Ciro e Lula: unidade com quem e para que?
Professor de Filosofia e colunista do 247 Gustavo Castañon critica o "perdão" do ex-presidente Lula aos golpistas e os novos apelos pela unidade do campo progressista em 2018; "Não se perdoa quem não se arrependeu. Não se faz acordo com quem não cumpre. E principalmente, não devemos entregar a condução total da esquerda a quem dá mostras de não aprender nada", diz; para Castañon, é "suicídio" tentar reeditar a conciliação de classes proposta nos governo Lula agora, "nos níveis em que fomos deixados depois das contrarreformas"; "Nós temos o dever de nos descolar dessa realidade objetiva medíocre e tentar despertar o povo brasileiro um sonho de um novo futuro, um novo projeto, uma nova atitude, uma nova sociedade"
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Dois assuntos mobilizaram a esquerda na última semana: o “perdão” de Lula aos golpistas e novos apelos pela unidade do campo progressista em 2018. Na verdade, são parte da mesma questão.
Como no gentil artigo de meu amigo Ricardo Capelli aqui no 24/7, tem se falado que a unidade é uma questão de sobrevivência da esquerda num cenário hostil, uma necessidade histórica e que para isso é necessário superar hegemonismos partidários e “sonhos descolados da realidade objetiva”.
Mas o que é a esquerda senão um grande e generoso sonho descolado de nossa abominável realidade objetiva?
Lula não precisa da unidade da esquerda para chegar ao segundo turno e certamente a terá se estiver lá. O que ele precisa é do TRF-4 e do STF. Sabemos que no voto não há força política no Brasil capaz de tirar de Lula em 2018 uma vaga no segundo turno. Então, unidade agora para que?
E com quem? Quem vai ditar as almas que estão perdoadas e as que vão para o inferno? Renan e Eunício estão perdoados? Meirelles é nossa salvação?
Não se perdoa quem não se arrependeu. Não se faz acordo com quem não cumpre. E principalmente, não devemos entregar a condução total da esquerda a quem dá mostras de não aprender nada.
O Brasil não precisa de unidade, ele precisa é de alternativa.
A volta à polaridade PT-PSDB só interessa a um PT acuado e a um PSDB morto que precisa desesperadamente de um desfibrilador. Ela não interessa ao povo brasileiro, e por isso, não acontecerá.
Os arranjos institucionais e políticos da Nova República foram profundamente destroçados e desmoralizados, e tentar recosturá-los pode ser projeto de quem parou no passado e se recusa a ver a gravidade da crise de representação brasileira.
Tentar reeditar a ficção da conciliação de classes lulista agora, nos níveis em que fomos deixados depois das contrarreformas, é suicídio. É jogar fora todo o aprendizado do povo brasileiro nos últimos dois anos. E se o resultado da conciliação original com o rentismo e o fisiologismo foi esse desastre, imaginem a versão 2.0.
A esquerda definitivamente não precisa tomar mais um tiro simbólico desses. Ela precisa urgentemente é da promessa de um novo horizonte utópico, de um projeto de nação, de uma renovação da esperança num mínimo de honestidade necessária para não corroer a crença na democracia e no estado de direito. Chega de realidade, queremos promessas!
Sim, política é luta por construções de maiorias e hegemonia para implantar o máximo de sua agenda. E você faz isso procurando isolar o que há de pior e mais oposto a sua agenda. E o pior agora, é o PMDB.
O PMDB é hoje uma quadrilha neoliberal que levou a corrupção e a desfaçatez no Brasil a níveis apocalípticos e traiu a segurança e a soberania nacional em todas as oportunidades que encontrou. Foram os executores da mais radical agenda neoliberal que o Brasil já viu, os exterminadores de direitos e do futuro do povo brasileiro. O PMDB se tornou o pior câncer partidário nacional.
A política é também feita de símbolos, e assim como o rentismo é o inimigo máximo a ser derrotado o PMDB hoje é o símbolo a ser extirpado. Eles são os agentes de nossa destruição.
Querem unidade? Estamos esperando o projeto. Não damos cheque em branco. Não queremos somente espaço no condomínio do poder. Não queremos meramente vencer uma ou outra eleição regional. Isso é com o PMDB.
É por tudo isso que precisamos de tantas candidaturas legítimas e corajosas quantas necessárias para trazer de volta a nosso campo o eleitor desiludido com o desastre político ao qual o PT conduziu a esquerda e ampliarmos nossas bancadas no congresso.
Candidaturas que representem o horizonte utópico de milhões de brasileiros progressistas que não se veem mais representados pelo PT. Candidaturas como as de Ciro Gomes, Nildo Ouriques e Manuela D’Ávila.
A esquerda não precisa de mais acordos e conciliações inexplicáveis que drenem toda sua energia transformadora, ela precisa de enfrentamento, de coerência, de respeito aos símbolos. Precisa tentar mudar o que é necessário mudar, e não somente o que parece possível mudar.
Para muita gente de esquerda no Brasil o que escrevi aqui ainda é considerado sacrílego. Essas pessoas acham que o governo do PT com seu crescimento pífio, condomínio fisiológico com o PMDB, sem operar ou sequer tentar reforma alguma e ajoelhado para o rentismo (sim, 13 anos quase inteiros com a maior taxa de juros reais do mundo) é o melhor que o Brasil pode almejar.
Ok, eu sou capaz de compreender que diante de nossa tragédia inédita atual o passado recente pareça o paraíso.
Mas peço aqueles que não estão tomados pela emoção que se esforcem para compreender que para muitos companheiros do campo popular isso não só é muito pouco, como é também parte do problema.
Para muitos de nós Lula não é uma promessa de futuro, mas uma promessa de passado.
Não é uma promessa de enfrentamento do campo conservador, mas de apaziguamento com ele.
E nós temos o dever de nos descolar dessa realidade objetiva medíocre e tentar despertar o povo brasileiro para o sonho de um novo futuro, um novo projeto, uma nova atitude, uma nova sociedade. Afinal de contas, é disso que se trata a Política feita com P maiúsculo.
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