Ao defender Levy, Lula deixou a porta entreaberta. Quem vai passar por ela?

Lula apoiou Leyy, mas este teria que reduzir o ajuste para expandir o crédito e sinalizar crescimento. E é nesta porta entreaberta que reside a chave da situação da conjuntura

O Ministro da Fazenda, Joaquim Levy durante reunião com senadores da base aliada (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
O Ministro da Fazenda, Joaquim Levy durante reunião com senadores da base aliada (Marcelo Camargo/Agência Brasil) (Foto: Leopoldo Vieira)


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Os jornais deste início de feriado prolongado dão conta de uma delicadíssima situação política para o governo.

Nove grandes empresários do País jantaram com Joaquim Levy para ditar as condições de apoio à presidenta. A conta da blindagem articulada pelo vice-presidente Michel Temer não tardaria a chegar. Isso coincide com uma reação do ministro da Fazenda, em 03/09, que se queixou a Dilma, com o devido vazamento na imprensa, de que se sente enfraquecido, sobretudo por estar se sentir perdendo a disputa política sobre os ajustes no orçamento e na economia para o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. A Nelson é creditado a redução da meta fiscal e o envio da Lei Orçamentária Anual com déficit para o Congresso Nacional.

O ministro da Fazenda, por óbvio, busca retomar sua liderança que, como se ventilava e ficou explícito com este verdadeiro desagravo, com direito a faca no pescoço presidencial por meio de um telefonema, representa o alto empresariado nacional, o sistema financeiro privado e as agências de risco mundiais e, portanto, o interesse do grande capitalismo internacional. Os áulicos que acreditaram que o golpe estava desvanecido após o apoio do PIB e da Globo à desmobilização do Impeachment, quem sabe, agora podem enxergar que se tratava de um golpe branco por trás do golpe branco: o efetivo cumprimento da agenda derrotada nas urnas, que serve, por suposto, a estes atores que jantaram com Levy, sendo o PSDB apenas sua expressão política na condição de empregado útil. Encontraram um atalho e foi isso que gerou a confusão generalizada no ninho tucano. Foi um: sosseguem, que vamos fazer do nosso jeito.

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E o elegante achaque financeiro deu resultado. A presidenta imediatamente convocou Michel Temer, o chefe da Casa Civil e Nelson Barbosa para uma reunião com foco em manifestar apoio ao ministro da Fazenda. Antes mesmo, fez sozinha sua declaração de apoio. Em seguida, pediu ao ex-presidente Lula, ao que parece, para fazer o mesmo. Lula fez, mas deixou a porta entreaberta: apoiou Leyy, mas este teria que reduzir o Ajuste para expandir o crédito e sinalizar crescimento, de olho na base social do projeto que ele inaugurou e segue sendo a maior referência, ainda mais em tempos de 7% de aprovação do governo e de popularidade da presidenta.

E é nesta porta entreaberta que reside a chave da situação da conjuntura.

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Os 9 PIBs que estiveram com Leyy apresentaram a conta com nomes e números: a) manter o grau de investimento do país, b) buscar meta de 0,7% de superávit em 2016 e c) cortar subsídios e programas do governo. Sentiram o delicioso cheiro do Desenvolvimentismo no ar após as supostas vitórias de Barbosa. Esta plataforma é nada mais, nada menos do que a tradução da mensagem ao PSDB: deixa com a gente bancar o nosso programa que vocês empunharam na campanha.

Todavia, um ministro da Fazenda que entrou no governo o indemissível todo-poderoso messias da tecnocracia liberal a resolver os problemas fiscais e econômicos precisar gritar na imprensa suas derrotas "técnicas", exigir apoio público da presidenta e do vice, do maior líder popular da história recente do País e fiador deste projeto para com o povo, jantar com cúpula do PIB é um ministro que está muito fraco e o está por seu principal demérito: o Ajuste é um fantasma, afinal que "ajuste" é esse com meta fiscal de 0,5% e 30 bi de déficit orçamentário?

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Perdeu para a democracia, cuja expressão eleitoral - o Congresso - resistiu, seja por tais e quais motivos mais honestos ou desonestos, mais golpistas e achacadores ou não, a engolir, diante de seus eleitores, um pacote devastador de popularidade. Perdeu para a democracia, também porque o sindicalismo e os movimentos sociais reagiram. Perdeu para a democracia, ainda mais, porque as classes C, D e E, que compunham a base da presidenta e deste projeto derrubaram a popularidade do governo. Perdeu para a economia, porque esta foi moldada em mais de uma década a funcionar com base em mecanismos estatais que permitiram combinar estabilidade, crescimento econômico e distribuição de renda com mobilidade social.

O Ajuste "levyano" não funcionou porque ele depende do empresariado e este deixou claro, no esforço de reduzir a SELIC, com desonerações à indústria e expansão do crédito do primeiro mandato, que não banca o desenvolvimento e que seu espírito animal se reduz a transferir seus rendimento, paradoxalmente, advindos do incremento estatal até mesmo para financiar a produção e exportação de bens primários (commodities), para aplicações financeiras. O que falta ao economicismo pollyaneiro perceber é que o boicote empresarial foi amenizado pela ação firme do Estado. Por isso, blindam Levy.

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Parece estranho, mas é evidente: enquanto o Ajuste estiver na pauta, mais sinais ao rentismo, mais rendimentos, mais desgastes presidenciais, mais sinais ao rentismo, mais rendimentos até entabularem a agenda completa, só que devagar.

Essa história que agora alguns argumentam de que todos os estados do País tiveram déficit, mas só o governo federal e criticado, ou que se mantida a política fiscal do primeiro mandato da presidenta Dilma, com a tendência da curva da arrecadação e da dívida, estaríamos pior sem o Ajuste é oficialismo barato. A verdade, nua e crua, foi dita por Beluzzo [na Revista Brasileiros]: "O ajuste foi feito de cima para baixo, sem a consulta das bases sociais que votaram na presidenta Dilma. Ela foi eleita com 54% dos votos.Cidadãos que subiram na escala social com a valorização do salário mínimo e o Bolsa Família. Os sindicatos e os movimentos sociais deveriam ter sido consultados". E completa: "A nossa Troika está aqui: é representada pelo mercado financeiro e pela visão truncada e míope de seus economistas", exatamente "as pessoas da sala de jantar". E foi ao ponto: "O país precisa solucionar dois problemas fundamentais, os 'cadáveres enterrados': a valorização do câmbio nos últimos 20 anos, que provocou um processo de desindustrialização. E o sistema tributário injusto. Nada menos do que 58% da receita dos impostos é paga pelas camadas de renda de até dois salários mínimos". Em resumo, construir a saída da crise só será eficaz com diálogo social com vistas à concertação com sua base social, não mera escuta e recepção, com medidas que a contemplem para criar força para a reforma de base tributária necessária.

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Então, é preciso romper a bifurcação representada pela pergunta: qual a base que fará este projeto, liderado por Dilma, filiada ao PT, seguir adiante nestes termos?

Notícia no Brasil 247 desta semana dizia assim: "A fim de 'organizar o País', os setes governadores do PMDB se reunirão na próxima semana com o vice-presidente, Michel Temer, e com os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha; a ideia é trabalhar numa pauta de reformas para o País, voltada para as áreas da previdência, tributária e trabalhista". Paulo Hartung arrematou: "Precisamos de reformas estruturais no nosso país".

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Não foi o diretório nacional do PMDB que propôs, mas seus governadores, presidentes do Senado e Câmara, vice-presidente da República, que, claro, contarão com apoio dos ministros no governo. O PMDB está na ofensiva, tomando a iniciativa, apresentou uma plataforma ao País - a Agenda Brasil - e agora se imiscui na seara das reformas estruturais. E, enquanto assessores presidenciais não cessam de perder tempo para que a chefa do Executivo mantenha um estéril esforço de enviar mensagens apenas ao parlamento (e não ao povo que a reelegeu), como é nítido na declaração de 04/09 a quatro rádio do estado da Paraíba - "o princípio da estabilidade deve orientar todos" - o espaço vai ficando cada vez mais vazio, porém, sendo cada vez mais ocupado pelo próprio PMDB, com sua legitimidade de ter o vice-presidente, ministros de estado, parlamentares, governadores, prefeitos e ser o aliado principal da coalizão governamental. Foi este tipo de postura inerte, que fez com que o PMDB fosse o partido a capitalizar a concertação, num primeiro momento, com os empresários e a mídia. E, por isso, Michel Temer declarou também apoio à Levy, após o já referido jantar. Está se legitimando cada vez mais como a voz deste setor no governo, uma vez que que ele deixou o PSDB em "stand by" a ver se "dá jogo" o sucesso peemedebista de emplacar a agenda deles por dentro, sabendo que o partido fora chamado para preservar a estabilidade institucional pelo comando do governo. Mudaram o "queijo" para preservar as "facas" numa racionalidade política coerente, quase perfeita em seus atos cênicos e que, parece, ninguém no governo percebe. Ou se percebe acabrunha-se na "espontaneidade do cansaço", como diria Tarso Genro. Não demora, e quem chama a concertação com a classe trabalhadora e movimentos sociais é o PMDB. Do jeito deles, claro.

Quem atribuiu aos "tempos estranhos" uma primeira reação do PMDB "fritando" Levy é quem só entende de teoria politica e não de política em si. Um mero raciocínio academicista põe na "direita" o PMDB e Levy e, claro, confunde-se. Mas, o PMDB é um partido popular, grande, dirige o maior número de prefeituras, tem a segunda maior bancada na Câmara e a maior do Senado. Uma política econômica que engessa a liberação de emendas parlamentares, ocupação de cargos e, ainda por cima, põe em suas costas um enorme desgaste, irá resistir. Porém, acertado isso, como foi em certa medida, está resolvido. Temer não é e nunca foi golpista, mas ninguém renuncia ao poder já ensinava um sábio russo...e, por isso, deu seu recado: é difícil governar quatro anos com 7% de aprovação.

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Culpar o PT enquanto partido é desonesto. Há muito apresentou uma plataforma. O governo tem em mãos o programa de governo não lançado, as resoluções do V Congresso do PT, a Agenda da Classe Trabalhadora da CUT, teve uma oportunidade imensa com a elaboração do PPA...Quem tem que tomar a iniciativa é o governo Dilma, assumindo seu espaço. É dele que o povo espera respostas.

Neste sábado 05/09 será lançada a Frente Brasil, reunindo o movimento sindical, social e partidos de esquerda. No dia 07/09, Dia da Independência, acontecerá o Grito dos Excluídos. Ambos com a pauta de resistir e derrotar a agenda conservadora, retoma o crescimento, as políticas e os direitos sociais e avançar para as reformas estruturantes.

Mais uma chance!

Se fosse um assessor presidencial, um funcionário de terceiro escalão do governo ou coisa que o valha aconselharia a presidenta a enviar seu ministro da participação social à Belo Horizonte neste sábado e recebia o comando do Grito no dia 07. Seria um grande sinal e uma excelente oportunidade para, de novo, tentar empatar o jogo e recuperar o protagonismo. Ou, como disse o Blog do Zé Dirceu: "propor e receber propostas sobre como retomar o crescimento, preservar empregos e salários, avançar na promoção de direitos e das reformas de base que o País necessita e as urnas aprovaram. É preciso incorporar os interesses dos trabalhadores e dos setores populares no debate nacional. Os empresários e outros partidos da base aliada já fazem este debate, por meio da Agenda Brasil e de uma pressão permanente, com a participação da imprensa, sobre o governo".

Foi para isso que Lula deixou a porta entreaberta.

A onça está ensaiando beber água, enquanto muitos, no governo, admiram os japiins.

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