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Alex Solnik

Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão" e "O domador de sonhos"

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Antunes Filho: “Andei com tudo que é classe social, de grã-fino a bandido”

Alex Solnik, do Jornalistas pela Democracia, relembra uma entrevista com o diretor de teatro Antunes Filho, um dos principais nomes da dramaturgia nacional, e que faleceu nesta quinta-feira (2) em decorrência de um câncer de pulmão; na entrevista, feita há 16 anos para uma revista chamada "Excelência", Antunes resumiu sua vida: "andei com tudo que é classe social, de grã-fino a bandido”

Antunes Filho: “Andei com tudo que é classe social, de grã-fino a bandido” (Foto: Divulgação/Bob Souza)
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Alex Solnik, para o Jornalistas pela DemocraciaEntrevistei Antunes Filho há 16 anos para uma revista chamada "Excelência". Ele tinha 73 e fumava cachimbo. Morreu ontem. Câncer de pulmão. Foi o maior diretor de teatro brasileiro – até outro dia. O título é um resumo da sua vida.

Pelo que eu sei você quando moleque foi quase um trombadinha...é isso mesmo?

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Eu era muito moleque! Eu era moleque levado. Eu fiz tudo o que tinha direito. Tudo, tudo. Perfurei o cartão inteiro, com tudo o que podia. Na minha juventude também fiz tudo que precisava fazer, não deixei um buraco por perfurar.

Você vivia no meio da rua... assim?

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Só... só...

Jogando bola? Pedra na janela?

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Vivia no meio de jogadores... de carteado... já fui viciado em turfe, em carteado... hoje em dia nada disso, nada disso. Me livrei. Consegui. E bebia muito! Hoje não gosto mais.

Entrou pelo fumo... cocaína?

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Não, isso nunca! Nunca, nunca. Fiz uma vez uma maconha, achei tão horrível, prefiro fumar cachimbo, é mais gostoso. Mas eu não trago cachimbo, fico no barato, assim, mas é um barato racional...fico no barato racional...são os pequenos prazeres que a gente não abandona... se a gente abandonar todos os prazeres, aí é chato, pra que viver? Eu abri mão de certas coisas, mas também abrir mão de tantas coisas! Então, eu tenho o direito de fumar o meu cachimbo, a não tragar, mas saborear o cachimbo.

A sua vida de moleque foi bem fora do comum... você não foi um moleque típico...

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Nada disso. Moleque levado, no meio de bandido, de ladrão...

Isso em São Paulo? Em que bairro?

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Em São Paulo... Bela Vista...

Ah, bom!

No Bexiga. Malandragem... ia nas casas, as pessoas roubavam caneta, eu também roubava... morrendo de medo... mas só algumas vezes eu fiz isso... depois, não gostei muito, não, porque dava um sentimento de culpa muito grande. Mas eu fiz tudo o que tinha direito. Às vezes a minha mãe me catava na rua o dia inteiro...eu não parava, fugia...

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Você não ia à escola?

Ia, porque meu pai me obrigava... senão, tinha rabo de tatu...eu ia... mas só fazia malandragem, só coisas que não devia fazer eu fazia na escola... as pessoas eram muito boas comigo, os professores foram muito legais comigo, se compadeciam comigo... me protegiam... porque viam que eu era de boa índole...

Você aprontava com os professores, inclusive?

Com tudo! Mas eles viam que eu não tinha maldade. Porque tem gente que é mau caráter mesmo...A mim os professores sempre perdoavam... acho que eu fazia uma cara número 27, e eles me perdoavam...

Então você passou por situações perigosas?

Por tudo o que é possível. Tinha amigos meus que depois foram presos, assaltantes, mas naquela época tinha poucos, né. Na minha juventude eu frequentava muito aquele Ponto Chic, conhecia todo mundo lá, turma de jogo, malandro, artista, ladrão, todos passavam por lá. Aquele tempo que ainda não era o tempo da liberação dos gays, era uma farra! Prostitutas, polícia...frequentei muito aquelas coisas todas...

Chegou a morar em puteiro?

Não, não, isso não, eu frequentava, como todo mundo... era uma farra... fazer isso, jogar... Depois foi a época do restaurante Gigetto. Fechava todo dia o Gigetto, às quatro, cinco da manhã...

E eu fechava sabe qual? O Riviera.

Ah, o Riviera! De vez em quando eu ia pra lá, mas eu gostava muito do Gigetto... o Riviera era meio geladinho, aquele cantinho de vidro, ali, eu acho meio geladinho, o Gigetto era mais quente, havia muito ardor no Gigetto... jornalista, ator, escritor... a gente fazia estripulias mil! Eu sempre fui muito da noite. Agora, não; agora eu preservo a noite. A noite é pra dormir. Então, eu sempre fui muito da noite. É questão de se poupar um pouco e saber também que fez muita besteira! Mas precisa fazer pra perceber que você fez besteira, porque, se não tivesse feito, ia tentar fazer agora. Eu já fiz as besteiras todas, então já sei como é que é. Malandragem eu sei todas.

Eu também.

Andei com tudo que é classe social, de grã-fino a bandido... andei por tudo já...

Homem, mulher?

Com tudo. (Pensa) Não, mas nesse sentido, não; nesse sentido sempre fui radical. Se eu fosse disso, tudo bem, eu falaria, mas não aprecio. Nunca tentei apreciar também. Não é a minha.

Falando nisso: você acha que tem alguma relação entre o fato de ser um bom ator e ser homossexual? Porque grandes atores, pelo menos brasileiros, são homossexuais. Começando por Ziembinsky (embora não fosse brasileiro, e sim polonês, mas fez sucesso aqui)...Sergio Cardoso...o próprio... como se chama aquele, do Rio, que um dia foi no programa do Jô e assumiu totalmente...?

Eu tenho medo de dizer qualquer nome...

Um ator genial, um ícone do teatro...

Eu não posso arriscar qualquer nome... senão vou dizer uns que não são... Sergio... Sergio....

Sergio Brito?

Esse mesmo! Ah, sei... A única ressalva que eu faço é quando eles, de certa maneira, naquela época se fazia muito... eles contestavam a sociedade machista fazendo certos trejeitos, era uma coisa meio agressiva até, aí eu não gosto, quando fazem uma caricatura. Mas o fato de ser homossexual é problema dele, ele gosta, eu não gosto, cada um é de um jeito, mas quando faz uma caricatura fica uma coisa meio histriônica...aí eu não gosto... mas atualmente não se faz mais...Então, tudo bem. Eu tenho, conheço muitos amigos, mas amigos mesmo, tenho muitos amigos...

 

E tem alguma coisa que ver? Eles são mais atores que os heterossexuais?

Tem às vezes isso, porque eles têm uma sensibilidade mais aflorada, uma certa aquidade pra certas coisas...eles são mais delicados, têm mais percepção, a percepção está mais aguçada. Claro, isso ajuda. Porque, de certa maneira, esse cara passou por muitos conflitos em relação à família... o pai não vai gostar, a mãe não vai gostar, então já começa a ter uma vida interior mais profunda. O cara que é machista já vai pondo pra quebrar e acabou. O outro não: tem que esconder, não tem, o que vão achar os outros, então cria certos embaraços sociais numa sociedade como a nossa... o machista manda ver, vai por cima...o gay ainda é muito discriminado, mas já está havendo muita tolerância e tem que haver total tolerância. O machista vai em frente e por isso não enxerga as coisas, não tem um raciocínio mais acurado a respeito do homem e da sociedade...

É mais difícil dirigir homem ou mulher?

É mais difícil quando o ator é machista. Isso que é mais duro pra trabalhar. Até colocar ele no devido nível de sensibilidade, é mais difícil. A mulher já está mais preparada, é mais delicada, tem mais sensibilidade um pouco. É difícil os homens quando são meio machistas, às vezes querem fazer teatro pra aparecer na mídia, é uma espécie de passarela o teatro. E a mulher já tem um certo amor antecipado, uma dedicação antecipada ao ser humano...

Você prefere trabalhar com atriz?

Com mulher é melhor porque ela já faz teatro como se fosse filho, antecipando o parto. Ela está sempre se cuidando, é instintivo isso, é mais amorosa com as coisas que quer, que gosta, que quer fazer, o próprio teatro é um mundo imaginário, são sempre filhos de alguma maneira, antecipam os filhos que estão sendo programados... e o homem é de mandar brasa...o falo já põe... é a espada, o guerreiro, já quer fazer coisa...quer ser heroico, quer ser o centro das atenções...

E pinta com atriz e diretor o que pinta entre paciente e psiquiatra? E até do homossexual com o diretor?

Isso é normal que tenha, porque é um trabalho muito próximo, é um trabalho de conversar muito próximo, então pode criar coisa, mas se vê com o tempo que é fantasia, é apego, porque a gente começa a ter uma certa dedicação, um certo carinho pelo outro, e começa a se aproximar... mas fica nisso, depois a gente vê que não é por aí...

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Você teve alguma paixão assim no palco?

Sim, mas depois a gente vê que é besteira, ou se resolveu, o que podia se resolveu, o que não podia se resolveu também. Podendo ou não podendo a coisa se resolve... o tempo, né, o tempo e as experiências vão dando o resultado necessário.

Por que você nunca se casou com uma atriz?

Não teria nenhum problema. É que não pintou. Não pintou. Não pintou. Poderia ter pintado, mas não pintou.

Dizem que você bate em atriz. De onde surgiu isso? Você bate em atriz?

Isso... aqui no Sesc, por exemplo, onde eu faço testes normalmente... mais de mil pessoas fazem teste por ano e eu fico com vinte. Então, mais de mil pessoas falam mal de mim porque eu só aceito vinte. Agora, eu sou muito disciplinador. Você pra fazer arte, tem que ter respeito mútuo. Eu com as pessoas e as pessoas comigo. Não pode chegar tarde... tem que manter com certo asseio tudo... tem que ter uma relação cordial com as pessoas, eu faço questão disso. Não pode pôr o pé na cadeira, não pode deixar porcaria no chão. Então, é um grande folclore, jamais eu bati numa atriz. Uma vez eu bati, lá atrás...dei um tapa "acorda, acorda"! e falei "desculpa, desculpa". Pra ela acordar... era uma maneira meio de guru, meio zen, pra ver se a pessoa despertava. E eu pedi desculpa. Não houve nada. Única vez na minha vida...

Foi com a Giulia Gam?

Não, foi no tempo do Teatro Aliança Francesa. Foi no tempo de "A Cozinha". Era uma menina..."Você tem que fazer isso! Acorda"!, entendeu? E acabou. Nunca mais coloquei o dedo em ninguém. Agora, às vezes eu falo "vai!", sacudo, entendeu? Aí, sim eu sacudia, mas isso não é machucar, é dar energia, é dar o impulso certo. Mas nunca bati em ninguém, nunca quero bater, isso é uma bobagem das pessoas que não entram no CPT, das pessoas que eu mando embora porque não dão certo...Se você encontrar uma atriz que eu tenha encostado o dedo ou alguma coisa, eu te dou um prêmio. Vou pedir dinheiro emprestado, mas te dou um prêmio. Porque eu nunca bati.

Em mais de 50 anos de teatro você conheceu muitas atrizes...

Conheci paca! Paca! As boas atrizes de antes passaram pelas minhas mãos. Passaram pelas minhas mãos como diretor, por favor, para ficar bem claro...Lancei a Regina Duarte, o Tarcísio, a mulher do Tarcísio, como é que se chama?

Gloria Menezes...

Irina Greco, não sei onde é que ela anda, desapareceu...

Muitas que você citou começaram no teatro e foram fazer novela. Eu sei que você não gosta. Você até fez TV, mas teleteatro. O cara consegue ser bom ator na televisão?

Não, não dá...porque...

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No teleteatro que você fazia ainda dava?

Naquele tempo a gente ensaiava uma semana, era uma peça por semana. Agora você pega o script hoje à noite pra decorar pra fazer amanhã de manhã. Uma coisa de louco. Por isso é que dá esses problemas de coração em todo mundo. Ponte de safena. Eu falava isso muito pro Cassiano Gabus Mendes: "Sai dessa, Cassiano, sai dessa"! Porque o cara fica enclausurado durante meses escrevendo novela. Uma coisa de maluco.

Ganha muita grana, mas...

Eu dirigi uma novela com o Cassiano na Record. Eu quase morri, porque não ia mais a cinema, não lia mais, não fazia mais nada, a vida ficou muito chata, era uma prisão. Muito desagradável. Eu falei: nunca mais na minha vida vou fazer isso. Porque me causava muita infelicidade. Infelicidade total. Eu tenho pena. Realmente... eu sei porque eu passei por isso. Sei o sofrimento que é. Você vive em trevas durante um período. E eu não vivi essa época da Globo que tem essa xerifada toda por cima! Mesmo com alguma mais liberdade que eu tinha, mesmo assim era insuportável. Foram meses insuportáveis. Pouco a pouco larguei o próprio teatro profissional, porque causava infelicidade, ensaia uma peça em 30 dias, luz, preparar, muita tensão. Meu negócio é ficar com a garotada, ensinar, ver, fazer espetáculos mais artísticos, de certa maneira, sem o compromisso de fazer coisas comerciais, sabe...produto comercial... então, preferi ficar quieto no meu canto. Além do mais, o mar não está pra peixe. Tá todo mundo meio perdidão. Falei: quero me retirar, ficar meio invisível. Fazer arte.

Você acha que um cara como Raul Cortez, que é teu amigo, considerado um dos maiores atores do Brasil... quando ele faz novela ele desempenha legal ou também se perde?

Desempenha legal, mas é sempre pela metade, né. Porque ele podia dar muito mais, muito mais...

E por que ele faz novela? Vocês são amigos, não são? Ele não te fala?

Ele começou praticamente comigo... a gente se dá bem, tudo, mas...

Ele tem uma explicação pra isso? Por que ele faz novela?

Eu falo pra ele que ele... posso até dizer... ele gosta de ser aplaudido, ele gosta de ser gostado, gosta de estar na mídia. Isso o satisfaz... a mim não satisfaz...o reconhecimento dos outros, ele precisa disso, é o alimento dele. Nós somos diferentes. Eu quero silêncio, quero ficar com meu livrinho, ele quer outra coisa: ele gosta da badalação, do society... eu não suporto. Eu falo isso com carinho, porque gosto muito dele. Aliás, já briguei muito com ele por causa disso.

Pra ele deixar de fazer novela?

É. "Deixa disso, rapaz! Você não precisa de nada disso. Você é um grande ator"! Mas ele precisa... fazer o que?

Mas é por causa da grana?

É um pouco de grana, sempre conta um pouco de grana, mas eu acho que é o outro lado mais...

É o brilho?

É... ele gosta de ser reconhecido, é legal. Nós, artistas, somos muito inseguros, e cada um procura segurar de um jeito. Cada um procura segurar a sua boia de um jeito. Eu seguro através da espiritualidade. Ele segura através do aplauso. Pra poder ser. "Eu sou"! Senão, você soçobra. Cada um tem seu ganchinho pra segurar.

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O Nelson é o grande autor brasileiro ainda?

É o único. É o único grande autor. Temos grandes autores: o Plínio, o Jorge Andrade, o Guarnieri, o Vianinha, o Ariano Suassuna... mas o monumento, o poeta, o gênio é o Nelson Rodrigues. O que fazer? E ele foi muito discriminado. Porque ele escrevia certas coisas desagradáveis no jornal, mas muito engraçadas. Todo mundo lia e criticava. Ria e depois xingava. Em casa ria e na rua xingava.

Fora aquela frase dele, lapidar...

Mas qual? Todas elas são...

Toda mulher gosta de apanhar...

Não, só as normais...

Você concorda?

Não, isso é uma frase de uma situação. Essa frase não é dele, é de uma personagem dele. Quando ele escrevia, ele criava uma personagem. Só que colocava o mesmo nome, em vez de criar heterônimos, como Fernando Pessoa. Então, essas frases são atribuídas a ele, mas não são dele, são de personagens. Que ele era muitas pessoas. Agora, te garanto uma coisa: umas mulheres gostam de apanhar, outras, de bater. Teve uma mulher, uma atriz, inclusive, morava perto de casa, eu pegava na mão dela e tal...ficamos amigos. Um dia eu propus: "Vamos?" E ela: "Não, porque eu costumo bater nos meus namorados e não quero bater em você..."

Aí é sado-masoquismo...

Eu fiquei assustado... melhor não... ela era mais forte que eu... É sado-masoquismo... não é ato sexual... ela confundiu as bolas...

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E tem mulheres que pedem, na cama: bate aqui, bate ali...

Não é a minha...

Elas pedem pra apanhar, é incrível. Nem todas, é claro...

Só as normais! (Ri)

Você conheceu o Nelson?

Conheci. Ele era muitas pessoas. Não era uma pessoa só. O grande dramaturgo é isso. Ele não era egoísta, que o cara egoísta é uma pessoa só. O egoísta fica alienado do todo, ele não era alienado, era integrado no todo.

Você gostava dele, no contato pessoal?

Sim, ele era muito engraçado, muito agradável.

Você ia jantar com ele, falava ao telefone?

Eu ia na casa dele... ele era muito simples. Ele tinha um pouco de preconceito com paulista, era gozado. Ele falava que o cúmulo da solidão é você jantar com paulista... uma coisa assim. Tá bom, Alex?

Mas só estamos começando. E os grandes produtores? Onde estão os grandes produtores como era Ruth Escobar? Você gostava dela?

Eu tenho uma série de críticas a ela, mas não importa... ela gostava de teatro, ela queria ser atriz, agora tem produtores que querem outra coisa, querem a grana do teatro. Então, tem intermediários que conseguem uma verba e já levam metade da verba... São os caras que têm habilidade, papo... é aquela coisa do Duda... tem papo, consegue... então, o cara já leva metade de cara... então, quando começa já tá com metade da verba. A Ruth, não, a Ruth até que às vezes podia levar mais da metade, talvez, não sei, mas ela tinha amor ao teatro...trouxe tantas coisas maravilhosas, estrangeiras..."O Balcão"... Bob Wilson... infinitas coisas... ela deu muito, deu muito...A Ruth captava e fazia...

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Esses musicais americanos que vêm ao Brasil... você assiste?

Não. Uma vez eu estava em Nova York, nunca entrei na Broadway, só na off-Broadway... É uma questão de princípio... Eu sei que é maravilhoso... a tecnologia... os atores...

O que você acha dos "off-Broadway brasileiros"? Você se dá com o Zé Celso?

Eu acho ele um grande artista, mas ele está no teatro cínico dele... cínico no bom sentido, da escola grega, de Diógenes, que contestava a sociedade... usar todas aquelas coisas que ele usa, cinicamente, em protesto contra essa sociedade globalizada... mas eu acho que ele já entortou o fio, no mínimo...

Eu gostava dele nos Pequenos Burgueses...

Dessa época eu gosto muito dele... muito. Ele é um grande artista. O Rei da Vela era uma coisa maravilhosa...

De repente, ele passou a bater nos espectadores em Gracias Señor...

É aquela coisa cínica, de contestar a realidade, as regras, os usos e os costumes da sociedade... Eu entendo isso, mas acho que já passou, não é por aí que a gente pode enfrentar o problema da globalização e da sociedade capitalista...

E tem esse negócio dele de destruir o teatro...

Mas não é o teatro... é a sociedade...

Você chegou a conversar com ele sobre isso?

Não, não converso porque o hábito democrático de um falar e outro responder eu gosto. Ele fica tomado...só ele fala...

É um grande monólogo...

Eu não gosto de ser escada pra monólogo. Não vou ser escadinha pra monólogo de ninguém. Não é por orgulho, é porque é desagradável...a gente tem que respeitar o outro, isso é fundamental, e ele fica na dele, passa por cima, é uma situação desagradável. Por que vou me colocar numa situação desagradável? Sou livre! Fico na minha. Embora respeite ele como artista, acho que tem sentido o que ele faz, mas é inócuo...

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E o Gerald Thomas? Você tem algum contato com ele?

O Gerald também acho que é artista, mas acho ele outro cínico. Eu não concordo com ele, acho ele exagerado, não concordo com o Zé Celso, mas os dois são artistas. Agora, quando o cara mesmo que seja bonzinho não é artista...a obra do Gerald, a obra do Zé Celso é melhor que qualquer coisa de gente medíocre. Ninguém mais gosta de teatro. Então, quando você vai ver os caretões do teatro, do teatrão, é melhor que ver essas bobagens. O teatrão não é meu gosto exatamente, mas, porra, tem princípio, tem meio, tem fim, a pessoa pode acompanhar. Os outros a gente não entende nada. Eu não vou ver, mas as pessoas que vão ver me dizem isso...

Diz uma coisa: você foi execrado pela classe teatral em 1985 por ter apoiado Jânio para prefeito e não Fernando Henrique... você apoiou ou não Jânio em 1985???

Não. Não apoiei...o que saiu no jornal é que diziam que eu ia ser secretário de Cultura do Jânio. Aí eu falei: "Até admiro o Jânio..."

Você não apoiou Jânio em 1985???

Não. Não apoiei...o que saiu no jornal é que diziam que eu ia ser secretário de Cultura do Jânio. Aí eu falei: "Até admiro o Jânio..." Eu conversava muito com ele, ia na casa dele. Era um ótimo papo, ele era legal, eu achava ele um showman... eu admiro ele como ator. Disso até votar é diferente. Outra coisa: eu trabalhei na prefeitura, quando era moleque, como office-boy... chegou uma época que eu consegui uma transferência pra um lugar legal, onde eu ia ser gente. Então, eu fui pra Praça da Sé, na prefeitura da praça da Sé, me deram um posto legal, eu deixava de ser office-boy pra ser auxiliar de escriturário... quem é que me pôs pra fora? O Jânio! O f.d.p.! (Ri) O f.d.p. me pôs pra fora! Eu falei: "Você me pôs pra fora, canalha"!

Ele te pôs pra fora pessoalmente?

Não, é que me deram a promoção uns dois meses antes do Jânio entrar na prefeitura, na primeira vez em que foi prefeito... então, ele pegou e deixou tudo sem valor. As promoções não valiam mais nada...

Em 1954?

Em 54. Então, fiquei puto da vida, bicho! Como é que eu ia votar nele? Agora, admirar como uma figura, como um grande ator que ele era...

E com texto próprio!

Você colocava ele na televisão, colocava mais três, ele dava show. E eu, como sou homem de teatro, tenho que admirar. Agora, entre admirar e votar no Jânio, é outra coisa!

Você não votou no Jânio?

Não. Eu nem falei se ia votar ou não ia votar. Eu falei: eu admiro o Jânio. Agora, de vez em quando começam a me encher o saco que eu votei nele, eu digo votei, foda-se! Vai por conta da... tô pouco me lixando com isso. Até agora há pouco tempo o Alberto Guzik falou que eu apoiei o Jânio no jornal. Nunca apoiei o Jânio no jornal, nunca, pode pegar! É que me colocaram como secretário da Cultura dele e eu neguei, neguei, neguei! Admiro, mas não voto nele. O voto é secreto, só meu, só meu. Quem não admirava o homem? Inclusive, ele falava pra mim que queria ser ator comigo, queria traduzir uma peça de Shakespeare e ele trabalhar e queria que eu dirigisse. Brincadeira dele, né? Ele fazia um fuzuê desgraçado. Ele era muito engraçado.

E muito culto.

Põe cultura nisso!

Como é que ele conseguia? Encher a cara e ter aquela cultura!

Tinha aquele amigo dele...como era o nome?... o Horta

Pedroso Horta...

O Jânio falou pro Horta: "Eu renunciei? Que bebedeira ontem, hein"? (Ri) Era muito engraçado. Então, essa coisa se alastrou. Mas eu nunca apoiei Jânio em nenhum jornal. Me tragam o jornal que eu dou 100 mil dólares. Eu vou pedir emprestado e pago. Eu sei que não fiz isso. Eu apoiei. Fernando Henrique eu apoiei. Esse eu apoiei. Se o Lula tivesse feito a prefeitura, o estado, como administrador, até poderia ter votado nele. Mas como ele não tinha esse handicap eu continuei votando no PSDB. Eu sou PSDB.

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Toda quarta-feira eu te encontro na feira da rua Caiowá. Você gosta de fazer feira? O que te atrai na feira?

Não é a feira... é a rua aqui... são os taxistas, todos são meus amigos, eu não perdi esse contato, graças a Deus, é uma forma que eu tenho... eu tenho liberdade total, a pior coisa do mundo é ser abordado... pra mim, não, isso é raro... só quando... a turma já se habituou com a minha presença... as pessoas fazem tudo pra ficar famosas, depois fazem tudo pra usar óculos escuros pra não serem reconhecidas...e eu não precisei disso, sempre fui livre, não me fechei, não me tornei figurinha difícil... eu sou figurinha difícil pra entrevistador...

Há, há, há....

É verdade... porque, se não fosse através da feira eu não faria essa entrevista com você...

O que você quer fazer hoje além de teatro?

Eu quero fazer um novo filme, mas não acho o que falar...o que tem pra dizer? O que é importante dizer? Não quero fazer uma super-produção, quero fazer uma produção independente, mas uma coisa de cinema boa. Não quero pegar mil pessoas no estúdio, enche o saco. Eu não sei lidar com isso. Na televisão eu era craque, eu sei lidar com a televisão...eu pegava a câmera e fazia. Tem que ter uma puta produção, senão faz besteira. E um bom roteiro. É muito difícil. E precisa de muita grana. Precisa fazer uma coisa simples. A genialidade está no simples, bicho! Complicou, já não é genial.

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