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Aldo Fornazieri

Professor da Fundação Escola de Sociologia e Política e autor de "Liderança e Poder"

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Lula e Zé Dirceu: dois caminhos

"Para quem assistiu ou leu as últimas entrevistas de Lula e de Zé Dirceu deve ter percebido que eles estão indicando caminhos diferentes para 2022", aponta Aldo Fornazieri

José Dirceu, o grande estrategista da primeira eleição presidencial de Lula, em 2002, apresentou sua avaliação do cenário para 2018 pouco antes de ser decretado seu retorno à prisão: "O PT tem que ficar parado. Temos o candidato que ganha em primeiro e segundo turno com 40% dos votos. Pra que nós vamos nos mexer? Os outros é que estão todos desesperados, batendo cabeça, se afogando"; ele será obrigado a se reapresentar à Polícia Federal nesta sexta (18) para cumprir pena de 30 anos e nove meses -algo que nem aos assassinos é reservado no Brasil; Elize Matsunaga, que matou e esquartejou o marido em 2012, num crime que esteve por longo tempo nas manchetes, teve pena de 19 anos e 11 meses. (Foto: Mauro Lopes)
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Para quem assistiu ou leu as últimas entrevistas de Lula e de Zé Dirceu deve ter percebido que eles estão indicando caminhos diferentes para 2022. Antes de entrar no mérito dessa questão, convém dizer que, tanto na entrevista da UOL, quanto do Brasil 247, Lula voltou muito bem. Emergiu em 2021 como o velho Lula de guerra, com a verve afiada, com a contundência e com a indignação. A indignação em Lula cai-lhe como algo natural, como algo justo, como algo santo. Santo porque é justo. É uma indicação que combina o racional e o emocional. Por isso, é uma indignação motivadora, persuasiva.

A indignação dos atuais dirigentes do PT é bem diversa da indignação de Lula. Ao contrário da indignação de Lula, que é uma indignação quente, a indignação dos dirigentes é fria, meramente calculativa, só racional, beira a estridência. Isto faz toda a diferença na comunicação e na persuasão. Aliás, o PT, que se comunica muito mal, ou não se comunica, deveria fracionar as entrevistas do Lula em vários pequenos vídeos para girá-los nas redes sociais. 

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Lula deu estocadas em Haddad e no PT. Para Haddad disse mais ou menos o seguinte: Haddad vai ser líder, dirija, aponte caminhos. Você teve 47 milhões de votos. É preciso ser líder de forma permanente. Não existe líder ocasional. Este, ao menos foi o meu entendimento. De fato, Haddad deveria ter ocupado um espaço político muito maior do que vem ocupando depois das eleições de 2018.

Lula se mostrou incomodado com a passividade que reina no PT, no movimento popular e nas esquerdas. Os estudantes não reagem, os sindicatos não reagem, os partidos de esquerda se limitam a uma atuação congressual. Cobrou que a oposição seja oposição e não linha auxiliar do governo. De fato, às vezes, parece que setores da esquerda querem ser conselheiros do governo Bolsonaro, dizendo como se deve criar emprego, conduzir a Petrobrás etc.

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Cobrou de Gleisi Hoffman que coloque o partido na militância, na atividade, que tire o partido das reuniões e do defensivismo. Deu uma estocada também no programa do PT. O programa do PT tem duzentas e tantas páginas. A rigor, é um programa clandestino, assim como ficou clandestino o programa de geração de emprego. Pouca gente conhece. Um programa desse tamanho não é um programa partidário. É um tratado acadêmico. Lula sugeriu que seja desdobrado em panfletos. Lula disse aos petistas que só na atividade existe ânimo, combate ao desânimo, à depressão. Só na atividade existe energia, esperança, futuro. É preciso se preparar física e emocionalmente. É preciso ser motivado. Disse: “Quem quiser disputar, que faça mais do que eu. Quem ficar em casa chocando vai ser engolido”. 

Mas voltando ao tema das definições de caminhos para 2022, Lula deixa claro, nas duas entrevistas, que já definiu uma estratégia que, aparentemente, é a estratégia da direção do PT e também de Fernando Haddad. Este caminho, como já disse em artigo anterior, consiste em que o PT terá candidato independentemente se e de quantos partidos do campo da esquerda vierem se juntar aos petistas. 

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Mais do que isto: Lula só será candidato, se tiver esta condição legal, numa circunstância muito excepcional, se o país estiver mergulhado numa grave crise, de difícil saída. Se tudo correr normalmente, se é que é possível ver normalidade nos tempos atuais, Lula defenderá que Haddad seja o candidato. O cálculo, como já se disse, é o seguinte: a) 70% da sociedade é contra Bolsonaro; b) mas Bolsonaro deverá estar no segundo turno com cerca de 30%; c) a centro-direita, como têm reforçado alguns líderes do PT, está perdida, desorientada; d) com os 47 milhões que Haddad teve em 2018, deverá estar no segundo turno em 2022; e) dada a rejeição de Bolsonaro, Haddad tem grande chance de ser eleito presidente.

O caminho que propõe Zé Dirceu é diferente. Ele vê dois momentos distintos. O momento atual não é o momento de pôr o bloco na rua com vistas a 2022. O momento atual é do enfrentamento do governo, principalmente nas questões da pandemia e da democracia. O Brasil está sendo destruído. Por isso é preciso fazer uma frente democrática, unir tudo o que é possível para enfrentar Bolsonaro. 

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Zé Dirceu olha para 2022 e vê um cenário bem mais complexo. Por isso, defende uma frente popular, uma frente que agregue a centro-esquerda e a esquerda. Para ele, este deve ser o ponto de partida e não a antecipação do lançamento de uma candidatura do PT, embora o partido tenha a legitimidade de ter o candidato. A frente pode não se constituir, claro. Mas é preciso tentar. Acertadamente, Zé Dirceu chama a atenção para a possibilidade de o PT não ir para o segundo turno num quadro de grande fragmentação do campo popular. Acertadamente, indica que o candidato da centro-direita pode ser competitivo se este campo vier unificado com uma candidatura única. Poderia indicar também que pode haver um segundo turno sem Bolsonaro. O cenário está ainda muito indefinido.

A estratégia de Lula se assenta numa avaliação otimista. Na de Zé Dirceu, o cenário é mais pessimista. Se o cenário é otimista, então a tarefa consiste em criar as condições de governabilidade. Daí que, no PT, se acena para setores do capital. Fala-se em Luiza Trajano como vice. Entabulam-se conversas com o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD). O partido começa a se movimentar em busca de aliados ao centro, pois este campo pode agregar votos e garantir a governabilidade. A rigor, repete-se a estratégia de 2002.

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Mas, como tem dito José Genoíno, que vê um cenário mais pessimista, mais assemelhado ao que vê Zé Dirceu, o problema é que esses setores do capital se serviram do PT e o rejeitaram. Apoiaram e ainda apoiam Bolsonaro. Genoíno fala na necessidade de organizar o povo. Dirceu afirmou que a esquerda “não conseguirá governar o Brasil sem uma revolução social”. 

Independentemente das estratégias que possam ser montadas para 2022, o fato é que as esquerdas parecem que não conseguem entender o momento que vivemos. Não conseguem entender o momento de extraordinária excepcionalidade do nosso tempo provocada pela pandemia que se juntou a uma dantesca e trágica devastação do Brasil patrocinada por um governo criminoso. Em que pesem existirem deputados e dirigentes combativos nos diversos partidos de esquerda, não se entende que isto é insuficiente. A trágica excepcionalidade do nosso tempo só pode ser enfrentada por uma coragem inaudita, por ações desmedidas e também excepcionais. 

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Seria preciso formar uma grande frente pela vida, pela vacina, para salvar o povo. Seria preciso promover marchas sobre o Planalto, barrar a criminosa incompetência do Ministério da Saúde. Seria necessário declarar-se em obstrução permanente no Congresso Nacional enquanto soluções não fossem encontradas para salvar o povo pelos representantes do povo. Seria preciso juntar governadores e prefeitos para ações comuns e enfrentamentos comuns ao governo. Não há liderança nacional. Só há vácuo, abismo. No final das contas, só resta desolação, devastação do país, falência moral e institucional, a morte e a solidão do povo.

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