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Ângelo Cavalcante

Economista, cientista político, doutorando na USP e professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG)

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A gramática do golpe

A gramática do golpe é a mesma gramática do subdesenvolvimento que nos bloqueia e empata em dilemas internos e externos por cinco dramáticos séculos; efetivamente, são outros termos e categóricos, sobremaneira técnicos, para uma mesmíssima narrativa de colonização e que nos entorpece e reifica secularmente

Rio de Janeiro - Alunos da Uerj ocupam o campus da universidade no Maracanã, em protesto pelo não pagamento das bolsas dos estudantes e dos salários de servidores terceirizados (Tânia Rêgo/Agência Brasil) (Foto: Ângelo Cavalcante)
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O discurso oficial é o do equilíbrio das contas públicas; do saneamento orçamentário; da redução de empenhos e compromissos financeiros e públicos outros. Como a direita midiática tenta nos lobotomizar permanentemente, a palavra de ordem agora é: "cortar na carne".

Para cada passo dessa tragédia, novos argumentos e "chavões" vão sendo criados e lançados no cotidiano do povo brasileiro; antes do golpe se tinha os "esquerdopatas", "o comunismo no poder", "a aliança bolivariana"; o "chavismo" a nos governar; a retomada militar (como se houvera alguma habilidade dos militares na macroeconomia de 1960/1970!); o Foro de São Paulo, este "perigoso komintern" latino-americano a ameaçar a "maravilhosa" vida social e política no subcontinente; a "cubanização" do Brasil, este demoníaco movimento que tenta usurpar nosso gracioso "paraíso tropical" até redundar, por fim; na pérola maior da farsa: a tal da "pedalada fiscal".

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A mídia é que não conta, mas jamais houve tantas "pedaladas" (aditivos, complementos e suplementos orçamentários) como nestes seis infames meses de Temer.

Bom... Vencida essa fase, realizada a ignominiosa farsa do impeachment, o tempo do crime exige evidentemente, nova gramática, novos conceitos, percepções e que tal qual observamos, estão acontecendo aos borbotões! A coisa mudou! A gramática do golpe, tática e esteticamente se utiliza de abstrações e tecnicalidades como "equilíbrio das contas públicas", "austeridade fiscal", "responsabilidade fiscal", "PEC 241", "PEC 55", "contenção", "contingenciamento orçamentário" dentre outras.

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A ordem é convencer! É preciso urgentemente construir uma aura de seriedade, sobriedade, responsabilidade e para esse fim, não tem outra, o melhor a ser feito é adentrar fundo e pleno no "muito puro", no "casto, neutro e imparcial" mundo da técnica; nos seus específicos e nuanças e nesse sentido, nada é mais apropriado do que o uso e abuso do economês de cepa neoclássica, neoliberal; do seu utilitarismo maçante; de sua verborragia saxã e; de sua álgebra do absurdo feita e fundida n'alguma paragem do inferno.

Nessa circularidade, vai se potencializando a muito falsa ideia de que a "técnica" não é coisa de políticos, afinal, política é "coisa de corruptos" e sendo assim e por oposição, a "técnica" é o lugar da "pureza", das "boas intenções" e "distante" do miserável plano do desiderato humano.

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Francamente, isso é de um cretinismo sem-fim; falso em suas partes e em sua totalidade e abertamente autoritário na medida em que a burocracia com sua lógica dura, fria e rígida se levanta como aberta negação da política, da vida social, portanto do mundo do trabalho e todos já sabemos que burocracia de verdade segue comandos, determinações, lógicas binárias e, portanto, se opõe frontalmente a qualquer debate político ou princípios minimamente democráticos. Burocracia boa é "per si"!

Não nos esqueçamos... Direita existe para guerrear! Não dá um passo, não move um cílio se não for para garantir força e potência para sua guerra, para sua causa, sempre, é claro, de caráter privado e particularizado. Evidentemente, o discurso oficial é aglutinador e de linda sonoridade: do "bem comum", da "nação", do "povo", da "integridade nacional". E confesso: me espanto como essa parla farisaica é eficaz! Cola muito!

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No mundo real, no entanto, mundo de homens e mulheres de carne e osso; do trabalho sub-remunerado e do capital super-remunerado, a coisa é beeeeemmmm diferente!

O país já está entregue para máfias privadas; para grandes e ágeis estruturas do capital. Para ligeiro exemplo, o Banco Central do Brasil (BC), entidade responsável pelas políticas monetárias do país, é governado pelo binômio Bradesco/Itaú. Ilan Goldfajn, seu atual presidente, é simples e tão somente, economista-chefe do Banco Itaú.

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O governo golpista de Temer, mais perdido do que cachorro quando cai de caminhão de mudança, não sabe o que fazer com o país; nada apresenta, nada demonstra e no constrangimento integral que impõe ao quartel-general do golpe, vai no repeteco e canibaliza a carne putrefata de um neoliberalismo ortodoxo já abandonado, inclusive, por pensadores conservadores da economia.

É governinho sem criatividade, inventividade ou liderança e seis meses depois do advento de sua lástima ao poder, o governo federal nada, mas absolutamente nada, diz sobre crise dos estados e que, linhas gerais, deixou ao "deus dará" serviços públicos essenciais, abandonando por conseguinte, as próprias populações.

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Em Goiás, por exemplo, terreiro de tucanos, a educação chegou ao seu limite de abandono e precariedade e já é Educação como entidade pública e de direito privado; profissionais da saúde resistem por quase dois meses em ativa e militante greve e o "presidenciável" Perillo (Imaginem isso!?) mestre na arte de ignorar se esconde entre risos, buffets e coquetéis da hecatombe e que ele mesmo criou.

Em São Paulo, a pátria tucano-fascista de maior envergadura e militância, mais do mesmo... Falência escancarada de serviços essenciais como saúde, educação e transporte. Façam esse teste: Tentem usar o metrô ou qualquer ônibus de São Paulo entre dezessete horas e dezoito e trinta de qualquer dia útil!

Mesmo as reconhecidas universidades públicas e estaduais de São Paulo seguem trôpegas para o cadafalso da privatização, terceirização e é claro, precarização, mas muita precarização, das relações de trabalho de seus técnicos e docentes e sem a qual, será impossível "fazer caixa" (inclusive "caixa dois"!) para a "modernização estatal" (leia-se: entrega das estruturas e atividades eminentemente públicas para o setor privado!) e tão abobalhadamente propalada por economistas e planejadores do PSDB.

O cientista social Carlos Eduardo Martins (UFRJ) inspirado em diversos autores críticos, trombeteia a oportuna ideia de certo caos ou falência sistêmica e que arrasa com a própria civilização ou com o atual e fracassado projeto de civilização. Tendo a concordar com sua hipótese mas é preciso considerar que se existe uma crise sistêmica (de fato, existe!) e que em definitivo, não é uma casualidade, um espontaneísmo histórico é imperioso e pedagogicamente necessário identificar a racionalidade, principalmente política, que nos conduziu para essa "des-modernização" do mundo. Refiro-me às ideias que inspiraram essa marcha anti-humana; as ideologias que nos conduziram para esse barbarismo global e que apetece entre bytes, smarth phones, pokémons e redes sociais.

O Brasil é parte viva e ativa desse caos sistêmico e a grande questão é que essa direita, rentista, financeira e entreguista, intensifica nossa precipitação como país, nação e povo rumo a uma distinta forma de existência individual ou coletiva assentada em mais dependência e colonização, colonização intelectual, principalmente.

A gramática do golpe é a mesma gramática do subdesenvolvimento que nos bloqueia e empata em dilemas internos e externos por cinco dramáticos séculos; efetivamente, são outros termos e categóricos, sobremaneira técnicos, para uma mesmíssima narrativa de colonização e que nos entorpece e reifica secularmente.

Talvez meninos e meninas do ensino secundário e que lotam escolas - agora sim, convertidos em efetivos e verdadeiros locais de educação - possam, tomando-nos pelas mãos, nos ensinar a escrever nova e necessária gramática.

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