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Leopoldo Vieira

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O labirinto político da PEC 241

Como foi governo, o PT e a Minoria preocuparam-se com os impasses fiscais e chegaram a formular, em 2016, proposta semelhante à PEC 241: em março deste ano, o então ministro Nelson Barbosa apresentou proposta de projeto de lei com criação de teto para o gasto público

Brasília- DF 29-09-2015 Foto Lula Marques/Agência PT Ministro Nelson Barbosa durante audiencia da comissão mista de orçamento. (Foto: Leopoldo Vieira)
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A tônica que inaugura a semana é apreciação, pela Câmara dos Deputados, da PEC 241, cuja inconstitucionalidade já fora rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal.

Sua tramitação se insere num quadro no qual a nova oposição pode estar caindo numa grande armadilha, tal quando fez, nos anos 90, oposição radical ao Plano Real, quando o denunciou, com convicção que superava a análise política e econômica, como fadado ao fracasso iminente.

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O resultado foram duas vitórias acachapantes do PSDB (FHC) em 1994 e 1998, cuja amenização só veio a ocorrer em 2002, quando o candidato Lula lançou a Carta aos Brasileiros, comprometendo-se a agregar à estabilidade - a ser preservada por meio do respeito aos acordos e contratos - uma política de inclusão social e distribuição de renda moderada.

O PT e os demais partidos que compõem a Minoria foram governo durante 13 anos, o que implicou em adquirir credibilidade para governar em democracia, envolvendo, inclusive, pactuações e relacionamento com o meio empresarial e financeiro (o mercado) nacional e internacional.

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Assim, uma reflexão de partida, que parece não ter sido feita, deveria ser entre tentar ou não dialogar com estes setores, além da base social da nova oposição; ou fazer um enfrentamento ao governo baseado na demarcação e denúncia unilateral.

Isso tem consequência direta em como incidir sobre a tramitação da PEC 241, que não se encerra na Câmara.

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Como foi governo, o PT e a Minoria preocuparam-se com os impasses fiscais e chegaram a formular, em 2016, proposta semelhante à PEC 241: em março deste ano, o então ministro Nelson Barbosa apresentou proposta de projeto de lei com criação de teto para o gasto público.

O limite seria estabelecido pelo Plano Plurianual (PPA) e, ficando evidente que o teto seria superado, entraria em ação um mecanismo de ajuste automático em até três estágios: No primeiro, seriam restringidos os aumentos de salário real e o número de cargos comissionados. No segundo, seriam proibidos os aumentos nominais de salário e de despesas de custeio. No último, o salário mínimo só teria reposição da inflação, ficando vedado qualquer aumento adicional do seu montante.

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Ainda que opte por deixar para trás esta proposta, o governismo certamente irá fazer recordá-la na opinião publicada.

Para fazer a escolha, o PT e a Minoria devem ter em mente que o centro real da disputa colocada é entre o PMDB e o PSDB, que, respectivamente, resiste a aplicar integralmente a agenda econômica tucana, e vem pressionando, via grande imprensa, o governo Michel Temer.

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Logo, incidir sobre o mercado no bojo da tramitação da PEC, não seria uma escolha ruim para o PT e a Minoria para readquirir credibilidade como alternativa de poder.

É preciso falar para além da classe média de esquerda radicalizada, que se imagina plena de razão e força política, e reconstruir consensos de centro-esquerda (sem os quais não se ganha eleições e/ou não se governa).

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Uma posição intransigente pode passar a mensagem ao povo pobre e trabalhador de que apenas compõem o que as pesquisas atestam serem vistas por aquele setor como "briga das elites". Porém, ao mediar os interesses destes, sobretudo em relação à educação e saúde, no debate público em torno da PEC 241, pode angariar valiosos dividendos políticos para o cenário incerto atual e para 2018.

Não se está nem em 2002 e nem em 2006, 2010 ou mesmo 2014. De mais amado, o PT passou a mais odiado.

Desta maneira, mais do que um motivo para denunciar o "retrocesso", poderia ser uma oportunidade para emendarem a PEC e melhorá-la.

O objetivo nuclear da PEC 241 não é um corte de despesas, mas o controle do ritmo de aumento de despesas por meio de uma regulamentação da relação entre receitas x despesas no orçamento federal.

A PEC 241 tenta trazer soluções para um fato: no período pré-crise, o governo federal foi capaz de acumular sucessivos superávits primários e reduzir a dívida pública do em proporção ao PIB. Porém, a geração de superávits não decorreu do controle da despesa, mas do crescimento da receita, impulsionada pela expansão econômica.

O modelo de metas de resultado não se mostrou capaz de conter o crescimento da despesa pública no âmbito da União. Como resultado, a queda da receita tem sido acompanhada da elevação do endividamento público e sem previsão a curto prazo de recuperação da atividade econômica que restabelecesse o antigo regime do crescimento das receitas; e, ainda que houvesse, nada garantiria a opção política empresarial de fazê-lo, como no período das isenções lançadas pela ex-presidenta Dilma.

Haveria outras alternativas? Sim, por suposto. Mas, diante da universalização da sensação de que o último governo do PT esgarçou as contas públicas, qualquer apontamento carece de credibilidade. E a PEC está em plena tramitação, com foco ativo da imprensa e exige uma posição concreta sobre seus meandros.

A PEC fixa limites de despesa globais de forma individualizada para Poderes e Órgãos autônomos . Não prevê limite por ministérios.

Isso quer dizer que, no âmbito da União, não necessariamente cairiam ou não teriam aumento real a saúde e a educação. Dependeria das decisões do governo e Congresso sobre a alocação de recursos.

Fora isso, há uma previsão constitucional para saúde e educação, então, os recursos não poderão ir abaixo do que existe como regra para o piso da saúde e educação mesmo com a aprovação dessa PEC, e a variação pelas novas regras ficariam nos termos dito acima.

A PEC prevê que, só no caso de descumprimento do limite, aplicam-se, no exercício seguinte, ao Poder ou ao órgão que o tenha descumprido, as PRINCIPAIS seguintes vedações:

(i) concessão, a qualquer título, de vantagem, reajuste ou adequação de remuneração de servidores públicos, inclusive do previsto no inciso X do caput do art. 37 da Constituição, exceto os derivados de sentença judicial ou de determinação legal decorrente de atos anteriores à entrada em vigor da Emenda Constitucional que institui o Novo Regime Fiscal;
(ii) criação de cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa;
(iii) alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;
(iv) admissão ou à contratação de pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa e aquelas decorrentes de vacâncias de cargos efetivos; e
(v) realização de concurso público.

De efetivo aspecto negativo, então, haveria:

A PEC propõe que o Novo Regime Fiscal vigore por 20 anos, um prazo que reduz o impacto das escolhas políticas das urnas sobre variáveis conjunturais importantes na economia, que pode fazer a sociedade exigir um incremento de investimentos públicos contra desigualdades e vulnerabilidades sociais.

A partir do 10º exercício de vigência da emenda, os limites poderiam ser alterados por meio de projeto de lei de iniciativa do presidente da República, a se verificar se a medida teve a eficácia planejada. Porém, o prazo para testar é demasiado longo. Uma urgência política e social seria bloqueada pelo tempo e exigências legais de retificação.

A meta do Plano Nacional de Educação (PNE), de investir 10% do PIB em educação até 2024 poderia ser comprometida e, no mínimo, ficaria refém das decisões orçamentárias do governo e do Congresso.

Com o piso para saúde e educação estabelecidos pelo exercício de 2016, a partida dos recursos de ambas seria baixo.

Outro impacto negativo (mas, janela de oportunidade) é que a PEC não cria um mecanismo para transitar de ciclos recessivos para os expansivos, aplicando austeridade em tempos de recessão, gerará caixa fraco para períodos de crescimento, incapazes de incrementá-lo.

Em comparação com outros países, 26 adotam mecanismo semelhante à PEC 241. Tal levantamento foi feito ainda pela equipe do ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa, com base em dados do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Dos 26 países, oito têm cláusulas de escape pelas quais as regras podem ser descumpridas em casos de desastres naturais ou recessão econômica:

Austrália: regra pela qual o crescimento real anual das despesas não deve exceder 2% até que o superávit fiscal atingisse 1% do PIB.
Dinamarca: o crescimento real das despesas não deve exceder a alta do PIB potencial. Se isso ocorrer, a diferença deve ser financiada com medidas de aumento de receita.
Estados Unidos: o governo estabelece tetos para gastos discricionários, e, caso não sejam cumpridos, é preciso realizar um plano de médio prazo para reduzir o déficit fiscal.
Japão: há uma regra pela qual as despesas, excluindo o pagamento de dívida e juros, não devem exceder o nível do ano anterior.
Panamá: a norma pode ser revista se o PIB real crescer menos de 1% no ano. Porém, o governo precisa se comprometer a fazer o teto voltar para a meta em até três anos.
Peru: o crescimento real da despesa corrente é limitado a 4%, mas ficam de fora desse controle gastos com programas sociais, infraestrutura e equipamentos para militares e polícia. Contudo, se houver queda real no PIB, ou o Congresso declara situação de emergência a pedido do Executivo, há uma cláusula de escape.
Rússia: o teto é baseado nas receitas com a exploração de petróleo e também no comportamento do endividamento líquido do governo.

Como se pode observar, nos principais casos deste benchmarking há cláusulas de exceção, o que pode ser usado, comparativamente, para dar fortes argumentos para emendas a assegurar redução do prazo e situações específicas.

No jantar ofertado pelo presidente Michel Temer, projetou-se um empoderamento do Congresso e o afinamento entre Executivo e Legislativo para esta tomada de decisão e não a alienação do sistema político ante a ascensão tecnocrática, como sugeriu o cientista político Marcos Nobre, em coluna desta segunda-feira, no Valor.

Cabe destacar que o jantar foi uma verdadeira "revolução da governabilidade", no sentido de incluir o Baixo Clero para negociações estratégicas num ambiente sedutor e receptivo.

Marca que, aliás, é muito próxima ao que se chama de Lulismo.

(Quanta falta fizeram jantares como este? Ou pequenos, a este exemplo, com beneficiários de programas sociais? Oportunidade para fotos, atenção, conversa, retornos, intimidade, promessas, satisfações...)

Auto isolamento na denúncia é apenas uma maneira política de reproduzir o método de gestão que esteve na raiz da queda do governo Dilma.

Dialogar e reconstruir ponte com o centro seria uma boa forma prática de realizar o necessário mea culpa em relação a esta postura, tal como em relação ter-se optado por conceitos econômicos teóricos ao invés da interação política com o mercado e resgatar o explícito compromisso em mediar forças para proteger empregos, salários, os mais pobres e os trabalhadores, ante a nova postura de estimular tão somente a agitação e propaganda em círculos de esquerda.

O "golpe" (se não for politicamente fatorado) é o conceito perfeito e a armadilha teórica ideal, construída na resistência ao Impeachment de Dilma Rousseff, para a direita manter a esquerda rodando em círculos, enquanto fagocita o centro e isola os interesses nacionais e dos trabalhadores.

Emendar a PEC, criando o "gatilho" de transição, poderia ser um excelente proposta popular.

Emendar a PEC para proteger saúde e educação, além de criar o "gatilho" fiscal anticíclico poderia refigurá-la em algo semelhante à ideia da "Consolidação das Leis Sociais" em alusão à CLT de Getúlio Vargas - que acabou não ocorrendo - pensada por Lula em 2009.

Lula poderia encampar este debate: o homem da oposição responsável de um estadista, mas o ferrenho defensor dos mais pobres e trabalhadores.

A PEC se aplica à União e não alcança, portanto, Estados, Distrito Federal e Municípios. Cumpre observar, todavia, que, como contrapartida ao acordo de renegociação das dívidas estaduais junto à União, anunciado em 20/6/2016, os Estados deverão aderir à regra de limitação do crescimento da despesa proposta na PEC 241/2016.

Emendar a PEC no sentido de proteger saúde e educação, e criando o "gatilho" anticíclico, seria mais factível obter o apoio de governadores para estas propostas.

Alguns outros elementos poderiam melhorar a proposta sensivelmente:

Reduzir prazo de vigência da PEC para um período mais razoável, compatível com o monitoramento da crise e a periodicidade de consulta às urnas;
Criar cláusula de exceção legal da aplicação das regras para situação de emergência, descrevendo-a como níveis elevados de desemprego (a partir de dois dígitos);
Retirar educação e saúde das regras da PEC;
Instituir uma espécie de CPMF como gatilho anticíclico, voltada ao financiamento exclusivo de infraestrutura para incrementar a expansão da economia e, logo, das receitas;
Criar regra específica de retificação do orçamento no caso de os limites durante a execução se mostrarem superiores às dotações aprovadas;
Prever o uso de parte das reservas cambiais caso comprovado o aumento da demanda por despesas sociais, principalmente na área da seguridade e assistência social, sem comprometer o teto;
Previsão legal de plebiscito sobre Constituinte Exclusiva para Reforma Tributária e Política em 2018, para ser realizada em 2019.

O que sairia de uma disputa assim é incerto, mas haveria alguma disputa útil e, quiçá, globalmente benéfica ao País.

Sem falar nos entendimentos imprescindíveis para que, em 2018, seja o mártir, seja o mito, estar em plenas condições de ser, pela quinta vez, testado nas urnas da democracia.

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