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Jean Menezes de Aguiar

Advogado, professor da pós-graduação da FGV, jornalista e músico profissional

219 artigos

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Eleições 2022: a opção pela frustração

Esta derrota poderia ensinar coisas a esses aí, mas o ser impermeável não se educa, não aprende e não evolui

Bolsonaro e estrada bloqueada (Foto: Bruna Prado/Pool via REUTERS | REUTERS/Ueslei Marcelino)
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Há uma gente no Brasil que poderia ser classificada de ‘curiosa’, se não houvesse deficiências graves no campo social da educação e da ciência para explicar sua própria dificuldade. 

São pessoas que não estudam nada, ainda que com carros bonitos, casas bonitas e frequentem restaurantes bonitos. Essas, demonstram severos comprometimentos tanto com o que se convencionou chamar de ‘conhecimento’ (produto de um processo cognitivo, como a percepção ou a dedução), como de ‘sabedoria prática’ (conhecimento com prudência), nos conceitos de Mario Bunge, Dicionário de Filosofia.

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O saber sempre foi uma jactância universal, assolando indistintas mentes. Reis e milionários sempre se mostraram sabedores e conhecedores de praticamente tudo, com certezas inquestionáveis, e danosas, que motivaram decapitações e demissões por toda a história, em errâncias personalistas verdadeiramente patéticas. Francis Bacon (1561-1626) cunhou a crítica ‘saber é poder’. A jactância não é nada nova.

Some-se ignorância e crença e o resultado será o desastre pessoal nas decisões. Crédulos num olímpico bolsonarismo de valores retrógrados e golpistas, cujo preconceito jamais poderia permitir a suposição de que ‘um qualquer’, como Lula, o derrotasse; aliado à descrença na ciência da estatística e amostragens das pesquisas que deu, consistente e permanentemente, por todo o longo período eleitoral, a vitória de Lula, simplesmente acreditaram, figadalmente, na impossibilidade de derrota.

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A derrota se lhes parecia, mesmo, uma infâmia, uma inconversabilidade social, verdadeira intangibilidade. Como Lula, principalmente Lula que eu tanto odeio, nojerizo, xingo e desejo morto pode vencer o ‘meu’, o de mim, o parido pelo meu bem nutrido preconceito que tanto cuido e venero?

Sim, mesmo sendo um sonegador inveterado de impostos; um patrão fraudador da CLT contratando empregados como PJ, por via de MEI; mantendo uma empresa que evita dar nota fiscal; e um marido absolutamente infiel, vou olímpico para a Avenida Paulista berrando o slogan idiotizante ‘abaixo a corrupção’, que faz, apenas nominalmente, esta vida ter sentido de ‘honra’, o narcisismo social referido por Peter Sloterdijk (Crítica da Razão Cínica). Ou o de seu correlato canalha: o ‘patriotismo’, conforme Samuel Johnson.

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Foi a deficiência de conhecimento que carregou milhões ao desastre da surpresa incrédula pela derrota? Sim.

Não há, por exemplo, previsão científica parecida no futebol, outro segmento que resolveu se polarizar. Estádios viraram ‘arenas’; jogos viraram ‘confrontos’; jogadores viraram ‘guerreiros’. É tudo muito pobre – e não enriquecedor- filosoficamente falando. Esta decepcionante cultura do ‘desafio’, triunfante em empresas ‘cheiradas’ exclusivamente em lucros e nunca ligadas a éticas verdadeiras para com o consumidor e algum humanismo, ainda que com aquelas mentiras panfletárias e cafonas do ‘missão, visão e valores’, tem levado muitos ao desespero.

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Pois estas ‘lógicas’, tanto a da polarização, quanto a do não conhecimento, quanto a da crença dogmatizada, aliadas ao preconceito mimado de não poder supor que se perderá, que a derrota é sempre uma possibilidade, tem feito torcedores quererem efetivamente matar os torcedores rivais e, agora na eleição de 2022, o paralelo golpista nada novo, diga-se de passagem, de paralisar estradas.

A não aceitação da derrota cientificamente anunciada, calculada em pesquisas desde sempre por amostragens sistêmicas e procedimentalizadas em todo o período – ainda que achistas da política torçam a cara para estas dificuldades da ciência, atrelando-se, então a um famigerado relativismo ontológico, levou muita gente ao desastre da crença, da convicção numa vitória totalmente improvável de Bolsonaro. Mesmo com uma diferença de votos não imensa, totalmente atribuível à desonestidade de mancomunações ideológicas às quais, por exemplo, a polícia rodoviária passou a ser criminalmente investigada por ‘diversos’ Ministérios Públicos do país, deixando exposta a parcela da vaidade estética que tomou conta da corporação nos anos bolsonaristas.

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Muita gente se frustrou, de verdade, na derrota de Bolsonaro, pela incapacidade pessoal de não aceitar a mera suposição de que Lula poderia vencer, ou, se manter no confortável preconceito até ali não testado efetivamente, de aferir eleitoralmente o cacife de Bolsonaro numa disputa efetiva com Lula. Como sempre se soube: não dava para Bolsonaro.

E como diriam os positivistas da ala bolsonariana, frustrações e opções se respeitam, ainda que a pessoa sofra verdadeiramente e se exponha a um ridículo (e criminoso!) fechamento de estradas numa vã suposição de um improbabilíssimo e surreal golpe de Estado.

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Esta derrota poderia ensinar coisas a esses aí, mas o ser impermeável não se educa, não aprende e não evolui. Uma primeira coisa a se aprender, para os das estradas fechadas, seria o conceito, a função e o valor da ‘democracia’, a possibilidade de se conviver com o contrário.

Mas quando a ideologia é a do golpe de Estado, da homofobia, do racismo, do preconceito, do nazismo, da discriminação e da violência, não há conhecimento que ‘encante’, nem lição que ‘transforme’.

O Brasil entra numa fase degradada, com gente ‘guerreira’, que endeusa ‘desafios’, tem ‘metas’ ideológicas a ‘bater’, e não aprendeu o valor da sabedoria e da humildade, do poder do ‘não’, proscrição que não pode ser dita a toda uma geração mimada.

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