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Marco Mondaini

Historiador e Professor da Universidade Federal de Pernambuco. Coordena e apresenta o programa Trilhas da Democracia, exibido aos domingos na TV 247.

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As esquerdas precisam enterrar a "democracia burguesa"

É inevitável a pergunta: democracia para que classe? Somente assim seria possível a percepção de que a democracia pura não passa de um meio para se esconder o caráter de classe da “democracia burguesa”

(Foto: Roque de Sá/Agência Senado)
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Para o jovem Marx, os direitos humanos não passariam de um produto da sociedade burguesa, na qual a conquista da liberdade do indivíduo implicaria sempre a limitação da liberdade dos outros indivíduos e não a sua realização junto a esta última.

Nesse sentido, os direitos humanos desempenhariam a função de instrumento de delimitação da individualidade dos homens livres, que, na vida real, estariam envoltos na clássica “guerra de uns contra os outros” hobbesiana. Com isso, a escravidão da sociedade burguesa ganharia a aparência da sua maior liberdade — isso, através da substituição do que antes era privilégio pelo direito.

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Mesmo sem tratar diretamente da questão dos direitos humanos e apesar de não ser um texto de natureza filosófica, A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky de Vladimir Lenin ocupa um lugar central na difusão da crítica marxista aos direitos humanos iniciada por Karl Marx na Questão Judaica, de 1843-1844, quando tinha apenas 25 anos, deslocando o seu alvo principal para a democracia.Escrito no ano de 1918, com o escopo de defender a dissolução da Assembleia Nacional Constituinte pelos bolcheviques e rebater as teses enunciadas pelo líder da social democracia alemã, Karl Kautsky, em A Ditadura do Proletariado, o livro de Lenin foi um dos maiores responsáveis pela afirmação da dicotomia entre “democracia burguesa” e democracia proletária no interior das várias tradições do pensamento marxista e dos partidos comunistas em todas as partes do planeta.

Para Lenin, não haveria sentido algum em falar de democracia em geral, de democracia pura, em uma sociedade dividida em classes, podendo-se falar apenas de democracia de classe enquanto existirem classes diferentes.

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Por conseguinte, seria inevitável a pergunta: democracia para que classe? Somente assim seria possível a percepção de que a democracia pura não passa de um meio para se esconder o caráter de classe da “democracia burguesa”.

Dito de outra maneira, à medida que é compreendida como um conceito jurídico e formal, a democracia se reduz a uma aparência responsável pelo encobrimento da dominação das massas pela burguesia, uma expressão ideológica da ditadura de classe burguesa.

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O raciocínio desenvolvido pelo líder da Revolução Russa não deixa margem a qualquer espécie de dúvida. Em função da sua essência burguesa, a democracia contemporânea, isto é, capitalista, seria uma democracia para os ricos, sendo a igualdade formal apenas o tipo de igualdade desejado pelos capitalistas.

Assim, a conclusão a que chega Lenin sobre as instituições representativas parece óbvia. O parlamento é uma instituição burguesa, comandada por uma classe hostil, uma minoria exploradora, sendo um instrumento de opressão dos proletários, inteiramente alheio aos interesses destes últimos, diversamente do instituto revolucionário de participação criado no decorrer do processo revolucionário russo – os sovietes.

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O filósofo francês Claude Lefort, quando ainda estava de pé o “socialismo realmente existente”, assinalou com precisão o ponto central do equívoco cometido por Marx em relação aos direitos humanos, numa análise que, em grande medida, pode ser estendida ao entendimento da questão democrática por Lenin.

Para Lefort, tal equívoco estaria situado na não percepção de que a descoberta dos direitos humanos e da democracia nasce da luta de classes, dos movimentos populares e operários, não sendo uma invenção da burguesia, mas das classes que contra esta última se contrapuseram no decorrer da modernidade.

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Pois bem, na gravíssima conjuntura sócio-política-econômica-sanitária que atravessamos, diante do enorme desafio de derrotar o Governo Bolsonaro e o bolsonarismo, cabe as esquerdas lutarem pela defesa e afirmação progressiva da democracia, cientes de que esta tem um caráter histórico não apenas antifascista e antineoliberal, mas também anticapitalista, já que, na sua essência, ela é a força motriz da socialização dos poderes.

Assim sendo, o uso do conceito de “democracia burguesa” uma vez mais demonstra-se um equívoco teórico com graves implicações políticas para o conjunto das forças de esquerda que forjaram a democracia e os direitos humanos desde a Revolução Francesa.

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Que tal enterrá-la como conceito?

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