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Daniele Barbosa Bezerra

Doutora em Educação (UFC), professora, pesquisadora de gêneros biográficos e memorialísticos, contista e cronista.

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A cidade e a quarentena

As pessoas se entreolham com desconfiança nas ruas, se usamos as máscaras, ninguém chega perto, acreditando estarmos contaminados; se não as usamos, o olhar de repreensão pela negligência em tempos de pandemia é contumaz. A apreensão pela ameaça oculta e o não entendimento do que está acontecendo é visível a todos

(Foto: Divulgação)
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A cidade encontra-se num silêncio nervoso, o ar quente anuncia uma chuva intensa num futuro próximo que não chega. As pessoas se entreolham com desconfiança nas ruas, se usamos as máscaras, ninguém chega perto, acreditando estarmos contaminados; se não as usamos, o olhar de repreensão pela negligência em tempos de pandemia é contumaz. A apreensão pela ameaça oculta e o não entendimento do que está acontecendo é visível a todos.

Fortaleza é uma cidade litorânea e junto ao sol cáustico, ao mar bravo e ao bafo quente não são mais avistados turistas como em dias comuns, e sim um grande número de moradores em situação de rua. Encontram-se acolhidos pelas calçadas vazias, pelos bancos de cimento, pelo céu nublado e por luzes de néon, sem terem a ideia do momento grave por que passamos. Uns falam que ouviram algo sobre uma doença, outros apenas sentem que a cidade não é mais a mesma. Vez por outra, um atleta amador corre pela orla, sem enxergá-los, acreditando que o suor afasta qualquer vírus nefasto. 

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O presidente da terra brasilis, homem rude, vil e afeito a piadas de mau gosto vai à TV, com dinheiro público, incitar a população a quebrar a quarentena. Quem não pode ruir é a economia brasileira, o mercado financeiro; o microempresário (aquele que pensava que era elite), dono de pequenos comércios e serviços, já sente o que é quebradeira e percebe que não é olhado com a mesma generosidade pelo governo dos ricos. Ontem, conversei com a minha cabeleireira, e a profissional me confessou que as contas já se acumulam, todavia não tem previsão de pagá-las. Pensou até em agendar horários rigorosos com os seus clientes, mas encontra-se receosa. A ameaça do inimigo invisível paira no ar, e uma medida estadual proíbe a abertura desse tipo de comércio na quarentena.

Após o discurso do presidente-fascista-miliciano, os meninos obedientes e bem nascidos de Fortópolis, na pérfida companhia dos seus pais, passaram cinicamente a fazer carreatas pelas áreas nobres de poucos nobres; em carros hermeticamente fechados, mascarados, conclamando a população para que volte ao trabalho. 

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Enquanto isso, no lado dito menos nobre por algum sacripanta, os pequenos comércios não estão totalmente cerrados, já entenderam que são órfãos do governo, é cada um por si e deus por todos. A população periférica que já não tinha como ficar dentro de suas minúsculas casas, passou a encarar o vírus pelas ruas, respaldada pelo discurso presidencial, como se o medo tivesse dado uma trégua. Afinal, o ex atleta de flexão de pescoço alcunhou a pandemia, que está dizimando a população de vários países, de gripezinha. “Vamos às ruas, ao trabalho, tá ok?” 

Por aqui, como se entendesse o relincho presidencial, Zequinha, minha calopsita macho de penugem canarinha patriota, abriu a portinhola do seu viveiro e partiu, deixando uma grande saudade na casa em quarentena. 

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