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Paulo Moreira Leite

Colunista e comentarista na TV 247

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O projeto geleia

"Expressando-se na criminalização de Lula e Dilma, o esforço implacável para a destruição do Partido dos Trabalhadores destina-se a eliminar a principal referência - no país de hoje, nas condições de hoje, para os interesses das parcelas exploradas da população", escreve Paulo Moreira Leite, ao criticar a comparação do pré-candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo Andrea Matarazzo com o candidato democrata nos EUA, Bernie Sanders; para o jornalista, no Brasil de hoje "assistimos a construção de um universo paralelo onde a política se transforma em farsa, as ideias não fazem sentido, a memória histórica é esmagada e a forma sobrevive sem conteúdo"

"Expressando-se na criminalização de Lula e Dilma, o esforço implacável para a destruição do Partido dos Trabalhadores destina-se a eliminar a principal referência - no país de hoje, nas condições de hoje, para os interesses das parcelas exploradas da população", escreve Paulo Moreira Leite, ao criticar a comparação do pré-candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo Andrea Matarazzo com o candidato democrata nos EUA, Bernie Sanders; para o jornalista, no Brasil de hoje "assistimos a construção de um universo paralelo onde a política se transforma em farsa, as ideias não fazem sentido, a memória histórica é esmagada e a forma sobrevive sem conteúdo" (Foto: Paulo Moreira Leite)
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Ninguém precisa ficar surpreso com a tentativa de Andrea Matarazzo apresentar-se como o Bernie Sanders nas prévias do PSDB para escolha de candidato a prefeito de São Paulo em 2018. É risível mas real. Imagine.

O candidato do núcleo histórico do PSDB, aquele das privatizações, da taxa de juros de 40%, do combate à CPMF, do combate à política de salário mínimo e demais políticas de distribuição de renda, procura vestir a fantasia do concorrente que, nas primárias norte-americanas, defende a ampliação do Estado, o reforço da saúde pública, a proteção dos trabalhadores e o controle do capital financeiro.

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Em Brasília, o PSDB pressiona para mudar as regras do pré-sal, aproveitando a queda nos preços do petróleo para arrancar benefícios que podem permitir às grandes multinacionais recuperar, na bacia das almas, um espaço perdido no regime de partilha. Em São Paulo, nas eleições que estarão no centro do debate político de 2018, o principal candidato tucano apresenta-se como versão local de um senador que, nos EUA, está à esquerda do Partido Democrata e define-se como socialista.

Pode? Claro que pode. Nem chega a ser uma surpresa, na verdade. No Brasil de 2016, onde se tenta quebrar a democracia e derrubar, sem provas, uma presidente eleita por mais de 54 milhões de votos, assistimos a construção de um universo paralelo onde a política se transforma em farsa, as ideias não fazem sentido, a memória histórica é esmagada e a forma sobrevive sem conteúdo.

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A criminalização da política evita o debate, o confronto de projetos. Ao tentar transformar a democracia numa ruína, seu caminho é  transformar a política brasileira numa grande geleia de rostos indistintos, onde os interesses ficam confusos, os conflitos são mascarados, as diferenças de valores e perspectivas se apagam. Nada faz sentido real. Fonte inspiradora da Lava Jato, a Operação Mãos Limpas, na Itália, consagrou o notório Silvio Berlusconi como o mais duradouro primeiro-ministro da Itália depois do fascismo.

Isso acontece quando a soberania popular é questionada e as maiorias perdem o direito de ter a palavra final sobre o destino de seu país.

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Não é um processo brasileiro, apenas, mas uma opção conservadora que se observa em diversos países, onde a Europa ocupa uma posição de vanguarda da gelatina. Berço do estado de bem-estar social, o Velho Continenente é um abrigo de democracias formais e debates disfuncionais. Incapaz de responder a vontade da maioria da população, que não aceita a redução nos programas de bem-estar e não concorda em conviver com índices alarmantes de desemprego, a região que abriga o  maior PIB e maior mercado interno do planeta, é hoje um espetáculo de governo falidos antes mesmo de tomar posse -- quando isso é possível.

Não custa lembrar. O atual impasse espanhol é apenas a versão, maior, do impasse português. Na França de François Hollande, os socialistas se mobilizam para aprovar uma política de combate ao terrorismo que não passa de um plágio da plataforma fascista do Front National. Um ano depois de prometer assumir  responsabilidades essenciais perante a tragédia dos refugiados, vítimas da combinação perversa de intervenções estrangeiras que inviabilizam Estados Nacionais e prejudicam qualquer esforço de criação de economias autônomas, o governo de Angela Merkel voltou atrás e anuncia restrições a chegada de imigrantes. Sem forças para levar adiante um programa de mudanças na política econômica, o Sciryza adapta-se às políticas de recessão e austeridade da União Europeia.  Isso não ocorre por acaso. É o resultado inevitável de um sistema que confiscou, do cidadão comum, o direito de interferir, pelo voto, na definição de uma política de acordo com sua vontade e seus interesses.

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Avaliando a crise aberta em 2008, que demonstra uma persistência que desafia os estudiosos mais lúcidos, o Prêmio Nobel Joseph Stiglitz explica, num artigo publicado no Globo (15/2/2016), a tradução financeira da geleia mundial. Stiglitz lembra que, por um lado, foram aprovadas medidas que deveriam servir de estímulo ao crescimento, como a redução os juros para 0% e até negativos. Mas, de outro, foram criadas medidas de subsídio ao capital financeiro, que recebe uma remuneração maior para manter reservas no Banco Central em vez de emprestar para investimentos produtivos. O resultado é aquilo que se poderia imaginar. Em vez alavancar o consumo e a criação de empregos, as medidas de estímulo acabaram engordando os ganhos financeiros e promovendo nova concentração de renda. Por isso, medidas que deveriam estimular o crescimento trouxeram menos benefícios do que se esperava e, em alguns casos, nenhum benefício.

No Brasil de Sanders/Matarazzo, a geleia é um projeto a meio caminho. O esforço implacável para a destruição do Partido dos Trabalhadores destina-se a eliminar a principal referência -- no país de hoje, nas condições de hoje -- para os interesses populares e das parcelas mais exploradas da população. Para além de erros de  natureza variada que podem ser apontados ao longo da história -- e não são poucos -- é bom não deixar-se iludir pela propaganda. Cabe reconhecer que, em 50 anos, nenhum partido produziu uma soma equivalente de medidas que contribuíram para diminuir a desigualdade e reduzir a miséria. Para quem fala em ética, cujo valor primeiro reside no esforço para diminuir a desigualdade estrutural entre cidadãos, não pode haver realizações maiores do que a retirada do Brasil do mapa da fome da ONU e a saída de 30 milhões de pessoas da miséria. Está provado que nenhum programa social fez mais pela emancipação feminina do que o Bolsa Família.

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Mas a geleia nasce da política. Ela ensina que só o passado se embeleza com medalhas no peito e estátuas de bronze. Na vida real, é um combate constante para aproveitar oportunidades e oferecer saídas para as dificuldades concretas de cada mês, cada semana, cada dia.

O ponto é este. O futuro da democracia brasileira será resolvido pela capacidade de defender as conquistas já realizadas e conduzir a retomada do crescimento, invertendo uma situação de desemprego e empobrecimento que entra no segundo ano. Essa é a tarefa que interessa ao país e, não por acaso, é o grande alvo econômico e político da geleia.

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