O Brasil precisa enfrentar o extermínio da juventude negra
Temos a obrigação de desnaturalizar as mortes dos nossos jovens negros e pobres. Por isso, convido toda a sociedade para conhecer e reivindicar a apreciação dessa Agenda Legislativa na Câmara dos Deputados. A juventude precisa viver e o Brasil não pode esperar
Chegamos ao Dia da Consciência Negra em 2017 com uma situação assustadora. Enquanto a grande mídia se choca apenas com os tristes atentados que ocorrem pelo mundo, o Brasil vive um verdadeiro massacre a sua juventude negra.
A ditadura acabou há 32 anos e por aqui se matou desde então uma população do Uruguai; três milhões de pessoas. Segundo dados do Mapa da Violência, são sete jovens assassinados por hora no Brasil, 80% negros. Um extermínio.
O último país ocidental a abolir o trabalho escravo não se preocupou em superar definitivamente a escravidão e condenou milhões de brasileiros e suas famílias ao abandono, ao preconceito e à vulnerabilidade com a não reparação de danos e não inclusão no sistema educacional.
Os negros não só foram deixados ao relento no plano de desenvolvimento brasileiro, como sua participação na política foi freada o quanto possível. A Lei Saraiva, de 1881, só permitia a condição de votar aos letrados, o que foi mudado apenas em 1985. Como a maioria dos negros era analfabeta, ficaram sem poder eleger um representante que padecesse do mesmo sofrimento para, enfim, mudar aquela situação. E assim chegamos a essa realidade atual.
Presidi uma CPI que resultou em diversos projetos de lei para o enfrentamento ao extermínio de jovens negros e pobres, que foram reunidos em uma Agenda Legislativa lançada no dia de hoje. A comissão fez o conservador parlamento brasileiro reconhecer pela primeira vez a nossa maior obviedade: existe racismo no Brasil.
Um dos projetos oriundos da CPI é o PL 2438/15, que institui o Plano Nacional de Enfrentamento ao Homicídio de Jovens, que traçou cinco metas para o enfrentamento a essa triste realidade. Apenas cinco. Nada impossível para a quinta economia do mundo. O que falta é vontade política para cumpri-las. São elas:
1- Reduzir o índice de homicídios a um dígito a cada 100 mil habitantes. (Todas as organizações internacionais consideram que o país que registra homicídios acima de um dígito, vive em estado de Guerra Civil.) 2- Elucidar 80% dos crimes (Hoje, se elucida 8% e apenas 3% são condenados.) 3- Zerar a letalidade policial. (O policial é garantidor e não violador de direitos.) 4- Zerar a mortalidade entre os policiais. (Em sua grande maioria, também negros e pobres.) 5- Garantir a implementação de programas sociais de reparação de danos nas áreas mais violentas.
Diagnósticos para combater o extermínio não faltam. Sabe-se que em 142 municípios se concentram 90% dos assassinatos e os dias e os horários em que ocorrem os crimes são conhecidos. Por isso, além da Agenda Legislativa, produzi uma cartilha aos estados e municípios com sugestões de ações a serem tomadas na preservação da vida da juventude brasileira.
A Segurança Pública deve ser preocupação, como é uma responsabilidade, de toda a sociedade, principalmente aos progressistas. Não se pode relegar esse tema, o deixando unicamente aos conservadores, os mantedores desse modelo racista e patrimonialista.
A Constituição de 1988 manteve a noção de polícia da época da ditadura como sendo uma força auxiliar do Exército, que deve cuidar, por sua vez, dos inimigos externos e da defesa do país. Ao adotar essa lógica, temos uma polícia que não é comunitária, preventiva e conciliadora, mas de confronto, de combate a um inimigo interno.
É urgente pensarmos uma nova polícia, que não priorize, em toda a persecução penal, os crimes ao patrimônio em detrimento aos crimes contra a vida. Assim como questionar a falida e espetaculosa guerra às drogas, onde os barões do tráfico moram em frente ao mar, camuflam seus negócios e gozam de prestígio político, enquanto negros e pobres trocam tiros e se matam em uma trágica realidade.
60% dos presos no Brasil são presos provisórios, a sua gigantesca maioria é composta por negros e pobres esquecidos no sistema penal. Muitos deles quando condenados, já cumpriram três vezes o tempo da pena, o que, certamente chocaria a sociedade se os injustiçados em questão fossem brancos.
Temos a obrigação de desnaturalizar as mortes dos nossos jovens negros e pobres. Por isso, convido toda a sociedade para conhecer e reivindicar a apreciação dessa Agenda Legislativa na Câmara dos Deputados. A juventude precisa viver e o Brasil não pode esperar.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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