Surfar no gelo. O prazer de romper as águas geladas

“Tudo que vale a pena conquistar requer o nosso sofrimento, só um pouco”, diz o fotógrafo de surfe Chris Burkard, ao explicar sua obsessão com as praias mais geladas, violentas e isoladas do mundo. Através de fotos impressionantes e histórias de lugares que poucos humanos já viram - e menos ainda surfaram - ele nos leva à sua “cruzada pessoal contra o mundano.”

“Tudo que vale a pena conquistar requer o nosso sofrimento, só um pouco”, diz o fotógrafo de surfe Chris Burkard, ao explicar sua obsessão com as praias mais geladas, violentas e isoladas do mundo. Através de fotos impressionantes e histórias de lugares que poucos humanos já viram - e menos ainda surfaram - ele nos leva à sua “cruzada pessoal contra o mundano.”
“Tudo que vale a pena conquistar requer o nosso sofrimento, só um pouco”, diz o fotógrafo de surfe Chris Burkard, ao explicar sua obsessão com as praias mais geladas, violentas e isoladas do mundo. Através de fotos impressionantes e histórias de lugares que poucos humanos já viram - e menos ainda surfaram - ele nos leva à sua “cruzada pessoal contra o mundano.” (Foto: Gisele Federicce)


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Nas ondas das Ilhas Aleutas

 

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Vídeo: TED – Ideas Worth Spreading

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Fotografias: Chris Burkard

Tradução: Viviane Ferraz Matos. Revisão: Maricene Crus

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Fotógrafo e surfista, Chris Burkard viaja a locais remotos, arriscados e gelados para conseguir imagens extraordinárias do surfe praticado em lugares impensáveis.

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Para muitos, o surfe evoca lugares tropicais, cheios de sol, areias brancas e muito calor. Mas em seu livro “Distant Shores”, Praias Distantes, Chris Burkard nos mostra os litorais da Noruega, da Islândia e do Alasca, enquanto sufistas cavalgam ondas em praias geladas que raramente tinham sido fotografadas antes – para não dizer que nunca até então tinham sido visitadas por surfistas.

 

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Chris Burkard fala no TED, em Vancouver, Canadá.

 

Ao viajar para lugares quase sempre perigosos, onde reinam condições extremas, com o objetivo de revelar paisagens desconhecidas, Burkard compõe imagens que transcendem as simples tomadas fotográficas de ação para colocar a própria natureza no centro das suas composições.

 

Galeria de fotos feitas por Burkard:

 

Em 2013, na Islândia

 

Em 2013, nas ondas de inverno do litoral da Califórnia

 

No norte da Noruega, em 2014

 

Nas Ilhas Aleutas, em 2013

 

Entre os gelos do litoral da Islândia, em 2013

 

Sempre nas Ilhas Aleutas, em 2013

 

Na região de Alerta, norte do Canadá, em 2014

 

No Alasca, em 2014

 

Sob uma linda aurora boreal, no extremo norte da Noruega, em 2014

 

No Alasca, em 2013


A paisagem tira-fôlego do norte da Noruega



Acampado na praia gelada



No Alasca, a paisagem que se descortina é renovada em cada curva de estrada



Vídeo:

 

 

Tradução integral da palestra de Chris Burkard no TED:

 

Se eu contasse a vocês que essa era a cara da pura alegria, vocês me chamariam de doido? Eu não os condenaria, pois sempre que olho para essa selfie no Ártico, tremo um pouquinho de frio. Quero contar a vocês um pouco sobre essa foto.

Eu estava nadando pelas Ilhas Lofoten, na Noruega, bem no Círculo Polar Ártico, e a água do mar estava congelante. O ar? Um vento forte de 10°C negativos, e eu pude literalmente sentir o sangue tentando sumir das minhas mãos, pés e rosto, e corri para proteger os órgãos vitais. Foi o frio mais intenso que já senti. Mas mesmo com lábios inchados, olhos fundos e bochechas vermelhas, descobri que esse lugar aqui é onde encontro grande alegria.

Bem, em relação à dor, o psicólogo Brock Bastian provavelmente descreveu melhor ao escrever: “A dor é uma espécie de atalho para a atenção plena. Ela nos faz subitamente conscientes de tudo no meio ambiente. Ela brutalmente nos empurra para uma consciência sensorial virtual do mundo semelhante à meditação.”

Se morrer de frio é uma forma de meditar, então me considero um monge.

Antes de entrarmos no porquê, alguém já desejou surfar em água supergelada? Adoraria dar a vocês alguma perspectiva de como pode ser um dia da minha vida.

Homem: Sei que estávamos esperando por boas ondas, mas acho que ninguém pensou que isso iria acontecer. Não consigo parar de tremer. Estou com tanto frio.

Chris Burkard: Então, fotógrafo de surfe, certo? Nem sei se isso é nome de uma profissão, para ser sincero. Meus pais achavam que não, quando falei aos 19 anos que deixaria o emprego por essa profissão tão sonhada: céu azul, praias tropicais, e um bronzeado que dura o ano todo. Para mim, era só isso. A vida não podia ficar melhor. Suando, fotografando surfistas nesses locais turísticos exóticos. Mas só havia um problema. Quanto mais tempo eu gastava viajando para esses lugares exóticos, menos gratificante parecia ser. Planejei buscar aventura, e só encontrava rotina. Coisas como wi-fi, TV, bom jantar e uma conexão constante de celular que para mim eram as armadilhas de lugares com muito turismo dentro e fora do mar, e não demorou muito para eu começar a me sentir sufocado.

Comecei a ansiar por locais selvagens, lugares ao ar livre, e então fui em busca de lugares tidos como frios demais, distantes demais e perigosos demais para o surfe, e esse desafio me intrigava. Comecei um tipo de cruzada pessoal contra o mundano, pois se há uma coisa que percebi, é que em qualquer profissão, mesmo uma como o aparente glamour como é o caso da fotografia de surfe, existe sempre o perigo de tudo se tornar monótono.

Assim, na busca por quebrar a monotonia, percebi algo: apenas cerca de um terço dos oceanos da Terra tem água morna, e é apenas essa estreita faixa ao redor do equador. Então se eu fosse encontrar ondas perfeitas, provavelmente seria em algum lugar frio, onde os mares são muito violentos e foi exatamente lá que comecei a busca. E foi em minha primeira viagem à Islândia que senti ter encontrado exatamente o que procurava.

Fiquei impressionado com a beleza natural da paisagem, mas o mais importante, eu não acreditava que tínhamos encontrado ondas perfeitas em uma parte do mundo tão distante e com relevo tão acidentado. Num momento, chegamos à praia e vimos pedaços maciços de gelo empilhados à beira do mar. Eles criavam essa barreira entre nós e o surfe, e tivemos que remar por uma espécie de labirinto para chegar à formação das ondas. E ao chegar lá, empurrávamos de lado os pedaços de gelo para pegar as ondas. Foi uma experiência incrível que nunca esquecerei, porque no meio dessas condições adversas, senti como se tivesse caído em um dos últimos recantos de paz, onde encontrei uma clareza e uma conexão com o mundo que nunca pensei encontrar em uma praia lotada.

Fui fisgado. Fui fisgado. (Risos) Mares gelados estavam constantemente em meu pensamento, e dali para frente, meu trabalho focou esse tipo de ambiente primitivo e impiedoso, e ele me levou a lugares como Rússia, Noruega, Alasca, Islândia, Chile, Ilhas Faroe e muitos outros lugares. E uma das coisas favoritas sobre esses lugares era simplesmente o desafio e criatividade necessários para chegar lá: horas, dias, semanas gastas no Google Earth tentando localizar um trecho distante de praia ou recife onde pudéssemos ir. E, ao chegarmos lá, os veículos tinham que ser igualmente criativos: “snowmobiles”, carros soviéticos de combate com seis eixos, e uns dois voos de helicóptero super rústico. (Risos) Helicópteros realmente me dão medo, por falar nisso.

Houve um agitado passeio de barco lá na costa da ilha de Vancouver até um local de surfe, meio distante, onde acabamos vendo do mar. Indefesos, os ursos saquearem nosso acampamento. Eles foram embora com nossa comida e partes da barraca, claramente avisando que estávamos na base da cadeia alimentar e que aquele era o espaço deles, não o nosso. Mas para mim, aquela viagem foi um testamento à vida selvagem que troquei pelas praias turísticas.

Agora, só quando viajei para a Noruega... (Risos) eu realmente aprendi a apreciar o frio. Esse é o lugar onde algumas das tempestades mais fortes e violentas do mundo produzem ondas imensas que quebram na linha costeira. Estávamos nesse fiorde estreito, distante, no Círculo Polar Ártico. A população de ovelhas era maior do que a de pessoas, então, se precisássemos de socorro, não haveria onde encontrar. Eu estava no mar fotografando surfistas e começou a nevar. A temperatura começou a cair. E disse a mim mesmo: “Sem chance de você sair do mar. Você viajou tudo isso, e é exatamente o que você desejava: condições congelantes e ondas perfeitas.” E apesar de não sentir o dedo para pressionar o disparador, eu sabia que não iria sair. Então fiz o que dava para fazer. Mas foi nesse momento que senti o vento soprar forte pelo vale e me atingir, e o que começou como uma neve fina logo se tornou uma nevasca, e comecei a perder a percepção de onde estava. Não sabia se estava sendo levado para alto-mar ou para a costa, e tudo o que eu conseguia perceber era o som fraco das gaivotas e ondas quebrando.

Eu sabia que esse lugar tinha reputação de afundar navios e aviões, e enquanto estava lá boiando comecei a ficar um pouco nervoso. Na verdade, estava totalmente em pânico e estava ficando hipotérmico, e meus amigos acabaram tendo que me ajudar a sair da água. E não sei se estava delirando ou o quê, mas depois eles me disseram que mantive um sorriso no rosto o tempo todo.

Bem, foi nessa viagem e provavelmente nessa experiência em que comecei realmente a sentir que cada foto era preciosa porque, de repente, naquele momento, era algo que fui forçado a conseguir. E percebi, todo esse tremor realmente me ensinou algo: na vida não há atalhos para o prazer. Qualquer coisa que valha a pena conquistar vai requerer sofrimento, só um pouquinho, e esse pouquinho de sofrimento que tive pela fotografia, agregou um valor ao meu trabalho muito mais significativo para mim do que apenas preencher as páginas das revistas. Vejam, deixei uma parte de mim mesmo nesses lugares, e o que levei de lá foi um sentimento de satisfação que sempre busquei.

Então volto a essa foto. É fácil ver os dedos congelados e a roupa de neoprene congelada e até a luta que foi para chegar lá, mas acima de tudo, o que vejo é pura alegria.

Muito obrigado.

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