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José Marcus de Castro Mattos

Poeta, psicanalista

32 artigos

blog

Agamben e o Estado de Golpe no Brasil

Por que Estado de Golpe e não mais Golpe de Estado? Porque o Golpe de Estado foi concluído com a deposição de Rousseff e a entronização do esbirro Temer na Presidência da República. A partir de agora o país encontra-se em Estado de Golpe

Por que Estado de Golpe e não mais Golpe de Estado? Porque o Golpe de Estado foi concluído com a deposição de Rousseff e a entronização do esbirro Temer na Presidência da República. A partir de agora o país encontra-se em Estado de Golpe (Foto: José Marcus de Castro Mattos)
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Por que Estado de Golpe e não mais Golpe de Estado?

Porque o Golpe de Estado foi concluído com a deposição de Rousseff e a entronização do esbirro Temer na Presidência da República (Setembro/2016).

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A partir de agora o país encontra-se em Estado de Golpe, qual seja, o conglomerado político/jurídico/policial/midiático desmentiu a Lei Como Árbitro e instalou a 'lei como arbítrio'.

Noutros termos, tal conglomerado renegou a Constituição Federal/1988 (Lei Como Árbitro) e impôs a direta e imediata vontade de seus membros como o elemento que pode doravante demarcar seja o modus operandi das instituições seja o modus vivendi da nação brasileira ('lei como arbítrio').

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Ao fazê-lo, o conglomerado político/jurídico/policial/midiático mergulha o país em um campo estamental não mais regido pela estabilidade (ainda que ideal) do arbitramento da Lei, subsumindo-o ao fim e ao cabo àquilo que os especialistas têm denominado de 'lei em movimento':

♦ Para fazer valer sua vontade a urdidura golpista cria ao sabor das circunstâncias dispositivos aparentemente legais, esvaziados a cada momento, no entanto, de imputação e/ou ancoramento em garantias constitucionais até então vigentes (no caso, aquelas fornecidas pela Constituição Federal/1988).

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Esses dispositivos caracterizam-se pela (no sentido jurídico do termo) abdução da Cidadania referida à Carta Magna pactuada em 1988, confrontando-a desarmada simbólico/discursivamente seja à vontade dos interesses golpistas seja ao arbítrio legiferante desses mesmos interesses.

Assim, dispositivos jurídicos antes franca e claramente cobertos pela Lei Como Árbitro – guardiães portanto da Cidadania – são instrumentalizados como oficiadores circunstanciais desta ou daquela 'operação', lançando de antemão os 'acusados' na condenação, na reprovação e no escárnio públicos.

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Os exemplos do rebaixamento perverso da Lei Como Árbitro à 'lei como arbítrio' aí estão, envergonhando e deixando perplexos os que tentam pautar suas existências pela lucidez: 01) a condução coercitiva travestida em 'você é culpado', 02) a delação premiada travestida em 'salve-se quem puder' e 03) ambas travestidas em 'vazamento midiático' cujos destinatários são os arremedos de cidadãos boquiabertos à frente das bancas de jornais, das televisões, dos computadores, dos smartphones...

(Acrescente-se a estes exemplos o absoluto escândalo do 'domínio do fato' – eis o travestimento da condenação sem provas – e estaremos consumadamente entregues à no man's land aberta pelos golpistas.)

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Evidentemente, a bárbara transmudação da Lei Como Árbitro para 'lei como arbítrio' não é inocente, posto que ao mote 'combate à corrupção' – espessa cortina de fumaça lançada aos olhos dos desavisados – subjaz a verdadeira intenção daquele conglomerado, a saber, desconstruir por completo o capital simbólico do Partido dos Trabalhadores (PT) junto às massas e neutralizar (ou mesmo impedir), ato contínuo, a candidatura de Lula à eleição presidencial de 2018.

A 'lei como arbítrio' é pois a abjeta ferramenta com a qual a Casa-Grande – as classes dominantes brasileiras mancomunadas, como de praxe, aos imperativos geopolíticos dos Estados Unidos – faz ver à Senzala que o poder econômico-político continuará sob seu comando e que, feitas as contas, o Estado Democrático de Direito pós-1988 jamais deveria ter ultrapassado as soleiras das portas nas quais os 'senhores' limpam suas botas...

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Neste contexto há flagrante homologia entre o atual Estado de Golpe em curso no Brasil e aquilo que Agamben cognominou de 'paradigma de governo dominante na política contemporânea', qual seja, o 'deslocamento de uma medida provisória e excepcional para uma técnica de governo' capaz, como tal, de 'transformar radicalmente a estrutura e o sentido da distinção tradicional entre os diversos tipos de constituição' (cf. AGAMBEN, G. Estado de exceção. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004. Trechos extraídos da apresentação da obra pela editora brasileira).

Como se sabe, Agamben nomeou muito apropriadamente tal paradigma de 'Estado de Exceção', complementando-lhe o conceito ao afirmar que o mesmo 'apresenta-se como um patamar de indeterminação entre Democracia e Absolutismo' (cf. AGAMBEN, G. Idem).

De fato, o Estado de Golpe em nosso país assemelha-se na quase totalidade de seus aspectos ao conceito agambenano de 'Estado de Exceção', sobretudo no tocante ao 'patamar de indeterminação':

♦ O desmentido da Lei Como Árbitro e a subsequente ocupação do espaço público pela 'lei como arbítrio' aloca a Cidadania em uma plataforma jurídico-política violentamente subsumida ao voluntarismo de interesses não mais mediados, como tais, por representantes (legais e legítimos, em última instância) capazes de – exata e precisamente – impedir a colonização do espaço público pelo voluntarismo...

Numa palavra, apenas e tão-somente a Lei Como Árbitro pode obstaculizar a apropriação da Cidadania pelo voluntarismo dos interesses e situá-lo em um 'campo transcendental', vale dizer, posicioná-lo em um espaço-tempo cujas linhas são uma a uma traçadas pela simbolização, e, pois, pela inscrição desse voluntarismo no âmbito rigorosamente discursivo da Res Publica – a qual será então protegida, cuidada e (por que não?) co-memorada –.

Ora, fundeada na Lei Como Árbitro – portanto, na simbolização estruturante das discursividades –, a Res Publica não admite nenhum 'patamar de indeterminação', muito menos aquele oriundo do voluntarismo de interesses:

♦ No caso brasileiro, há à partida radical incompossibilidade entre o Estado Democrático de Direito (1988: Democracia Representativa, Cidadania Inclusiva e Soberania Popular) e o Estado de Golpe/Estado de Exceção (2016: desmentido perverso da Lei, 'lei em movimento', 'lei como arbítrio', etc).

Entretanto, embora correto o diagnóstico agambenano atém-se à dimensão conjuntural dos fenômenos sócio-jurídico-políticos, não alcançando pois o estatuto lógico-estrutural dos mesmos, a saber, o Estado de Exceção e/ou Estado de Golpe é efeito do processo de 'dessimbolização' intrínseco à captura e à subsunção do Campo Discursivo (subjetividades, sociedades e culturas) pela cópula entre o Capital e a Ciência (Tecnociência).

Por outras palavras, – como esplendidamente demonstrou Dufour em A arte de reduzir as cabeças: sobre a nova servidão na sociedade ultraliberal (2005) –, a reprodução globalizada e maximizada do dispositivo capitalista-tecnocientífico exige cada vez mais a eliminação de elementos simbólicos/representantes interpostos entre o 'fluxo constante de mercadorias/capitais', de tal maneira que tudo e todos restem dessimbolizados – logo, sem mediadores que os representem/signifiquem uns para os outros ('isolados juntos', dirá Lacan) – e por fim dóceis à expansão planetarizada do Capital a braços com a Ciência...

Aí estamos:

♦ A abrupta neutralização da Lei Como Árbitro e sua substituição pela 'lei como arbítrio' – inauguradora, no atual caso brasileiro, de um Golpe de Estado/Estado de Golpe – situa-se inteiramente no bojo da dessimbolização global promovida pelos agenciamentos capitalistas e tecnocientíficos, desconstruindo nosso jovem Estado Democrático de Direito e lançando os restos da Soberania Popular (pivô desse Estado) aos abutres.

Resistamos – juntos, porém não-isolados – ao arbítrio.

Do blog Golpeachment

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