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Jean Menezes de Aguiar

Advogado, professor da pós-graduação da FGV, jornalista e músico profissional

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7×1 é ‘vergonha’ – será?

A seleção perdeu feio. Assistir 5 gols em menos de meia hora foi surreal. Chegar a um placar negativo de 7 é estarrecedor. Mas não se pode querer que o time nem o povo se sintam humilhados

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A cobrança sobre a seleção brasileira pela imprensa e grande parte do público acerca do resultado terrível de 7 a 1 para Alemanha tem agregado um fator que desafia atenção: a ‘vergonha’. Até esta semana não havia qualquer vergonha, humilhação ou infâmia, como se passou a ouvir de uma hora para outra após o 7 a 1. Assim, uma única derrota, ainda que estrondosa, pode gerar ‘vergonha’?

Tudo bem que não é uma derrota qualquer, não mesmo. É um recorde negativo em vários aspectos. Mas continua sendo uma única derrota. Quando muitos não querem aceitar a derrota como um ‘acidente’ de percurso, entra em cena a intolerância. E um sensacionalismo da grande mídia, claro. A derrota, mesmo um 7 a 1 pertence a qualquer disputa. Tanto pertence que existiu.

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O problema parece estar em não se querer aceitar que a seleção ‘pudesse’ perder. Não se quis dar este direito a ela. Esquece-se o principal, que aquilo é um jogo e o melhor vencerá. Simples assim? Sim, simples assim. E assim foi. Para reforçar, não se pode esquecer que o time estava sem o craque maior e seu capitão titular.

Artur Xexeo no artigo ‘A culpa é do psicológico’ deitou e rolou na dependência que Felipão tem com esta coisa ‘psi’. Algo mais para malandras palestras motivacionais do que treinamento sério, tático e intensivo. Tudo era ‘chama a psicóloga’, como zombou corretamente Xexeo.

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Quando o jornalista ou mesmo o torcedor insere na análise a intolerância para carimbar a derrota como ‘vergonha’ ou ‘infâmia’ há um comprometimento sério na leitura. Fica patente um consumismo mimado de que só vitória interessa, não a disputa. O fim da ideia de que ‘competir é o que importa’, para a ideia substituta de que ‘vencer é a única opção’ vem gerando essa horda de mimados fanáticos. São homenzarrões que abrem o berreiro nos estádios e, por exemplo, agridem ou largam a esposa quando o time perde um campeonato. Isso quando não matam o torcedor rival.

É ‘vergonhoso’ perder em uma competição? Quer dizer, disputar e perder? Há aí indagações interessantes. Perder de 1 e ser desclassificado ‘pode’. Mas perder de 7 e ser identicamente desclassificado fez inserir este outro sentimento, a ‘vergonha’. Alguns dizem ‘humilhação’.

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Quando muitos falam em vergonha exercem uma ‘cobrança’. Põem o dedo na cara do outro. Pensam como credores de um comportamento alheio, de um resultado. Como se a expectativa de vitória desse a eles um crédito e ao jogador uma obrigação. Daqui a pouco terá torcedor querendo cobrar dano moral na justiça porque seu time perdeu.

Essa cobrança do comportamento é uma forma de consumismo que dá vazão a uma forma de vingança pessoal. Assim, não foi o agente cobrador que perdeu, mas o outro, afinal ele insere vergonha na conduta do outro, não na dele própria.

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Tudo isso é um manejo consumista do desejo, do sonho. Haverá este consumo feliz quando o resultado for vitorioso. Mas haverá o consumo com cobrança e intolerância na derrota.

Há diversas causas aí. A religião é uma delas. Muitos querem que o gol tenha sido obra do divino, do mito, de algum deus de plantão. Os agradecimentos em campo com o dedo apontando para o céu bem o demonstram. A Fifa já pediu para que jogadores se abstenham de levar para os gramados seus ritos religiosos. Mas quem a Fifa pensa que é perto de um deus? Se é assim, a vitória é divina e talvez o treino e a preparação possam ser mais suaves ou malandros, afinal Deus não é brasileiro? Se é, traiu o Brasil.

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Na entrevista após o jogo (só na entrevista!) a comissão técnica da seleção se saiu bem. Conseguiu não se deixar sofrer a carnificina da grande imprensa que buscava uma primeira página sangrenta. Ou confessional. Coisas como lágrimas, arrependimentos viscerais e autoflagelação. Ninguém ali é bobo. Já conhece o padrão-abutre dos jornalões e TV com sua busca pelos 5 fatores: medo, pânico, caos, escândalo e terror. O problema é que jogo não é entrevista.

Renato Maurício Prado, poderoso especialista em futebol, disse que ‘Nunca antes na história desse país, a seleção brasileira foi tão humilhada numa Copa’. O mestre exagera no termo. Humilhação é um fator que requer uma conduta ofensiva do agente adversário. A Alemanha não humilhou ninguém. Portou-se com extremo profissionalismo e ética na partida. Cobrar humilhação da seleção brasileira talvez não seja o mais exato.

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O antropólogo Roberto DaMatta entrevistado no O Globo, logo no dia seguinte, 9.7.14, ensina: “Existem ganhadores e perdedores. Ganhar e perder são elementos constitutivos da estrutura de uma competição”. Mas este equilíbrio mental, esta organização na interpretação de um esporte que passou a difundir fanáticos como o padrão de amor à camisa, não se quer. A sociedade da intolerância só quer saber dos fanáticos. Galvão Bueno com sua voz de gasguita se orgulha em dizer que o torcedor é ‘fanáááático’. Como se fanatismo não fosse uma patologia.

A seleção perdeu feio. Assistir 5 gols em menos de meia hora foi surreal. Chegar a um placar negativo de 7 é estarrecedor. Mas não se pode querer que o time nem o povo se sintam humilhados ou envergonhados. Humilhação é outra coisa, não pode se dar com um ‘mero’ jogo de futebol.

Agora é pegar a Holanda e se virar como puder. E torcer para que a querida irmã Argentina seja a campeã do mundo. No Brasil, o que nos deve envaidecer muito.

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