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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Nunca mais, general

"Sim, 1964 é um 'marco histórico', como nos diz Braga Netto, mas não pelas razões que ele e seus seguidores ultradireitistas apontam", escreve Denise Assis

(Foto: ACERVO ARQUIVO NACIONAL | ABr)
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Por Denise Assis, para o Jornalistas pela Democracia

A ordem do dia do general e ministro da defesa, Walter Braga Netto, vai além de “comemorar” uma data que não é para ser comemorada, mas sim lembrada, para que não se repita. Quer dizer, repetir o golpe eles já repetiram, mas pelo menos devemos nos proteger dos seus desdobramentos: a montagem de um aparato de repressão que levou à morte e ao “desaparecimento” 433 presos políticos sob a tutela do estado e, portanto, sob a responsabilidade de instituições que tinham poder sobre as suas vidas e o dever de preservá-las.  

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A nota traduz o caráter sabujo do general, a sua subserviência e a sua volúpia pelo poder que galgou na nova posição - a de ministro de estado -, e de quem goza de trânsito no gabinete presidencial e aufere rendimentos muito além dos que obteria na caserna. A nota lamentavelmente é corroborada pelos comandantes das Forças Armadas, que tanto quanto o chefe, se curvam.

Braga Netto, desde aquele março de 2019, quando o Rio de Janeiro presenciou um crime brutal, de caráter político, sob suas vistas de interventor, está indelevelmente ligado a Bolsonaro e este, por sua vez, ao general. O interventor tem razões de sobra para ter espaço junto a Bolsonaro. Ignorou a atuação das milícias. E Bolsonaro tem o dobro de razões para querer que Braga esteja sob seus olhos. Teme por si e por seus “filhinhos”. Parodiando a fala do ex-ministro Jarbas Passarinho (na época ministro do Trabalho), na assinatura do Ato Institucional nº 5 - AI-5, "Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência”. O que vale mesmo é salvar a si e às suas convicções. Importa mesmo é o equilíbrio no poder, em ambos os casos. Então, convém praticar o conteúdo da velha marchinha, aumentando o cordão dos puxa-sacos.

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Sim, 1964 é um “marco histórico”, como nos diz Braga Netto, mas não pelas razões que ele e seus seguidores ultradireitistas apontam. Mas por ter deixado atrás de si, já nas primeiras horas, dois mortos no Recife – estudantes, de 17 e 21 anos -, uma trabalhadora, e um trabalhador, no Centro do Rio, na Cinelândia, em frente ao Clube Militar. Foram 50 mil prisões imediatamente ao golpe na conhecida “operação limpeza”, empreendida pelo “comando supremo da revolução”. 

E não porque essas pessoas fossem “comunistas”, pois esta ameaça era tão verdadeira quanto o é hoje, e quanto à “Cuca”, que vem pegar a crianças que não querem dormir. 

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Foram arrancados dos seus postos cerca de sete mil militares do Exército e da Aeronáutica, discordantes da brutalidade recém instaurada e 4.500 homens do mar, acusados de serem seguidores do almirante Cândido Aragão, que apoiou a revolta dos marinheiros, contra as privações vividas na miserável vida de grumetes.

Ao longo dos 21 anos da fatídica manutenção do regime, a custa de um crescente aumento da violência, um exército imensurável de pessoas passou por prisões e sessões de tortura, nas mãos de militares responsáveis pela formação desses que aí estão. Já escrevi sobre isto e repito. Mourão, Villas Boas, Braga Netto e outros de sua faixa etária foram feitos oficiais, ouvindo as histórias e fanfarronices do que se jactavam de ter “prendido e arrebentado”. 

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Analisar e compreender um fato ocorrido há mais de meio século, com isenção e honestidade de propósito, requer o aprofundamento sobre o que a sociedade vivenciava naquele momento”. Certamente, general. O momento era semelhante ao que acabamos de vivenciar, em 2016. Articulações conspiratórios no meio político, amparadas num bombardeio da mídia comprometida com interesses externos. Naquela época, fruto da influência e convivência dos oficiais brasileiros nos campos de batalha da Segunda Guerra, com o comandante americano, (e ex-secretário de Estado), Robert McNamara, que se tornou próximo do general Castelo Branco. E, em 2016, do vai e vem dos integrantes da força-tarefa da “operação Lava-Jato”, à CIA. “A história não pode ser reescrita, em mero ato de revisionismo, sem a devida contextualização”. Totalmente de acordo, general. Não tente reescrevê-la, pois ela está toda documentada pelos seus, em documentos arquivados por vocês mesmos, que espumaram de ódio vendo pesquisadores comprometidos com a história e a liberdade, analisá-los e transformá-los em livros e artigos, revelando a atrocidade cometida nas fileiras e nas dependências de instituições do Estado brasileiro. Tampouco podem ser restituídos os 433 “CPFs cancelados” por seus pares. Esses nomes, general, não poderão ser reescritos, suas vidas não têm como ser restituídas, mas suas histórias, sim. Não perca seu tempo, portanto, se esgoelando contra o óbvio, o registrado em farta documentação aqui e nos EUA – a matriz dos golpes – que nos remeteram, pelas mãos do atual presidente, Joe Biden, então o vice americano, a verdade em documentos indesmentíveis. “Nos anos seguintes ao dia 31 de março de 1964, a sociedade brasileira conduziu um período de estabilização, de segurança, de crescimento econômico e de amadurecimento político, que resultou no restabelecimento da paz no País, no fortalecimento da democracia, na ascensão do Brasil no concerto das nações e na aprovação da anistia ampla, geral e irrestrita pelo Congresso Nacional” O senhor precisa estudar mais, general. O que levou os militares a desistir da permanência à frente do país foi uma inflação anual na casa de 227% no fim da condução do ditador João Figueiredo, que não suportou a força e o eco das ruas. O povo gritava a incompetência dos militares. Protestava contra a dívida externa quintuplicada, o arrocho salarial.“Neste ano, em que celebramos o Bicentenário da Independência, com o lema “Soberania é liberdade!”. Com toda razão, general. Quis o destino que a data coincidisse com a eleição para um novo presidente. Ordeiros, conscientes do fosso em que fomos novamente jogados, haveremos de reconquistar exatamente isto: “soberania e liberdade”, devolvendo-os aos quartéis, de onde não deveriam ter saído, pois política é para civis e não para militares. Na quarta-feira (30/03), em Parnamirim, o presidente ameaçou: "O povo armado jamais será escravizado. E podem ter certeza que (sic), por ocasião das eleições de 2022, os votos serão contados no Brasil. Não serão dois ou três que decidirão como serão contados esses votos. Defendemos a democracia, a liberdade, e tudo faremos, até com sacrifício da nossa vida, para que esses direitos sejam relevantes e cumpridos pelo nosso país"...

Um alerta, desta vez aos progressistas: os arroubos de um deputado fascista, que fez da Câmara Federal refúgio para a sua transgressão, bradando que lá é um espaço inviolável – e realmente o é -, pode ter sido apenas um ensaio do capitólio “patropi”. Podem ter em mente, ele e seu grupo, refugiarem-se lá, sob as asas do presidente da casa, Arthur Lira, refutando o resultado das urnas. Porém, o tilintar destas mesmas urnas pode ser de tais decibéis, que terão de sair de lá sob vara. “liberdade” e “democracia” são, sim, “valores inegociáveis”. Este portanto, é, sim, o ano de se comemorar a independência. A nossa independência, general.

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