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Nívea Carpes

Doutora em Ciência Política e mestre em Antropologia Social

27 artigos

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Democracia em risco - o Brasil revisitando o autoritarismo à moda Bolsonaro

A perseguição aos governantes populistas, esses que protegem os interesses do povo e são interpretados pejorativamente pelo malfadado “populismo” por muitos teóricos que cedem aos interesses burgueses, é a prova da fragilidade da democracia

Liminar da ONU em favor de Lula suspende efeitos da Lei da Ficha Limpa (Foto: Ricardo Stuckert)
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A democracia não é um modelo político que contenha em si o anseio da participação popular nas questões do Estado. A democracia é uma forma que propõe a participação dos interesses que compõem a sociedade. Na Grécia Antiga, as decisões da polis não contemplavam os escravos, as populações subjugadas, as mulheres, os jovens com menos que 18 anos e os estrangeiros, que não eram considerados cidadãos. Não é raro que indivíduos de camadas excluídas das sociedades não sejam reconhecidos como cidadãos, mesmo na atualidade. 

As democracias contemporâneas são uma forma de acomodação dos conflitos internos de uma sociedade, recurso utilizado para dar manutenção ao Estado pacífico no que tange às relações sociais, mesmo que em paz aparente. Nas entranhas, os poderes econômicos garantem o desequilíbrio na representação através da manipulação do sistema por meio de benefícios financeiros e do exercício do poder. Os parlamentares e governantes são alvos das elites que esperam retribuição ao investirem em campanhas e proporem ganhos para a adesão a LOBs com interesses específicos das classes dominantes e financeiras. 

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A democracia não é capaz de garantir a presença dos interesses populares no legislativo. Isso explica por que o cinturão que faz a divisão entre classes e criminaliza a pobreza é tão bem definido, enquanto se tem grandes dificuldades para se alcançar os crimes cometidos pela alta sociedade. Uma lógica que se repete quando se trata dos governantes populares, que ao defenderem os interesses da maioria, enfrentam a resistência das forças do mercado, dos liberais e das elites, que se unem para inverter o jogo. Para isso, aproveitam o domínio que possuem sobre as instituições do Estado, ocupadas pelas classes médias. 

No Brasil, foram perseguidos todos os governantes que tinham qualquer inclinação para o progresso que trouxesse benefícios para o povo, é o caso de Getúlio Vargas, João Goulart, Juscelino Kubitschek (no caso do apartamento), Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva.

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A perseguição aos governantes populistas, esses que protegem os interesses do povo e são interpretados pejorativamente pelo malfadado “populismo” por muitos teóricos que cedem aos interesses burgueses, é a prova da fragilidade da democracia. A democracia corre bem enquanto o sistema aparenta participação, desde que dominado pelos interesses das classes superiores da sociedade.

Uma artimanha utilizada por interesses hegemônicos nacionais ou internacionais, em diferentes lugares do mundo, é a demonização da política, desacreditando a política e as instituições e disseminando a desolação social. Desacreditar da política como meio de solucionar problemas é o caminho aberto para os demagogos e autocratas. Demagogos extremistas aproveitam momentos de grande desilusão com as instituições e dos maus resultados de governos. Nesse clima ascenderam governos como os de Benito Mussolini, Adolf Hitler, Donald Trump, Viktor Orbán, Mateusz Morawiecki, Jair Bolsonaro e Kyriakos Mitsotakis, para citar alguns.

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Segundo Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, autores do livro “Como morrem as democracias”, essas figuras que acumulam poder individual podem ser neutralizadas pelos partidos políticos e seus líderes. A questão é se os partidos compreendem quando veem esse fenômeno acontecendo e se os partidos políticos entendem os riscos que figuras como essas impõem à democracia, assumindo o compromisso de bloquear tais situações. 

O candidato carismático outsider surge desafiando a velha ordem. No caso brasileiro, mais como discurso do que na prática, considerando Bolsonaro ser um candidato há 28 anos na política, mas que conseguiu fazer crer que se opunha ao sistema e que vinha de fora da velha política.

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O que Jair Bolsonaro traz de novo, que foge aos padrões dos extremistas de direita, é a idolatria aos Estados Unidos e ao líder Donald Trump. As extremas direitas são alçadas pelas ideias autoritárias, reacionárias, conservadoras, saudosismo ao passado, incentivo ao uso da força e nacionalismo. Inovamos no quesito nacionalismo ou nativismo, uma vez que as ações precárias tomadas pelo governo Bolsonaro notadamente se prestam mais a favorecer os interesses neocolonialistas americanos do que aos interesses nacionais.  

Outra questão a ser destacada dessas experiências é que essas lideranças de extrema direita, candidatas ao autoritarismo, costumam encontram apoio naqueles partidos que caíram em descrédito pelo distanciamento das questões populares. Esses partidos percebem nesses indivíduos uma oportunidade de retornar ao poder cavalgando no prestígio individual, com pretensões de passarem a protagonistas do governo. Contudo, também é frequente que não consigam dobrar esses líderes aos seus interesses.

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Além de não se dobrarem aos interesses hegemônicos tradicionais, a ascensão de outsiders traz consigo o incentivo às rivalidades, às polarizações e aos conflitos. Os sistemas autoritários nutrem-se da instabilidade e das querelas que constroem no cotidiano. As consequências podem ser vistas em mais polarização, fragilização extrema do sistema democrático e fragmentação do sistema partidário, fortalecendo a liderança que somente foi possível dado esse estado de instabilidade total das instituições, dos partidos e do extremismo dos posicionamentos. 

Parafraseando Marx, a história se repete, estamos no tempo da farsa. Jair Bolsonaro é um político de péssimo caráter que enxergou um caminho de apogeu onde muitos demagogos autoritários já trafegaram. Orientado por seu pseudointelectual Olavo de Carvalho, ele retoma a história, colocando em prática velhas receitas, eficazes para o cenário em questão. Isso prova que, em termos econômicos, sociais e políticos, nenhum país é uma ilha. As ondas que incentivam tendências autoritárias são forças que se movimentam internacionalmente, tornando o momento favorável a determinadas experiências. O Brasil não soube se proteger e foi engolido pelo extremismo. A esperança também está na história, as ondas não duram para sempre.

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