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Nívea Carpes

Doutora em Ciência Política e mestre em Antropologia Social

27 artigos

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O golpe que foi golpe e o desafio de gente virar gente

A presidenta Dilma foi usada como alvo para onde foram direcionados os maus sentimentos que estavam latentes em uma considerável parcela da sociedade brasileira. Justamente quando se grita pela moral, contra a corrupção, pela família, por Deus, pela religião, pela justiça, pelos heróis e por mitos, é que se faz as piores coisas

O combate à palavra golpe (Foto: EVARISTO SA)
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Precisamos conversar com Sócrates, pedir sua ajuda para nos tornarmos pessoas melhores. Desde o golpe de 2016, estamos vendo nossa sociedade nua, tendo a certeza de que precisamos mudar, não para sermos mais moralistas, mais preconceituosos, mais ignorantes e menos solidários, mas para o contrário. 

Não se trata de estarem nus aqueles que estão distantes de nós, estão nus todos, os de longe e os de perto, inclusive nós. Cada pessoa foi impulsionada a pôr o que tinha dentro de si para fora. É assustador, o silêncio ensurdecedor de um espaço interior que não sabe traduzir o que vê em palavras. É decepcionante! 

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Bom seria se essas pessoas fossem bonitas. São muitos, tão perto e tão feios.

Soubemos o que cada pessoa, com aparência bondosa, trazia de fato dentro de si. 

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A presidenta Dilma foi usada como alvo para onde foram direcionados os maus sentimentos que estavam latentes em uma considerável parcela da sociedade brasileira. Justamente quando se grita pela moral, contra a corrupção, pela família, por Deus, pela religião, pela justiça, pelos heróis e por mitos, é que se faz as piores coisas. 

Possivelmente, por ser uma moral, uma família, um Deus, uma religião e uma justiça muito peculiares, definidos de maneira restrita e exclusiva, o que já define que muitos estão ficando de fora dessa suposta “boa sociedade”, onde só cabem alguns. 

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Por que tantos não suspeitam do moralismo, do retorno ao passado, do preconceito, da fixação pela sexualidade alheia, do racismo, do machismo...? E, porque alguns conseguem desconfiar dos discursos salvadores, dos personagens heroicos e das famílias “tradicionais”? 

O que podemos pensar sobre os moralistas que consideram possível um adesivo no qual a presidenta aparecia com as pernas abertas no local de abastecimento dos carros?

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Manter o estranhamento e buscar algumas ou todas respostas, é parte de um tratamento, de uma tentativa de recuperar o bom-senso, a capacidade de convivência e o que nos vincula uns aos outros. Porque deixar de questionar esse mal-estar é assimilar um estado de coisas, falas e emoções que nos conduzem ao barbarismo e ao mais rude de nossa animalidade. 

Segundo Sócrates, uma das chaves para fazer clara a ignorância é o diálogo, o diálogo que busca expor as justificativas e os conhecimentos, assim como as virtudes e habilidades atribuídas aos sujeitos. Entre dúvidas e questionamentos que acompanham a vida, observando as certezas dos que se arrogavam sabedoria, Sócrates conclui “saber que nada sabia”.

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É possível que se estivéssemos próximos de nossas dúvidas, aceitando o desconhecimento, colocaríamos as sociedades em menores perigos. 

Os conservadores, os machistas, os moralistas, os terraplanistas... com todas as suas certezas, gritos, arrogância e discursos, levam o Brasil ao precipício e entregam-se de maneira consentida como servos de impérios. Estavam certos de que levariam o Brasil para o rumo certo.

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Tomar consciência de si, é uma condição preliminar para tomada de posse da própria alma e um ato de coragem que protege todas as existências. Cuidar de si, mais do que das suas coisas, é o que possibilita maior sensatez e tornar-se uma pessoa melhor para a vida.

Aqueles que cuidam mais das suas coisas, preferem ouvir o que lhes é mais agradável. Nesse ponto é que se encontram golpistas e pessoas que passam pela existência sem ter contato consigo mesmas. Aquelas que correm para fora do mar da vida, julgando os que tiveram a coragem de fazer seu próprio mergulho. 

Dentre os que mergulham estão todos que vivem fora do “tradicional”, que desafiam a ânsia de retorno ao passado e que aceitam diferenças, assim como a dinâmica da vida que corre para frente e horizontalmente.

Em Sócrates, “a única coisa que importa é viver honestamente, sem cometer injustiças, nem mesmo em retribuição a uma injustiça recebida”. Nessa busca, são extraordinariamente raros os fatos que poderiam ser considerados indiscutíveis, o que abre a porta para discutirmos a respeito de tudo, possibilitando estarmos abertos à experiência de conhecer, com a ciência de que não sabemos. 

O sábio e a pedalada fiscal...

Evitaríamos momentos históricos como o impeachment de Dilma Rousseff, a Lava Jato e a prisão de Luiz Inácio Lula da Silva, se tivéssemos a predisposição para o debate e para a participação, retirando o anseio por salvadores e por narrativas que nos economizam de pensar sobre as coisas do mundo. 

É revolucionário aceitar o chamado a conhecer a si mesmo, desbravando a própria subjetividade, aproximando-se da própria alma. Concordando que é primeiro necessário prestar obediência ao que diz nossa própria consciência, não poderíamos estar de acordo com uma consciência que ainda não se conhece.

O reconhecimento da própria ignorância é o momento e o sinal do começo da autoconsciência. O que podemos saber ou dizer sobre o outro, quando nunca chegamos próximos de nós mesmos? Mais do que em qualquer tempo, a Era do deus Consumo inebria a capacidade de tomar consciência, tornando-nos cooptados por mentes e corações para uma vida que está fora, facilitando o caminho da pós-verdade conveniente e das verdades universais. 

A paz exige reencontrarmos com nós mesmos e tomarmos posse de nossa ignorância. Ocupar-se do contato profundo consigo mesmo é o caminho que conduz ao respeito pelo outro, à vida sem julgamento, à aceitação de cada outro, à compreensão das limitações e nos liberta da loucura das certezas que maltratam e matam em nome do “bem”, em nome de “Deus”, em nome da “família” e de tantos outros pretextos para o que há de pior no ser humano.

Sócrates nos convida à faxina da alma, à expulsão das ideias turvas, das ilusões e dos equívocos que nos impedem de construir a vida interior. O verdadeiro bem está no cuidado da própria alma. É por isso que Sócrates confronta a democracia ateniense no século 38 a.C., que pertencia a uma minoria. Ele faz um convite inclusivo, ele convida todos ao autoconhecimento e à participação. É punido com a morte, uma forma da democracia de elites defender-se.

“Conhece-te a ti mesmo” e terás menos tempo para destruir o mundo e para apoiar golpes, não serás capaz de ignorar o mal que te envolve, de não perceber teu ego e de não tomar consciência do egoísmo que te mobiliza. 

A autoconsciência despertada e em permanente vigília não é uma ciência para obtenção de prestígio, é o encontro com a liberdade e a dignidade que nasce no interior e se expressa exterior.

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