá, o revolucionário Fidel Castro é anistiado e ruma para o México.

2 de dezembro de 1956 - Fidel Castro e 81 revolucionários chegam a Cuba no barco ‘Granma’. Eles partiram do México.  A maio­ria morre ou é dispersada, mas existem remanescentes - entre eles Raúl Castro, atual presidente de Cuba, e o médico argentino Ernesto Guevara de La Serna, conhecido como Che, que fogem para as montanhas de Sierra Maestra. A Guerra de Guerrilhas é  deflagrada.

1º de janeiro de 1959 – O ditador vinculado aos Estados Unidos Fulgencio Batista foge para a República Dominicana.

8 de janeiro de 1959 - Fidel Castro entra, triunfante, em Havana, depois de uma viagem pela Cuba revolucionária, em chamas. Comandante supremo das Forças Armadas, ele dá início às transformações políticas, econômicas e sociais em Cuba.

3 de janeiro de 1961 - Os Estados Unidos rompem as relações diplomáticas com Havana.

19 de abril de 1961 - Fidel Castro comanda as tropas para frustrar uma tentativa de invasão de exilados cubanos que contavam com o apoio dos EUA, na Baía dos Porcos.

7 de fevereiro de 1962 - Os Estados Unidos impõem o embargo econômico total.

Outubro de 1962 – É a chamada ‘Crise dos mísseis’. A presença de ogivas soviéticas em Cuba provoca um impasse entre Moscou e Washington. A eclosão de uma guerra nuclear não é descartada, mas a União Soviética retira os seus mísseis. Fidel Castro irrita-se com Nikita Kruschev, ucraniano comunista.

1975 – Comandante Fidel Castro Ruz decide enviar soldados cubanos para Angola para ajudar o governo de esquerda a combater rebeldes apoiados pela África do Sul e os Estados Unidos.

1980 – A fuga de Mariel, episódio retratado com brilhantismo na tese de doutorado do historiador Rickley Marques. Fidel Castro permite que 125 mil cubanos partam para os Estados Unidos, a maioria pelo Porto de Mariel.

1990 - O colapso da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas faz Cuba mergulhar numa grave crise econômica e social.

14 de agosto de 1993 - O governo de Fidel Castro põe fim à proibição do uso de dólares norte-americanos, numa das medidas hesitantes de abertura econômica de Havana.

5 de agosto de 1994 - Centenas de moradores de Havana fazem manifestações anti - Fidel Castro, nos maiores tumultos sociais desde a revolução cubana de 1º de janeiro de 1959.

Agosto-setembro de 1994 - Mais de 35 mil pessoas abandonam Cuba em jangadas e barcos improvisados, o que forçou os Estados Unidos a permitir 20 mil vistos legais de entrada a cubanos por ano.

24 de fevereiro de 1996 - Combatentes cubanos derrubam dois aviões norte-americanos de pequeno porte no estreito da Flórida, que pertenciam ao grupo exilado Brothers to the Rescue. Quatro tripulantes morrem.

21-25 de janeiro de 1998 – Anticomunista, o polonês papa João Paulo II faz a primeira visita de um pontífice a Cuba.

25 de novembro de 1999-28 de junho de 2000 - Saga Elián Gonzáles. Fidel Castro lança uma grande campanha pelo retorno do garoto cubano de 6 anos, resgatado no mar, próximo à costa dos EUA, depois de um naufrágio que matara sua mãe. Elián acaba voltando a Cuba.

23 de junho de 2001 - Depois de duas horas proferindo um discurso, Fidel Castro sofre um curto desmaio, devido ao cansaço e à exposição ao sol.

18 de março de 2003 – O revolucionário Fidel Castro Ruz lança uma operação de repressão à dissidência: 75 ativistas pró-democracia e jornalistas independentes são presos.

20 de outubro de 2004 – O presidente Fidel Castro quebra o joelho esquerdo e o braço direito numa queda depois de proferir um discurso no mausoléu de Che Guevara, em Santa Clara.

31 de julho de 2006 - Fidel Castro entrega temporariamente o poder ao irmão Raúl Castro, que participara ativamente da revolução de 1959, um marxista, depois de se submeter a uma cirurgia no intestino.

Agosto de 2016 – Fidel Castro completa 90 anos. Cuba reata as relações diplomáticas com os EUA. Há abertura economia no País.

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