Antecedente trabalha pelo afastamento de Nardes

"Para quem ainda  acredita que a ideia de que o ex-deputado da Arena Augusto Nardes deve ser afastado da função de relator das contas do governo Dilma no TCU é um simples exotismo, cabe conhecer um episódio de 2005", aponta o colunista Paulo Moreira Leite; "em março daquele ano, o ministro Lincoln Magalhães da Rocha foi forçado a renunciar à relatoria de uma  representação que pedia a exoneração de parentes de deputados que foram contratados pela Câmara sem passar por concurso público", relembra; o motivo é exatamente o mesmo: ele antecipou seu voto pela imprensa, o que é proibido pela Lei Orgânica da Magistratura; leia a íntegra

Brasília- DF- Brasil- 19/11/2014- O ministro Augusto Nardes, do TCU, vai dar uma palestra sobre desafios de governança - contas públicas, no auditório do STJ. (Valter Campanato/Agência Brasil)
Brasília- DF- Brasil- 19/11/2014- O ministro Augusto Nardes, do TCU, vai dar uma palestra sobre desafios de governança - contas públicas, no auditório do STJ. (Valter Campanato/Agência Brasil) (Foto: Paulo Moreira Leite)


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Para quem ainda  acredita que a ideia de que o ex-deputado da Arena  Augusto Nardes deve ser afastado da função de relator das contas do governo Dilma no TCU é um simples exotismo cabe conhecer um episódio de 2005.    

Em março daquele ano, ocorreu um caso semelhante. O  ministro Lincoln Magalhães da Rocha foi forçado a renunciar à relatoria de uma  representação que pedia a exoneração de parentes de deputados que foram contratados pela Câmara sem passar por concurso público.

O pedido de renúncia foi feito pelo presidente do TCU na época, Adylson Motta, e apresentado pelo Ministério Público Federal. Ambos reagiram a uma situação idêntica aquela que se verifica dez anos mais tarde.

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A causa foi a mesma, informa a Folha de S. Paulo da época: os dois "consideraram inaceitáveis as declarações feitas pelo ministro dando a entender que iria rejeitar o pedido (de exoneração)". 

Vejam só. Para começar, não estamos falando de um parlamentar que obteve sua indicação para o TCU na bacia das almas das negociações do Congresso.

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Lincoln Magalhães da Rocha era advogado de profissão, jurista por formação. Hoje é professor na Universidade de Brasília. Dois anos antes do debate sobre nepotismo, recebera o premio "Global Alumni", oferecido pela Southern Methodist University, nos Estados Unidos, em função de "feitos e serviços consideráveis" na área de Direito. Mesmo assim teve de abandonar o caso.

Ele havia antecipado sua decisão, como Nardes? Nada disso. Suas declarações podem preencher 2 000 páginas de em reportagens de jornais e revistas, como acontece agora? Também não.

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Lincoln apenas se permitiu argumentar – ele garante que se tratava de uma conversa reservada, e não uma entrevista formal – que era a preciso encarar a denúncia de nepotismo com argumentos que ia além do simples laço de parentesco. Lembrou que a simples contratação de parentes pode ser condenada sempre que envolvia "má prática administrativa", isto é, quando envolvia pessoas sem preparo para a função. Caso contrário, quando envolvesse o pedido de exoneração de um cidadão apto para a função, a medida "discriminaria a família legalmente constituída."

Sem entrar no mérito da representação, o procurador Lucas Rocha Furtado pediu o afastamento de Lincoln lembrando o  artigo 36 da Lei Orgânica da Magistratura que impede ao magistrado "manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem."

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Este mesmo artigo 36, sabemos todos, tem sido usado para questionar a relatoria de Augusto Nardes, acusado de exibir um comportamento ainda mais  inapropriado. Chegou a reunir-se com lideranças dos partidos políticos que pretendem usar a sentença do TCU para obter o impeachment da presidente. No encontro estavam Ronaldo Caiado, Aécio Neves, Agripino Maia. Imagino do que conversaram.

Há dez anos, o artigo 36 serviu para alvejar Lincoln Rocha por uma entrevista que, segundo ele próprio, era uma conversa em "off" onde falou "em tese". Ironicamente, os parentes denunciados haviam sido indicados por Severino Cavalanti e Ciro Nogueira, estrelas notórias do Partido Popular, último partido a que Augusto Nardes foi filiado antes de iniciar a carreira no TCU.

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As diferenças, entre um caso e outro, trabalham contra Nardes. Não se trata de um depoimento – em off ou não – a um jornal. Não é uma conversa abstrata, uma teoria  geral sobre determinado assunto, mas um caso específico, com nome e endereço. São vários depoimentos, inclusive gravados pelo rádio.

Com todo respeito que uma denúncia de nepotismo merece, é preciso estabelecer uma diferença. Até hoje o mundo real da política ainda discute os casos em que a contratação de parentes pode ser aceita – e quando deve ser denunciada.

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A análise das contas de Dilma envolve aquela que pode ser a mais relevante decisão da história do TCU e não pode ser tratada com leviandade. Os interesses envolvidos são óbvios. Os riscos para a democracia também.

O vazamento regular e permanente da decisão de Augusto Nardes não é fruto de um acaso, ou descuido. Envolve um método de trabalho, um esforço para manter as esperanças da oposição em conseguir interromper o mandato da presidente sem apoio numa única prova concreta. Através das pistas de Nardes, a oposição conseguia matéria prima para convocar protestos pela saída da presidente. 

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Com ajuda de meios de comunicação empenhados no afastamento da presidente,  Nardes fez sua parte para criar um clima político capaz de intimidar o tribunal e abrir as portas para um golpe de Estado. Cada um pode ter a opinião que quiser sobre as pedaladas fiscais. Já escrevi sobre isso neste espaço, ontem.

O desrespeito pela Lei Orgânica da Magistratura é apenas o primeiro passo para o desrespeito pela Lei Maior.

Alguma dúvida?

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