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Luciane Carminatti

deputada estadual (PT-SC)

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Não nascemos para ser laranjas

O período é oportuno: acabamos de completar 10 anos da instituição das cotas pela Lei das Eleições, de 2009, que passou a estabelecer a cada partido ou coligação a obrigatoriedade de preencher no mínimo 30% de suas candidaturas com mulheres. Estamos diante de uma tentativa de paridade que não deu certo. É hora de partir pra outra

(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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Nós, mulheres, nascemos para ser o que quiser. Ora, somos a metade, então, queremos paridade. Foi segurando cartazes com esse lema, “Somos la mitad, queremos paridad”, que as parlamentares mexicanas comemoraram, no último mês de maio, um feito histórico para o desafio de superar a desigualdade de gênero nos países latinoamericanos. No país onde já há distribuição igualitária de vagas entre homens e mulheres congressistas, agora, a paridade também tornou-se obrigatória em todos os cargos públicos e eletivos.   

E no Brasil? Por aqui, será no mínimo de mais cautela por parte dos partidos as primeiras eleições após o escândalo do "Laranjal" no então PSL do presidente da República, seguido pelas ações da Justiça Eleitoral para apertar o cerco contra candidaturas femininas de fachada. Ainda é tão pouco. 

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A performance na política derrubou, mais uma vez, a posição do nosso país no ranking da igualdade de gênero pelo Fórum Econômico Mundial. Neste quesito específico, o Brasil ocupa a posição 104 entre 153 países - estamos na lanterna da América Latina (posição 22 entre 25). Os critérios são a quantidade de mulheres eleitas para o Legislativo, liderando ministérios e como chefes de Estado. 

No estado em que atuo, Santa Catarina, sou a mulher mais votada da história da Assembleia Legislativa. Para o atual e terceiro mandato, recebi 61.271 votos em 293 dos 295 municípios catarinenses. No meu partido, o PT, há paridade de gênero para cargos diretivos, setorial exclusivo e formação política voltada às mulheres. Ainda assim, sei que se aproxima um processo eleitoral desafiador, especialmente no que se refere à distribuição equitativa do fundo partidário.

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Logo, acredito que a reversão da desigualdade de gênero na política brasileira exige passos tão firmes quanto largos. Por isso, sou autora de um projeto de resolução que visa à paridade de gênero nos parlamentos do Brasil. Exatamente: vagas distribuídas igualmente entre homens e mulheres a partir das eleições para Câmara dos Deputados, assembleias legislativas, câmara de vereadores e câmara distrital. 

Para tanto, conforme determina o artigo 60 da Constituição Federal, será necessário que mais da metade das assembleias legislativas aprovem tal projeto. Ou seja, em 14 estados, parlamentares precisam corroborar a iniciativa que traz em anexo único uma proposta de emenda à Carta Magna, alterando seu artigo 45 com a inclusão do inciso da paridade. 

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Há três meses, o Congresso Internacional de Liderança Política Feminina, que reuniu cerca de 800 mulheres em uma iniciativa da Assembleia Legislativa, Tribunal de Justiça e Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, em Florianópolis, aprovou moção favorável à essa medida. O documento, por mim elaborado, já está nas mãos do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM). Este ano será dedicado à sensibilização e mobilização das assembleias estaduais. 

O período é oportuno: acabamos de completar 10 anos da instituição das cotas pela Lei das Eleições, de 2009, que passou a estabelecer a cada partido ou coligação a obrigatoriedade de preencher no mínimo 30% de suas candidaturas com mulheres. Ao contrário de outras ações afirmativas, como o caso das cotas raciais para acesso às universidades públicas, estamos diante de uma tentativa de paridade que não deu certo, conforme demonstram os dados da Justiça Eleitoral. É hora de partir pra outra.

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Conscientes da dificuldade de obtermos uma profunda reforma política no Brasil, capaz de tornar o jogo menos desfavorável às mulheres brasileiras, nossa proposta está inspirada nos resultados positivos alcançados por outros países latinoamericanos como Argentina, Equador e México, já citado.  

Não se trata da correção de uma dívida histórica com a minoria, mas com a maioria: as mulheres, no Brasil, representam 52,5% do eleitorado. Mais uma vez recorro ao meu estado para trazer exemplos do que esta falta de representatividade significa. De 1995 a 2019, dos mais de 10,3 mil projetos de lei tramitados, somente 117 legislavam em defesa da mulher ou por interesses femininos. Míseros 1,12% do total. Na atual legislatura, em que alcançamos a maior bancada feminina da história com a entrada de 5 mulheres entre os 40 eleitos, esse índice triplicou. Ainda assim, não chega a 4% do total de projetos que resultam em legislação no estado de Santa Catarina. 

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Vejam o impacto na prática: desde 2017, as mulheres que usam ônibus do transporte público para se deslocar de uma cidade a outra podem solicitar a parada fora de ponto de embarque e desembarque após as 22h, evitando exposição a locais e circunstâncias inseguras. A garantia foi do PL 228/2016, que se transformou na Lei Estadual 17.278. Mas ainda estamos lutando para que mulheres com performance melhor do que homens no concurso militar não fiquem de fora da corporação pelo simples fato de serem mulheres. É que atualmente, 90% das vagas para o ingresso nas carreiras de polícia e bombeiros militares são destinadas aos homens. 

Sei, caro leitor, que você pode chegar ao final deste artigo julgando ser utópica a minha proposta concreta de paridade de gênero nos parlamentos do nosso país. Sei também, cara leitora, que a sua sensação pende mais para o lado da esperança. É que nós, mulheres, sabemos sobre as nossas conquistas de espaço: nunca foi fácil. Que o digam os chinelos das minhas conterrâneas agricultoras, catarinenses impedidas de entrar no Congresso enquanto pleiteavam o direito à creche dos filhos para voltarem ao trabalho, na década de 1980. Barradas por não estarem de sapatos, aquelas brasileiras não hesitaram em tirar as sandálias de dedo. Fizeram do empecilho um instrumento de protesto, lançados para mostrar o quanto as mulheres existem, e resistem. Para nós, assim como o México acabou de mostrar ao mundo, dar um basta à desigualdade de gênero na política está a uma decisão de distância. 

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