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Wilson Luiz Muller

Integrante do Coletivo Auditores Fiscais pela Democracia (AFD)

33 artigos

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Bolsonaro avança para a ditadura

Como deputado do baixo clero, Bolsonaro sempre defendeu a ditadura e os torturadores. Mas isso tinha um objetivo mais específico de propaganda junto às milícias do Rio de Janeiro, que constituíam sua principal base eleitoral. Isso mudou com sua eleição para presidente da república

Guedes & Bolsonaro contra a indústria do Brasil (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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A instauração de uma ditadura é possível quando houver a vontade de indivíduos que tenham poder suficiente para isso, aliado à presença de condições objetivas favoráveis.

Como deputado do baixo clero, Bolsonaro sempre defendeu a ditadura e os torturadores. Mas isso tinha um objetivo mais específico de propaganda junto às milícias do Rio de Janeiro, que constituíam sua principal base eleitoral. Isso mudou com sua eleição para presidente da república. Agora ele tem poder para transformar em prática o que antes era apenas uma pregação ideológica. Por tudo que tem sido dito e feito, por ele, seus filhos e os expoentes do seu governo, Bolsonaro continua querendo instaurar uma ditadura.

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No campo das condições objetivas, há um único tema que se apresenta como obstáculo relevante para um avanço mais rápido dos planos ditadoriais: o caso Marielle/Queiroz. De tão imbricado, o tema deve ser tratado como um caso único, uma vez que o centro temático está no poder das milícias do Rio de Janeiro e da sua relação com o clã Bolsonaro. É do desenrolar (ou não) desse imbróglio temático das milícias que depende essencialmente a dinâmica das disputas políticas no próximo período, do quanto Bolsonaro precisará, ou conseguirá, avançar para não haver retorno.

Todas as demais pautas favorecem o governo. Há uma adesão quase uníssona dos poderosos interesses capitalistas ao governo desde que Bolsonaro, tendo à frente o picareta-mor Paulo Guedes, adotou o neoliberalismo como sua religião oficial; a conversão pentecostal é só enrolação para jogar fumaça nos olhos dos incautos. É o casamento (hétero) com os representantes da banca que garante o apoio decisivo da grande mídia corporativa ao presidente aspirante a ditador, por ser a mídia porta-voz e beneficiária sócia desses interesses poderosos (entrega do petróleo do pré-sal e outros minérios, privatizações, diminuição do Estado, quebra da estabilidade dos servidores públicos, supressão de direitos, rebaixamento de salários e aposentadorias).

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Se as investigações seguirem no atual ritmo, se as instituições estatais continuarem na toada em que estão, o fascismo avança. Se houver uma guinada nessas investigações, de modo a procurar desvendar a verdade dos fatos, pode-se voltar ao funcionamento normal das instituições.

Para compreender o nexo desses fatos, é preciso enveredar no terreno do que existe para além das aparências. O governo Bolsonaro é um misto de ignorância, patologia  e  estratégia político-ideológica. A ignorância (incapacidade de compreender os fatos) e a patologia (deformação doentia da realidade) são compensadas, com vantagens, por uma eficiente e profissional máquina de produção e controle de narrativas, capaz de pautar a sociedade em relação aos temas de interesse do governo. É o que que garante protagonismo ao bolsonarismo, desde o período eleitoral. Tudo isso convive com a completa incapacidade que o governo tem de resolver os problemas mais elementares da população brasileira.

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A maioria da sociedade é contrária à ditadura proposta pelos Bolsonaro. Porém, não há resistência ao seu avanço. Há tempo que Bolsonaro aprendeu a se alimentar e a crescer com essas contradições, porque há por trás disso uma bem pensada estratégia. Os atores falam, tomam atitudes, tudo aponta para uma determinada direção. Mas, da forma como o fazem, eles plantam motivos para que as pessoas fiquem em dúvida sobre suas reais intenções. De modo que ao insistirem verbalmente no tema da ditadura, e mesmo ao agirem como déspotas, deixam no ar sempre aquela sensação de que – quem sabe -, aquilo não passou de uma brincadeira de mau gosto, de um mal entendido, de uma escusável ignorância. Enquanto isso vão ganhando terreno, e os fatos se tornam definitivos.

Não se pode ter certeza se a combinação “ ignorância-patologia-estratégia”  foi planejada. O que se pode dizer com certeza é que tem se mostrado extremamente eficiente até o momento, não apenas para Bolsonaro e sua tropa de aspirantes à ditadura, mas para todo o status quo dos grandes interesses capitalistas. Estão todos contentes,  implantando sua agenda com segurança e agilidade.

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O segredo da eficiência de Bolsonaro, para o consórcio que o apoia e sustenta, está na anormalidade. Não é normal ver um governo que faz questão de demonstrar publicamente que não está interessado em resolver os problemas da maioria da população, que se orgulha de gastar seu tempo e o dinheiro público defendendo pautas que não ajudam ninguém a melhorar de vida. Isso causa perplexidade e confusão, mesmo entre os eleitores de Bolsonaro. 

O clã do presidente procura constantemente gerar caos e confusão. A cada problema que surge eles inventam outros dois. O problema original é esquecido, e depois os dois novos problemas artificialmente gerados serão soterrados com a criação de mais quatro. A ciranda exponencial de falsos problemas sem solução cria a ilusão de que nada é possível ser resolvido de uma forma metódica e racional. Surge então a solução de novo tipo,  ditadorial, de alguém que resolve fazer as coisas acontecer de uma forma ou outra, nem que seja na “marra”, nem que “tenha que cortar a cabeça dos que só querem atrapalhar o governo”.

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Estamos diante do anormal e do inusitado. O ambiente caótico ofusca a capacidade de diagnóstico,  leva ao autoengano e dificulta a discussão racional de um plano de ação ou reação. Quando Bolsonaro diz que o povo elegeu o pior - referindo-se a si –, ficamos sem ação porque não queremos aceitar que alguém se refira a si dessa forma. Não é normal, dissemos, para proteger-nos da nossa falta de saber o que pensar. De fato não é normal. Mas funciona. Bolsonaro é o campeão das falácias. Essa de ele ser o pior chama-se falácia do falso dilema. Só há duas opções: o pior em luta contra todos os outros. Porém, todos os outros são o sistema, que é a encarnação do mal; e se o sistema todo é contra Bolsonaro, então ele na verdade representa o bem. Assim, o pior se transforma em melhor. Essa falácia está bem representada pelo recente filme das hienas atacando o leão Bolsonaro. Na mística farsesca é a pedra, rejeitada pelos pedreiros, que se transforma na pedra angular.

É preciso aceitar  o fato de que Bolsonaro não é normal, como aliás ele mesmo insiste em nos mostrar todo dia.

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Acostumamo-nos a pensar em ditadura com tanques nas ruas, militares patrulhando as esquinas com metralhadoras nas mãos. Mas não precisa ser assim. Bolsonaro já deve ter pensado muito nisso, nas mil e uma formas possíveis de instaurar uma ditadura. Bem encostado por seus superiores depois de pretender explodir bombas nos quartéis para conseguir aumento salarial, teve tempo e assessoria paga por dinheiro público para se dedicar a isso por quase três décadas. Estudou com afinco e carinho o tema. Afinal, fora isso, só precisava arrumar algum tempo para se dedicar a  ofender minorias vulneráveis, coisa que todo cagão contrafóbico gosta de fazer. De modo que se há algum especialista neste país em ditadura, esse é o cara. Bolsonaro é a ditadura personalizada.

O que é necessário para Bolsonaro  implantar a ditadura e com isso realizar seu sonho de iniciar a matança dos trinta mil esquerdistas que só o incomodam?

1 – uma forte base social que apoie todas as suas iniciativas, que seja acrítica em relação aos seus métodos.

As pesquisas de opinião indicam que Bolsonaro tem de 25 a 30% de apoio entusiasmado entre a população. Tem ainda entre 15 a 20% de ex-apoiadores que poderiam voltar a apoiá-lo, dependendo das medidas que adotasse ao enveredar para a ditadura. É um apoio popular considerável.

2 – apoio das Forças Armadas.

Bolsonaro tem um grande de número de militares em postos-chave da administração. Pode o projeto de ditadura não empolgar alguns setores das forças armadas. Mas Bolsonaro sabe que a esquerda oferecerá resistência à implantação da ditadura, e neste caso os militares ficarão do lado dele para combater a esquerda.

3 – apoio de setores empresariais e midiáticos

Mesmo que parte do empresariado e da grande mídia defenda o neoliberalismo, com um verniz mais democrático e civilizado, é certo que o avanço de Bolsonaro para a ditadura teria um apoio consistente nestes setores, sem que ele corresse o risco de ficar isolado. Ele precisaria apenas garantir a continuidade dos privilégios dos que hoje estão fazendo os melhores negócios de suas vidas. Bolsonaro sabe que o “neoliberalismo democrático” não tem base social, que esse projeto foi massacrado no Brasil nas últimas eleições. É o que ele sintetiza com a sentença: “o povo não vota em pau-mandado da Globo”. Pelas mesmas razões, o vice-presidente Mourão também não é uma opção para esses setores mais sensíveis com os “valores democráticos”, o que dá tranquilidade ao aspirante a ditador de continuar avançando o sinal sem correr o risco de sofrer um impeachment. Porém, ele sabe que precisa andar ligeiro. Ele não pode esperar até o momento em que seus sócios tenham terminado de comer a janta. Ele tem que agir enquanto o filé estiver sendo servido. Ele conhece os comensais, sabe da sua ingratidão. Depois de saciados costumam cuspir nos pratos em que comeram. Não raro mandam para a prisão os que ajudaram a pôr a farta mesa.

4 – apoio de uma parte do congresso 

Bolsonaro não precisa se preocupar em ter maioria no congresso, pois a pauta de interesse das corporações capitalistas anda bem, independente do que ele faça ou deixe de fazer. Brigar com o congresso pode até ser um bom negócio. Por exemplo, mais lhe vale empurrar o laranjal do PSL para a cota da velha política, perdendo o apoio de 20 deputados, mantendo porém o discurso do ditador incorruptível. 

5 – uma polícia política eficiente para perseguir os adversários 

Essa expertise já foi desenvolvida pela Lava Jato. Sérgio Moro, alçado a ministro da justiça, tem como missão principal transformar a polícia federal  numa espécie de SS nazista. A SS de Hitler se constituiu em um dos principais fatores da avanço nazista, na medida em que a política foi sendo substituída paulatinamente pela força. 

6 – a inação das instituições de investigação e controle (ou o seu alinhamento com o bolsonarismo)

O binômio Marielle/Queiroz é no momento o único tema capaz de oferecer alguma resistência ao avanço da ditadura fascista, por extrapolar a pauta de interesses dos trabalhadores e da esquerda. Ao contrário do que alguns apregoam, o tema mostra que as instituições de investigação não estão cumprindo o papel que lhes foi atribuído pela Constituição Federal. Pelo escândalo Vaza Jato (The Intercept Brasil), ficamos sabendo que o Ministério Público Federal, parte da Polícia Federal e da Receita Federal, COAF, tinham aderido firmemente ao bolsonarismo. Não se tratava apenas de ódio anti-PT por parte de alguns agentes,  era adesão sistêmica ao neofascismo. Situação quase idêntica vai se revelando agora com o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, e talvez também com a Polícia Civil desse estado. Os casos Queiroz e Marielle estão fechando quase dois anos. O pouco que se sabe até agora sobre esse duplo imbróglio veio à tona graças ao trabalho investigativo de alguns jornalistas, e também por conta de vazamentos. As instituições investigativas do Estado brasileiro estão se fundindo com o governo. Reproduzem o discurso, os valores e os métodos do bolsonarismo, elevado a uma visão filosófica de mundo. E como para o bolsonarismo os fins justificam os meios, há um desprezo completo pela legalidade dos processos. Logo, não se deve esperar que essas instituições, enquanto comandadas por pessoas alinhadas com o neofascismo, venham a cumprir o seu dever de apurar, como determina o ordenamento jurídico, eventuais crimes cometidos pelo clã Bolsonaro.

7 – o apoio “popular” armado (leia-se milícias)

Não há dúvidas de que Bolsonaro teria um forte apoio armado dos setores milicianos que sempre foram sua principal base social. Juntando ainda os grandes proprietários de terras, Bolsonaro teria uma poderio paramilitar nada desprezível.

Quer dizer que a ditadura de Bolsonaro é inevitável? Não. Quer dizer somente que estão dadas as condições subjetivas e objetivas para a sua implantação. Quer dizer também que barrar as pretensões ditadoriais de Bolsonaro dependerá quase que exclusivamente da capacidade de resistência e luta dos trabalhadores e dos setores verdadeiramente democráticos. Quer dizer que é uma ilusão esperar que as  instituições ora dominadas pelo espírito neofascista venham a cumprir com suas obrigações enquanto não houver uma mudança na atual correlação de forças na sociedade. Quer dizer que a resistência terá que vir de baixo. Senão Bolsonaro conseguirá realizar o sonho acalentado por toda vida.

*Membro do Coletivo Auditores Fiscais pela Democracia

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