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Gustavo Conde

Gustavo Conde é linguista.

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Elites tentam repatriar os símbolos nacionais (#SóQueNão)

O jornalista Gustavo Conde identifica a tentativa de repatriação tardia dos símbolos nacionais pelas elites. Ele diz: “estampar 'democracia' em banners beges dizendo que são amarelos virou, inclusive, uma forma carinhosa e debochada de enunciar: ‘vocês todos são otários’. Conde ainda complementa: “é a operação semiótica para ‘desintoxicar’ o verde e o amarelo, essas cores supostamente nacionais que viraram sinônimo de fascismo”

Folha e o amarelo (Foto: Reprodução)
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Acho uma idiotia rara chamar os anos 70 da ditadura militar de 'milagre econômico' (e depois dizem que as fake news apareceram com as redes sociais).

Milagre brasileiro foram os 13 anos em que o povo foi soberano, entre 2003 e 2016. Governos legítimos, com projeto, com crescimento, com combate à desigualdade, com valorização do salário mínimo...

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Isso é 'milagre'. Em um país com a elite mais atrasada e violenta do mundo, construir esse ambiente politico democraticamente pelo voto é um verdadeiro milagre.

Como explicar Lula? Como explicar o PT num país com um jornalismo avacalhado como o Brasil?

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Milagre.

E a dona Folha e tantos outros veículos e intelectuais que transitam na corda bamba do espectro ideológico usam a palavra 'milagre' para se referirem à ditadura assassina sem o menor problema.

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Que vergonha de uma elite que sequer sabe usar as palavras - ou as usa de maneira oportunista e vil.

Detalhe: 'milagre' remete a cifras de religiosidade, à fé, ao sobrenatural. Eles criticam tanto a dimensão religiosa do povo nordestino e tascam a palavra 'milagre' para demarcar um período da nossa experiência econômica.

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'Milagre econômico' é uma espécie de oxímoro.

O estrago das jornadas de 2013 foi grande. Ela não foram exatamente uma ação, mas antes, um sintoma. Deveriam chamar "Jornadas Globeleza", com patrocínio, com tudo.

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Somadas à nossa elite degradada, atrasada, burra, violenta, ignorante e fascista (ah, Marilena Chauí, você foi econômica na sua definição), Jornadas Globeleza, tucanos maus perdedores e bandeirantes modernos do estado de S. Paulo, golpistas até a medula, o Brasil entrou em colapso político.

O Brasil está na UTI, com respirador inadequado e sem anestesia.

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O jornalismo é precário, a sociedade tem medo e o governo é um salve-se quem puder.

É uma piada de mau gosto o jornal Folha de S. Paulo se insurgir contra a ameaça de ditadura a essa altura do campeonato. Além de atrasados, o discurso salvacionista cheira a naftalina.

Eles se juntaram à fraude das frentes amplas. Querem posar de democratas com o amarelo desbotado estampado em seus frontispícios - na verdade, "precipícios".

Nosso jornalismo é um sintoma. Eles aceleram a doença (o golpe de 1964 e o de 2016) e faturam com a "cura" (a redemocratização e, agora, a defesa da democracia).

Pior do que isso: a UTI brasileira é substancialmente semântica. Há espancamento e tortura das palavras. 'Milagre' e 'democracia' figuram no pelotão lexical de frente, com os deformadores de opinião oficiais, jornalismo e pensamento adestrado, todos assanhados para salvar o mundo do pastiche de nazismo que eles mesmos criaram.

O caso da palavra 'democracia' é grave. Qual o sentido de 'democracia', afinal?

Eles querem a palavra para eles. Vão disputar a tapa. Até Bolsonaro começou a falar em 'democracia'. Até militares.

O modelo bolsonarista de tratamento ao sentido das palavras, na verdade, já existia desde sempre: é o modelo da Folha de S. Paulo.

Eles usam a palavra como 'marca'. Como 'publicidade'. Estampar 'democracia' em banners beges dizendo que são amarelos virou, inclusive, uma forma carinhosa e debochada de enunciar: "vocês todos são otários"

É a operação semiótica para "desintoxicar" o verde e o amarelo, essas cores supostamente nacionais que viraram sinônimo de fascismo.

É uma tarefa complexa e arriscada, mas diante da paralisia da sociedade brasileira - e do medo sob estado policial permanente - o jornalismo vai lá e se apropria da política, como sempre.

O sentido democracia para o jornal Folha de S. Paulo é como o seu amarelo: desbotado, quase bege.

57 mil mortes por covid-19 e ainda se discute se "estamos no caminho certo".

Para a Folha, 'democracia' significa livre mercado, privatização e criminalização permanente da esquerda, com requintes de crueldade dedicados a Lula e ao PT.

Percebam, caros leitores, o estalir da impostura: o maior partido político do país, que aceitou democraticamente três derrotas seguidas para a presidência da República e que depois venceu quatro eleições seguidas governando e respeitando todas as liberdades de expressão e de imprensa, não é sequer citado como símbolo de democracia na nova empreitada publicitário-jornalística do jornal da Barão de Limeira.

Que 'democracia' é essa? Democracia sem partidos políticos? Democracia sem memória? Democracia com memória seletiva? Democracia com amnésia?

E a 'ditabranda'? E as peruas que transportaram perseguidos pelo regime militar?

Democracia sem autocrítica?

O Brasil segue com os sentidos em vertigem. Há baciadas de filósofos e epidemiologistas dizendo que o mundo jamais será como foi um dia, no que eu acrescento na humilde condição de linguista: a linguagem também jamais será o que foi um dia.

A vertigem das fake news industriais promovidas pelos setores empresariais que disputam o sentido e que são responsáveis pelo assassinato em massa gerados pela desinformação associada à ganância no mundo ocidental pandêmico, aceleraram as variáveis sociais que transformarão as línguas humanas em um novo sistema simbólico.

A língua humana se equilibra em uma tênue corda bamba erigida sobre o fosso moral do capitalismo e as vicissitudes da coletividade. Roland Barthes dizia que a língua era fascista - porque ela te obrigaria a enunciar com as palavras que ela dispõe - e eu digo: a língua é capitalista.

O capitalismo e o fascismo são irmãos siameses. Ambos são autoritários, monocráticos e furiosamente seletivos.

Nesse sentido, a língua pode estar à iminência de um processo de libertação, precipitado pelo vírus e pelo fracasso humanístico retumbante do capitalismo.

A falta de garantia e de fiança para os sentidos das palavras, o colapso das instituições no mundo todo, com destaque especial para a dicção jurídica - que agoniza amarrada a um ethos conservador (latinizante) -, a massificação do sentido via redes sociais e interconexões virtuais, deixam patente uma crise da linguagem humana como nunca antes identificada pela história.

Cores, palavras, símbolos, ícones, paradigmas, estão em ebulição. Discursos velhos são desmascarados e a 'verdade' passa a ser um conceito opressivo e desvirtuado.

As tentativas precárias - porque oportunistas e desprovidas de técnica - de se tentar valorizar a democracia em tempos de fascismo e pandemia são como pipas dançando em meio a um furacão.

O desafio é linguístico. O mundo virou um caos porque a língua deixou de dar conta da complexidade massiva e vertiginosa que o darwinismo social inoculou nos modos de enunciar.

Nunca a discrepância linguística entre os povos originários e o povo trabalhador com relação aos detentores dos processos de produção e informação foi tão espetacular e gigantesca.

Um indígena adaptado aos costumes urbanos fala português. Mas compare o seu português ao português ostentado por um agente financeiro comissionado da XP. São duas línguas completamente diferentes (são o mesmo idioma, mas seus modos de produção de sentido e de apropriação de sentido são avassaladoramente assimétricos).

Língua do povo, língua do poder. O poder emana do povo. Sobre qual sentido de democracia estamos falando?

O desafio parece, ademais, que se estabeleceu de maneira permanente. Como sair dessa condição linguístico-humanística precária, com a miséria subscrita nos 'líderes' de turno no mundo?

Como sair dessa catástrofe simbólica, com um jornalismo subdesenvolvido? Como sair do impasse humanitário do milênio com tanta gente covarde espalhada pelo pensamento de cabresto e pelas teorias bem comportadas da economia, da sociologia e da ciência política?

O Brasil vinha construindo uma sociedade espetacular no período recente em que tivemos democracia real e plena. Poderíamos transformar o mundo com princípios de solidariedade, tecnologias sociais e produção responsável de riqueza material e intelectual.

É exatamente esse período que jornais e empresariado querem esconder (porque o temem, porque foram derrotados moralmente por ele).

O futuro não será fácil.

Aliás, qual o sentido de 'futuro' mesmo?

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