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Milton Blay

Formado em Direito e Jornalismo, já passou por veículos como Jovem Pan, Jornal da Tarde, revista Visão, Folha de S.Paulo, rádios Capital, Excelsior (futura CBN), Eldorado, Bandeirantes e TV Democracia, além da Radio France Internationale

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O "pas-de-deux" do capitão e Lula

"Para derrotar o fascista adorador da morte e tentar evitar o golpe, o caminho parece ser a formação de uma Frente Ampla, da direita à esquerda, unindo todos os antibolsonaristas. No Brasil essa estratégia não vinga. Nenhum presidenciável parece disposto a abrir mão da candidatura em prol da união por uma vitória incerta", escreve Milton Blay

(Foto: ABr)
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As estratégias eleitorais para a presidencial 2022 se precisam, partido e candidaturas potenciais se posicionam. Por enquanto, a mais clara é a do ocupante do Palácio, que está em campanha desde o primeiro dia de seu mandato, usa e abusa da máquina do Estado e ultimamente vem desafiando a pandemia ao acelerar à frente de seus fanáticos seguidores motoqueiros. Como é sabido de longa data, ele não admite perder, o que só lhe deixa uma opção: vencer custe o que custar. Ou, em bom português, vencer pelo voto ou tentar o golpe. Que não haja dúvidas quanto à determinação do capitão, que a um ano e meio da eleição avança suas peças no tabuleiro e busca encurralar o adversário com vistas ao xeque-mate , usando e abusando de golpes baixos. Se ele vai ter força e cacife para conseguir são outros quinhentos. Mas que vai tentar, isso vai.

Com 25 a 30% de apoiadores cegos e surdos Jair Messias é um candidato fortíssimo à sua própria sucessão. Tem todas as chances, senão a quase certeza, de estar no segundo turno e então novamente jogar a carta do antipetismo que, a despeito da massa de decepcionados, sobrevive. Apesar das provas de descaso no combate à pandemia colhidas na CPI da Covid  e de sua responsabilidade direta na morte de cem mil brasileiros, o impeachment não avançou, nem avançará enquanto Augusto Aras for o Procurador Geral da República. O relatório da CPI do Senado, com um eventual pedido de indiciamento do presidente, dependerá de seu crivo para seguir adiante. O que ele não dará. Nunca. Aras é tão responsável pela permanência de seu chefe no poder quanto Moro o foi no resultado eleitoral de 2018, ao  tirar Lula do páreo. Descartado de uma eventual indicação para o STF na vaga do ministro Marco Aurélio , que se aposenta em 5 de julho, o PGR busca desesperadamente assegurar um novo mandato no cargo, a ponto de jogar no lixo, de forma descarada, a Constituição, que deveria ser seu livro de cabeceira.  Em defesa dos “amigos do rei”, ultimamente pediu o arquivamento do inquérito sobre os atos antidemocráticos,  a rejeição da ação de advogados contra a lei de Segurança Nacional, que serve aos interesses autocráticos do governo, e agora quer que os juízes do Supremo sejam obrigados a consultar o Ministério Público antes de atuar em investigações, medida cujo primeiro beneficiado seria o ministro do Meio Ambiente, pego em flagrante de cumplicidade de contrabando de madeira extraída ilegalmente. Sua lealdade ao criminoso é admirável. Aras tem se mostrado um escudo intransponível.

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Quem aposta na fragilização do “Messias que não faz milagres” daqui até a eleição se engana. Ele poderá contar com a vacinação, que tanto combateu, e com o crescimento da economia, puxada pelo resto do mundo. A situação portanto deverá ser um pouco melhor e muitos esquecerão todo ou parte do incomensurável mal que ele fez ao país. Os brasileiros não praticam o exercício da memória, como demonstraram ao eleger um sujeito que defende a ditadura e tem por ídolo um torturador.

Se mesmo assim não for reeleito, hipótese mais provável, ele imitará seu amigo Trump, a quem jurou amor eterno num rompante linguístico em que gastou seu inglês limitado a três palavras : I love you.

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Só que Jair não é Donald e Washington não é Brasília. Trump tentou o golpe alegando fraude maciça e reclamando a anulação do voto; contou para tanto com os supremacistas brancos  e outras organizações neonazistas, mas não teve o apoio das forças armadas nem das polícias. O brasileiro fará a mesmíssima coisa : alegará fraude maciça e reclamará a anulação da eleição. Preparando o caminho, já defendeu o fim da urna eletrônica, de longe o sistema mais seguro e transparente, e sua substituição pelo voto em papel, facilmente manipulável.

A diferença fundamental no entanto está no fato de que o capitão conta com o apoio de ao menos parte das Forças Armadas (que se negaram a punir o general Pazuello por violação das regras militares), das polícias militares de inúmeros estados, das polícias civis e das milícias, que agem a céu aberto tanto no combate ao crime organizado como no apoio político à família presidencial. Esses grupos paramilitares matam indiscriminadamente traficantes, líderes comunitários, políticos de esquerda como Marielle Franco e até crianças. As chamadas forças de segurança, que foram presenteadas com armas ao bel prazer e impunidade, fecham com o capitão.

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Quanto às Forças Armadas, recentes episódios deixaram claro que entre a obediência à Constituição, caucionada pelo ex-ministro da Defesa e pelos então comandantes das três armas, e a submissão ao presidente, os quartéis hesitam.

As cenas que virão a ser filmadas no Brasil pós-eleitoral serão infinitamente mais chocantes que aquelas do Capitólio, em janeiro de 2021. O golpe poderá desembocar num confronto mais amplo e sangrento. A previsão é de que 2022 será um ano violento.

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A cultura autoritária, que estava dispersa após a ditadura, convergiu em direção de Bolsonaro, se organizou em torno do bolsonarismo. É forte e não desaparecerá tão cedo, mesmo que não haja reeleição.

Para derrotar o fascista adorador da morte e tentar evitar o golpe, o caminho parece ser a formação de uma Frente Ampla, da direita à esquerda, unindo todos os antibolsonaristas.

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Essa estratégia está sendo aplicada com sucesso em Israel, onde se constituiu uma coalisão heteróclita para varrer Bibi Netanyahu, agregando  partidos de extrema-direita, centro, esquerda e até um Partido árabe muçulmano israelense.

Também na Hungria, uma frente ampla se formou para vencer o direitista radical Viktor Orban, com relativo sucesso. Nas municipais do ano passado, a mais estranha coligação de partidos jamais vista elegeu prefeitos de uma dezena de cidades importantes, inclusive a capital, Budapeste.

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No entanto, a situação nesses dois países governados por hipernacionalistas de direita amigos do capitão (ambos estiveram em sua posse) é muito diferente da brasileira.

Em Israel, o líder centrista Yaïr Lapid, que costurou a união da oposição como uma colcha de retalhos, abriu mão do cargo de primeiro-ministro nos dois primeiros anos do mandato em favor de Naftali Bennett, sionista religioso do partido nacionalista Nova Direita, apesar das diferenças ideológicas entre ambos e do fato de Lapid ter maior número de deputados na Knesset.

Quanto à Hungria, a nova coalisão tem conseguido apresentar candidaturas únicas em todos os níveis . Já está definido que em 2022 haverá um só candidato oposicionista para enfrentar Orban. Hoje, as pesquisas apontam empate.

No Brasil essa estratégia não vinga. Nenhum presidenciável parece disposto a abrir mão da candidatura em prol da união por uma vitória incerta. Pelo menos não no primeiro turno. A recente reaproximação entre Lula e FHC são provas cabais da dificuldade que nos espera. O tucano admitiu publicamente votar no petista no segundo turno e mostrou-se arrependido de não tê-lo feito com Haddad. Mesmo assim, o PSDB apresentará um candidato à presidência, que poderá ser Tasso Jereissati, Doria ou outro que, como os dois primeiros, não terá chance de se eleger.

No primeiro turno haverá, quando muito, a constituição de federações de partidos de uma mesma família política e não a formação de uma ampla frente antibolsonarista com candidaturas únicas.  As negociações de hoje só serão concretizadas entre os dois turnos, mesmo que a missão seja salvar a democracia.  

No campo progressista, o PSOL se radicaliza, puxa ainda mais para a esquerda em busca do impeachment, sonhando com uma mudança na correlação de forças. Esta estratégia levou à saída de Marcelo Freixo do partido. Ao anunciar sua candidatura ao governo do Rio de Janeiro, ele busca formar ao menos uma aliança dos partidos de esquerda. Missão mais que difícil.

Ao contrário, o PT quer manter essa correlação, que colocaria face a face Bolsonaro e Lula, com vantagem para o ex-presidente, conforme as pesquisas. Lula conta com seu poder negociador e lança pontes para a direita. Paradoxalmente, esse também é o cenário preferido do capitão, que acredita ainda ser possível capitalizar em cima do antipetismo entre os dois turnos. O « pas-de-deux » é a coreografia mais provável desse balé eleitoral.

Enfim, Ciro Gomes parece ter se dado conta que não tem nem terá espaço à esquerda. Por isso ataca Lula e o PT, espera ganhar a direita não bolsonarista e entrar na disputa como um candidato híbrido, metamorfoseado em Terceira via. É uma aposta improvável, mas o cearense não tem opção. A direita, também por falta de melhor, ver-se-ia disposta a abrir-lhe os braços. Terceira via é uma falácia.

De qualquer maneira, não veremos no ano que vem Lula e Ciro dividindo palanques, lembrando porém que em política a palavra nunca foi excluída do dicionário.

Assim, tudo leva a crer que a Frente Ampla, se houver, só sairá do papel após o primeiro  turno, com negociações e negociatas de último minuto. Tempo sempre haverá tempo para uns e outros bandearem para Paris.

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