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Helena Iono

Jornalista e produtora de TV, correspondente em Buenos Aires

122 artigos

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Contundente Greve geral na Argentina: o silêncio traz o rumor do mal-humor social

A greve geral, neste 25 de junho foi tão ampla e contundente que mergulhou a Argentina num silêncio mais profundo que um feriado comum; um silêncio expressivo; um grito uníssono de descontentamento social contra o plano econômico do governo Macri

A greve geral, neste 25 de junho foi tão ampla e contundente que mergulhou a Argentina num silêncio mais profundo que um feriado comum; um silêncio expressivo; um grito uníssono de descontentamento social contra o plano econômico do governo Macri (Foto: Helena Iono)
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A greve geral, neste 25 de junho foi tão ampla e contundente que mergulhou a Argentina num silêncio mais profundo que um feriado comum; um silêncio expressivo; um grito uníssono de descontentamento social contra o plano econômico do governo Macri. Algo que não só confirma as pesquisas (que têm dado cerca de 65% de visão negativa da gestão Macri, e 90% de opinião de gravidade da crise econômica do governo), mas as supera como movimento real, decisão de luta coletiva que significa participar de uma greve. A paralisação foi total em todas as áreas: nos transportes, desde a aviação (voos cancelados e aeroportos desertos), portos, trens, metrôs, ônibus, taxis; nas escolas públicas e privadas, universidades; nos Bancos e repartições públicas, ministeriais; jornaleiros, trabalhadores da economia popular, cobradores de pedágios e estacionamentos; várias pequenas e médias empresas e comerciantes (60%) fecharam as portas.  Diz-se que uma contundência deste nível só foi vista em 2001 quando o governo de Fernando de la Rúa, sob a égide do FMI cortou 13% do salário dos funcionários públicos e das aposentadorias. Novamente, a Argentina, demonstra que tem memória histórica e uma valiosa organização sindical e social, com raízes no peronismo.

As Centrais sindicais, desde a CGT, as duas CTAs (Dos Argentinos e a Autônoma), a Corrente Federal (CGT), apoiadas por vários organismos e movimentos sociais e partidos de esquerda, convocaram e construíram ao largo dos últimos meses esta fortaleza, a unidade combativa para a greve geral. A pressão da base sindical, onde a rebelião fervilha, tem sido decisiva para a magnitude da greve, obrigando a revisão da política conciliadora da direção, do chamado triunvirato da CGT. A massiva paralização expressou o rechaço popular à agressão econômica que se agudiza com a recente entrega total do país ao FMI: os ajustes, as mega-tarifas (“tarifaços”) de gás e luz, o rebaixamento salarial, o desemprego, a reforma trabalhista e previdenciária, o saqueio e privatização do Fundo de pensão, a fome que se estende assustadoramente, a vida em risco nesta Argentina onde 61% têm um salário insuficiente para chegar ao fim do mês. O nível mais alto das paritárias sindicais concedidas pelo governo chega a 15%, quando a inflação prevista pode chegar a mais de 27%. Dias atrás, os sindicatos dos caminhoneiros acordaram com a patronal 25%, com cláusula de revisão (não ainda homologado pelo governo). As centrais sindicais objetivam superar a insuficiente meta de 15% e alcançar a meta mínima para todas as categorias em torno a 25% com escala móvel de salários, a exemplo dos caminhoneiros. Mas, e os desempregados cuja quantidade aumentou em 9,1%? A UOM (União Operária Metalúrgica) denuncia 28 mil desempregados, dentro dos 70 mil no ramo industrial. Eis um espelho trágico do desemprego: nos últimos 6 meses em Rosário, chegaram novos 20.782 pacientes na rede pública, dos quais metade perdeu emprego e plano de saúde.

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Macri e o ministro da Economia, Dujovne, que aceitaram as condições dos novos empréstimos do FMI, à revelia do Parlamento, não surpreendem com seu rechaço à greve: “A greve não serve a nada!”.  “A greve deu um prejuízo ao país de 29 bilhões de pesos”. Enquanto os trabalhadores produzem 1 bilhão de dólares (29 bilhões de pesos) de riquezas ao país, o governo em 1 trimestre, com as recentes manobras cambiárias possibilitaram a fuga de 11 bilhões de dólares do Banco Central, sem produzir nada, rumo aos offshore, inclusive dos próprios ministros de governo. Ao contrário, como argumenta o ex-vice-ministro de economia kirchnerista, Emmanuel Agis, a aprovação de 25% de aumento salarial aos trabalhadores, aumentaria o consumo e, portanto a produtividade das empresas que resultaria numa entrada igual ao dobro da perda de 29 bilhões de pesos. Esta greve geral mostra que Macri, apoiado na mídia hegemônica, já perde a sua narrativa. A torpeza das suas declarações só revelam debilidade. Ontem, o povo argentino uniu-se para por em xeque o FMI e o modelo econômico de “Cambiemos”. A Argentina dos trabalhadores recolhe a energia da multidão das mulheres e adolescentes do dia 13 de junho pela legalização do aborto e a transforma num movimento político unitário para frear a destruição e recuperar a soberania nacional.

As mudanças de ministros de Macri

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É bom conhecer as premissas e consequências das recentes mudanças ministeriais de Macri para entender o meio de cultura desta rebelião social na Argentina. Há poucas chances de interação entre os poderes vigentes no governo e o movimento social. As condições impostas pelo FMI com os novos empréstimos de 50 bilhões de dólares conduzem a um trágico saqueio do Estado social e empobrecimento sem rumo. É um empréstimo para pagar a dívida externa, que já totaliza cerca de 110 bilhões de dólares contraída pela gestão Macri. Como falar em atrair investidores de capital externo, em um país do qual já saíram 500 bilhões de dólares para contas offshore nas que se incluem a família presidencial e ministros?

A saída do ministro das energias Aranguren (acionista da Shell) que geriu toda a política energética geradora da mega-tarifa (“tarifaço”) do gás e da eletricidade não resulta em nenhuma concessão social; será um bode expiatório para ser responsabilizado pelos danos ao povo que não serão sanados. Caso contrário, não se justifica o Decreto de Macri contra a lei anti-tarifaço aprovada no Parlamento. Luis Caputo (conhecido por corrupção e desvio de capitais aos offshore nos paraísos fiscais) deixa de ser ministro das Finanças para assumir o cargo de presidente do Banco Central (BCRA), substituindo  Stuzenegger . Uma medida para deixar a raposa cuidar do galinheiro.

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A nomeação de Luis Caputo para o BCRA significa um reforço do controle do poder financeiro concentrado dos EUA sobre a governabilidade de “Cambiemos” na Argentina para garantir a apropriação das riquezas e das bases militares, enfrentando a expansão do BRICs. Ou seja, portas abertas ao Fundo financeiro Templeton e Blackrock, e ao banco JPMorgan (família Rockefeller), que sustentam áreas econômicas do governo Trump e o complexo industrial militar, sinônimo de Comando Sul para a América Latina. Os afastados, Stuzenegger e Aranguren são vinculados ao HSBC e à chamada família globalista Rotschild/Soros. O poder financeiro de Washington encontra respaldo nacional em grupos econômicos como Socma (da família Macri) contra o poder globalista de Londres. O poder midiático hegemônico que se reforça é o do Telecom/Cablevisión/Clarin/Mitre/Fox News. O conglomerado que provavelmente passará a emitir críticas a Macri será o da Telef/Continental/Telefônica/CNN. Estes dados se baseiam em artigo do economista Walter Formento, pesquisador da Universidade de La Plata. Leia esta análise sobre os diferentes setores financeiros que disputam o poder nas mudanças ministeriais de Macri.

A luta que vem depois da greve geral

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É trágico constatar que com “Cambiemos” a economia argentina tornou-se refém do rentismo, das finanças internacionais, do poder das empresas energéticas multinacionais e do setor agroexportador, deixando uma herança maldita para os próximos governos e gerações. É o fim da economia produtiva, da indústria nacional e dos entes públicos estatais. Nisso, há províncias (Estados) que vão à falência econômica total. Fecham-se fábricas vitais de algumas províncias, gerando desemprego fatal. Hoje, em Chubut, província patagônica, rica em recursos naturais, mas arrasada pelo feroz ajuste, professores que há dias se manifestam pelas paritárias nacionais, num acampamento abaixo de zero graus de temperatura, sofreram uma violenta repressão com balas de borracha. Esse modelo de país sem soberania pretende chamar o “exército para intervir na segurança interior” e não nas fronteiras, como anunciou recentemente Macri; necessita calar as vozes, a mídia independente, desmantelar o Estado: por isso, hoje foram demitidos 354 trabalhadores da Telam (Agência estatal de notícias). Assim reage um governo que diz: “a greve não serve a nada”. Estes fatos na Telam e em Chubut, ocorrem no dia seguinte ao da greve geral no país. Novas tentativas de afirmação de poder, de intimidação, porém, também de desespero frente à realidade profunda do que significou o “silêncio” unânime das forças produtivas do país neste 25 de junho. Este “silêncio” promete retornar nos gritos de rua nos próximos dias, no segundo round das mulheres para assegurar a sua lei do aborto legal no Senado, e no dia 9 de julho, quando os sindicatos e movimentos sociais prometem ser 1 milhão no Obelisco contra o FMI.

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