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Ricardo Bruno

Jornalista político, apresentador do programa Jogo do Poder (Rio) e ex-secretário de comunicação do Estado do Rio

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O país deve a Moro a criação do juiz de garantia

"A criação do juiz de garantias, aprovada no pacote anticrime, é consequência direta dos abusos praticados pelo ex-juiz Sergio Moro na condução da Lava Jato, revelados pelo The Intercept", escreve o jornalista Ricardo Bruno

(Foto: Marcelo Camargo - ABR)
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A criação do juiz de garantias, aprovada no pacote anticrime, é consequência direta dos abusos praticados pelo ex-juiz Sergio Moro na condução da Lava Jato, revelados pelo The Intercept. A falta de pudor com que transitou entre os papeis de juiz e auxiliar de acusação trouxe a público a necessidade de mudança. O conjunto de revelações contribuiu para firmar juízo na sociedade brasileira  de que era necessário apartar a investigação do julgamento. A promiscuidade entre juízes e procuradores, combinando estratégias e definindo   passos investigatórios, retirou da Lava Jato a mínima isenção exigida.

Se não fossem os diálogos surpreendentes e comprometedores  entre  Moro e Dallagnol, haveria outras razões a recomendar a separação de papéis  entre investigadores e julgadores. Ainda que não haja dolo, o juiz encarregado de presidir a investigação acaba naturalmente se contaminando nas fases processuais diante da atuação da defesa. Por exemplo, os recursos para tentar preservar o réu e limitar a investigação – iniciativas legítimas do ponto de vista processual – ganham ares de confronto com a autoridade judicial. A queda de braço com a defesa acaba, portanto, opondo juiz e réu durante a fase investigatória. Do natural confronto processual nasce o antagonismo que contamina a imparcialidade necessária ao julgamento.

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Não por acaso vários países do mundo adotam o modelo, permitindo assim que um magistrado absolutamente livre de pré-conceitos – assim mesmo com hífen -  da fase de instrução possa decidir com mais  isenção. “Trata-se de uma conquista da cidadania”, como enfatizou o insuspeito ministro Celso de Melo.

Vem de longe esse debate na sociedade brasileira. Quem acompanhou as reuniões da Comissão Afonso Arinos, responsável pelo anteprojeto da Constituição de 88, - eu estava lá, nos salões do  Hotel Glória  -  sabe que o tema foi objeto de  debates exaustivos. Já àquela época havia o entendimento de que este era o melhor formato para tramitação do processo penal, um avanço em direção a julgamentos mais isentos. A proposta esteve presente em diversas fases do projeto da nova Constituição. O Centrão fez um destaque para que a tema fosse votado em separado, o que acabou não acontecendo por pressões corporativas de setores do Judiciário. Fugiu-se ao debate e à votação por absoluta certeza de que, se submetido ao escrutínio da Assembleia Nacional Constituinte, seria inevitavelmente  aprovado.

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Pesquisa realizada na Alemanha mostra que  todos os juízes que tiveram contato maior com a investigação preliminar e, depois, atuação mais ativa na instrução criminal, acabaram por condenar. Enquanto, enquanto que aqueles que não foram equipados com as peças de informações preliminares tiveram maior nível de ambivalência, ou seja, houve equilíbrio entre o número de condenações e de absolvições.

Nem todos do Judiciário estão em desacordo com a mudança. A juíza Andréa Pachá, uma das mais ilustres e preparadas do Tribunal de Justiça do Rio, exprimiu com brilho as razões objetivas que a levam a aprovar a medida. “Uma das grandes angústias que sentia como juíza criminal vinha da possibilidade de cometer uma injustiça, mandando para o cárcere uma pessoa inocente. Imaginar uma pessoa no inferno sob minha responsabilidade me fazia extrema e redobradamente cuidadosa. Por isso, achei importante o juiz de garantia. Um avanço da cidadania e mais uma garantia não só para o acusado mas também para o juiz, que terá melhores condições de atuar imparcialmente na produção das provas. Mais direitos e mais garantias deveriam ser sempre motivo de celebração”.

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Contra a criação do juiz de garantias uma única crítica parece procedente: a de que muitos municípios do interior tem apenas um magistrado. Nada que não possa ser regulamentado através da implantação gradual da mudança benfazeja. Abandonar um avanço civilizatório por conta de eventuais entraves burocráticos não passa de biombo daqueles que querem justificar a manutenção do status quo – onde, infelizmente, alguns juízes ultrapassam os limites da própria lei, vide denúncias do  Intercept. Contrário à inovação, Moro é o maior responsável por ela. Numa homenagem às avessas, o país deve a ele este avanço das garantias individuais. 

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