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André Del Negri

Constitucionalista, professor da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS).

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Artesãos de “fake news”

Sabemos bem o que os pistoleiros digitais são capazes de fazer para provocar uma massa enraivecida, ainda mais que qualquer postagem viraliza e alcança em instantes milhões de internautas

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Para quem vê com preocupação esse tempo fora do eixo, com hordas digitais a disseminar notícias falsas, torna-se indispensável a leitura do livro “Engenheiros do Caos”, do italiano Giuliano Da Empoli. 

Não é de surpreender que estamos enganchados num mal-estar do governo dos algoritmos. Sabemos bem o que os pistoleiros digitais são capazes de fazer para provocar uma massa enraivecida, ainda mais que qualquer postagem viraliza e alcança em instantes milhões de internautas. A grande curiosidade é entender como há eleitores que aceitam notícias falsas que difamam pessoas.

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Sobre as massas já se ocupou a psicanálise há muito tempo. Freud nos faz compreender como elas oscilam ao ponto de não conhecerem a dúvida, já que o agrupamento é capaz de gerar essa sensação de certeza. Se essa é a base para adentrar na esfera do inconsciente, talvez não seja um exagero dizer que o que toca a adesão às fake news é que há um outro com quem vale compartilhar identidades.Esse pano de fundo alude aos fatos correntes. Os sujeitos em massa são tragados por uma força irresistível para as telas de seus smartphones, onde cada “compartilhamento” ou “curtida” em foto ou “post” é sinal de que há um laço emocional capaz de unir uns aos outros, contágio que pode fazer o indivíduo entrar em estado de fascinação. Ocorre que o efeito colateral disso, é que os usuários ficam com as caras coladas nos smartphones, uma espécie de roda de “botequim virtual”, ambiente perfeito para que artífices sejam fabricadas por artesãos de fake news e visões políticas façam-se manipuladas pelos “engenheiros do caos”.

Para compreender a bestialidade em que vivemos, basta recapitular os traços das eleições presidenciais de 2018, maculadas pelo uso ilegal de disparos em redes sociais, pelo ódio de classe e pela ausência de debate. 

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Se as altas instâncias decisórias deixaram passar uma eleição viciada, repleta de aplicativos e robôs de spam com seus posts automáticos em grupos de WhatsApp, o que ocorreu em seguida foi o levantar de um candidato, com vocação explicitamente autoritária, que passou quase três décadas na Câmara com atuação apagadíssima, mas que chega aos cumes do populismo barato prometendo, pelo WhatsApp, transformar o país.

A narrativa que “colou” foi vincular a corrupção à “crise econômica do PT”, bem como ataques a filósofos, sociólogos, psicanalistas, educadores, historiadores... (o dito marxismo cultural). Era hora de acabar com o “socialismo”. Foi esse o veneno que entrou na corrente sanguínea de milhões de brasileiros. 

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Não se pode, porém, esquecer que a violência verbal ultrapassa Jair Bolsonaro. É fato que a tempestade de insultos tem um rastro mais amplo, e, como se nota, é usada na bacia eleitoral de outros políticos em diferentes países, a exemplo de Donald Trump (EUA) e do premiê da Hungria Viktor Orbán. Outro tanto se diga do israelense Benjamin Netanyahu e do político italiano Matteo Salvini, assim como do filipino Rodrigo Duarte e do primeiro-ministro britânico, Boris Johnson.

É estarrecedor atestar que o presidente Jair Bolsonaro estreou no mundo dos “estadistas” como um sobrevivente dos dinossáuricos autoritários dos anos 1960-70, mas tudo é possível na “política da cólera”. 

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O trabalho de injetar ódio nas massas e hipnotizá-las para o espetáculo de hipocrisia vai longe. Basta resgatar as ofensas execráveis feitas à honra da vereadora assassinada Marielle Franco. Veja-se, que em 2019, postagem de foto de Marielle circulou em grupo de WhatsApp do Senado com a legenda “morri kkkkk”. E, surpresa das surpresas, uma reportagem da revista Época (aqui) apontou que um dos autores da ação foi um assessor do senador Flávio Bolsonaro, postagem, que, segundo Mariliz Pereira Jorge, da Folha de S. Paulo (06.02), foi compartilhada pelo influenciador digital Luiz Galeazzo, que, no início deste ano, teve o nome sondado para comandar a área digital da comunicação oficial do governo nas mídias sociais – Secretaria de Comunicação (Secom). 

E o espantoso é que essa dimensão viral da “política da cólera” ajuda mesmo a eleger candidatos, ao menos foi o que se viu nas provas levantadas por peritos digitais na CPI das fake news (aqui), comissão de deputados e senadores instalada para investigar fraudes nas eleições. 

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Nota à margem: depois das fake news, o fenômeno mais recente que tem tudo para explodir globalmente em eleições é a deepfake (falsificação profunda). Que tal vídeos que prometem sobrepor o rosto de uma pessoa sobre outros e com perfeição de voz, mediante falas manipuladas por programas de efeitos especiais, tornando quase impossível diferenciar entre o que é mentira e o que não é? O que parece ficção científica agora é realidade (assista aqui). O resultado é impactante e pode, sim, interferir e decidir eleições.

E assim vivemos tempos estridentes, expostos a ideólogos e influenciadores digitais à moda de chocadeiras de fake news. Sem pudor, armam emboscadas, praticam “assassinatos de reputação”, atiçam a raiva do eleitorado e escolhem as redes sociais como campo de pouso. 

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Não é à toa que no princípio era o caos, e está sendo o caos. Alguns já perceberam e outros sequer deram pela coisa.

Notas:

EMPOLI, Giuliano Da. Os engenheiros do caos. São Paulo: Vestígio, 2019.2 FREUD, Sigmund. Psicologia de massas e análise do ego. Obras Completas. Vol. XVIII. Rio de Janeiro: Imago, 1921.

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