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Valter Pomar

Historiador e integrante da Direção Nacional do PT

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O que é isso, camaradas? (sobre as espantosas entrevistas de Edinho e Aldo)

Se não tivermos êxito em recuperar a presidência, precisaremos continuar articulando a luta contra o governo golpista, com a luta contra o programa reacionário do golpismo. Neste contexto, a defesa de um plebiscito e da antecipação das eleições provavelmente será uma das opções. Não para reduzir o mandato de um governo legítimo e legal, não para dar verniz a um pacto, mas sim para reduzir o mandato de um governo ilegítimo e ilegal

Brasília- DF 16-06-2016 Presidente interino, Michel Temer e o ministro da educação, Mendonça filho anunciando prorrogação do FIES. Foto Lula Marques/Agência PT (Foto: Valter Pomar)
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Fiquei espantado com a entrevista concedida pelo ministro Edinho Silva ao jornal Folha de S. Paulo.

Havia decidido comentar a respeito.

Mas meu comentário tornou-se em grande medida desnecessário, frente ao editorial do mesmo jornal, publicado nesta terça-feira 21 de junho e intitulado "À esperada autocrítica".

Este editorial deixa claro pelo menos duas coisas:

1.Certos meios da direita apreciam "autocríticas" como a do ministro Edinho, lamurientas e desprovidas de qualquer análise séria acerca das razões de fundo (programa, estratégia, política de alianças) dos problemas políticos vividos hoje pelo PT. A promiscuidade com o financiamento empresarial é no fundamental uma consequência daquelas razões de fundo; 

2.Não importa o número de chibatadas, mea culpa e ginuflexões: o PT e quem continuar no PT não será perdoado. Como diz o editorial: "a Lava Jato continuará até o fim, sem prazo para acabar". Cada um pode imaginar de que "fim" fala a Folha.

Também fiquei espantado com a entrevista de Aldo Rebelo ao jornal Valor.

Começo pela argumento de Aldo em defesa do plebiscito: "a proposta do plebiscito tem o objetivo de resgatar os dois elementos decisivos para a governabilidade, que são a legalidade e legitimidade. A legalidade do atual governo está viciada pela ausência de um crime de responsabilidade que justifique o afastamento da presidente. E a legitimidade está afastada no momento em que o governo não obteve nas urnas a autoridade para governar. Diante disso a autoridade original que é o voto do eleitor constitui a única solução não só possível como duradoura".

O argumento poderia ser 100% correto, caso o Senado já tivesse votado e aprovado o impeachment. 

Mas no momento atual, a proposta de novas eleições tem uma ambiguidade que Aldo simplesmente omite, a saber: apoiar novas eleições implica em questionar a legalidade e a legitimidade do mandato Dilma.

Aldo chega a dizer que o "retorno dela estaria protegido pelo compromisso da convocação de um plebiscito sobre a convocação de novas eleições".

Ou seja: Dilma voltaria, mas voltaria na condição de governo provisório.

Portanto, sem o tempo e a autoridade necessárias para tomar medidas que recuperem o apoio das camadas populares.

Logo, Dilma voltaria, mas voltaria em condições tais que o mais provável seria uma derrota, no plebiscito e/ou nas eleições antecipadas.

Com a diferença que esta derrota não seria mais golpismo, mas sim legitimada pela participação do povo. 

Não admira que alguns considerem que esta proposta pode converter-se num plano B para setores da direita, especialmente aqueles que estão mais preocupados em manter Meirelles na Fazenda do que em manter Temer na presidência.

Aldo sabe das dificuldades constitucionais, tanto para convocar um plebiscito, quanto para convocar eleições antecipadas. Mas ele resolve isto apelando para a "criatividade da política". 

O mais impressionante, vindo de alguém que apoiou Lula desde 1989 e Dilma nas duas últimas eleições presidenciais, é a seguinte afirmação: "A ideia do plebiscito ou de outra alternativa vai nascer menos da articulação política que do mal estar que toma conta do país em função do antagonismo das forças representadas por Dilma e Temer".

Noutras palavras, a saída estaria... numa terceira via!!!

Marinismo puro, como diria o ex-ministro Ciro Gomes.

Aldo considera que esta proposta terá um apoio "derivado da busca de uma solução que pacifique o país e que torne um lenitivo para o drama e para os conflitos que enfrentamos atualmente, de natureza ideológica e política, de legalidade e legitimidade".

Para quem tem dúvida acerca do conteúdo social deste tipo de solução pacificadora, recomendo pensar nos exemplos históricos dados por Aldo (veja entrevista na íntegra ao final).

Especialmente chocante é seu comentário sobre a crise de 1961.

O Valor pergunta: "Mas nem sempre a saída encontrada trouxe estabilidade, como no parlamentarismo de 1961 que não evitou o golpe de 1964"...

Aldo responde: "Em 1961 a renúncia de Jânio deu lugar a um governo que era legal, o do Jango, mas para o qual havia um déficit de legitimidade porque ele não havia sido eleito. (...) Como é que se corrigiu esse déficit de legitimidade? Com o parlamentarismo, uma tentativa de se dar a legitimidade necessária a um presidente cuja chapa havia sido derrotada. Quando o golpe aconteceu o acordo do parlamentarismo já havia sido revogado e a revogação trouxe de volta o conflito".

É inacreditável.

Jango tinha déficit de legitimidade? Foi por esta razão que os militares e a direita tentaram impedir sua posse??

O parlamentarismo visava corrigir este déficit de legitimidade? Portanto, estavam errados aqueles -- como Brizola e os populares organizados em defesa da legalidade-- que defendiam que Jango não aceitasse a proposta conciliatória?

O golpe está vinculado a revogação do parlamentarismo? E a relação com os interesses da classe dominante, com as movimentações do imperialismo, com articulações que vem pelo menos desde 1954???

Aliás, vejam que curioso: Aldo considera que o parlamentarismo de 1961 visava corrigir um déficit de legitimidade. Ao mesmo tempo, diz que o plebiscito de 1963 -- que revogou o parlamentarismo-- trouxe de volta o conflito.

Ou seja: quando a iniciativa coube ao parlamento (onde a classe dominante tinha maioria ou pelo menos maior influência), tivemos uma solução que ele considera positiva. Mas quando a decisão coube ao povo, aí segundo Aldo tivemos conflito.

A lógica histórica é precária, mas é óbvio que Aldo não está discutindo propriamente a história, mas sim opinando sobre o presente: ele quer e defende uma solução para a crise que implique em um pacto com a maioria do atual Congresso nacional.

Nas suas palavras. "Um novo governo daria ao eixo do Executivo uma âncora importante para a estabilidade. Os fatores que reduzem o coeficiente de legalidade e legitimidade do Executivo têm uma causa muito clara que é o afastamento da presidente e a ascensão do vice. É preciso encontrar na Câmara e no Senado os personagens que conduzirão este debate".

No fundo, trata-se de uma radicalização da chamada governabilidade institucional. 

No limite, aceita-se entregar o governo a quem tem maioria no parlamento.

(Aceita esta premissa, é fácil compreender o sentido real dos comentários de Aldo sobre a Lava Jato). 

Notem que nesta linha de raciocínio, a proposta de convocar um plebiscito tem uma só função: passar a impressão de que a decisão está sendo transferida para a soberania popular. Quando na verdade se pretende que o povo venha apenas dar legitimidade a um pacto prévio.

Prova disto é o seguinte comentário: "O impasse econômico dificilmente encontrará uma solução satisfatória enquanto o governo carecer de plena legalidade e de inconteste legitimidade, além da força e da autoridade conferida pela população. O impasse da nossa economia talvez seja mais profundo que as disfunções de nosso sistema político-eleitoral. Esse debate hoje torna-se mais difícil porque os atores que têm a possibilidade de nele intervir estão com dificuldade para agir. Há um problema importante a ser enfrentado na Previdência? Sim, claro, mas esta resposta só um governo com a força das urnas pode dar".

Ou seja: um governo forte para... fazer a reforma da previdência.

Aldo não apenas aceita que os reacionários majoritários no parlamento governem, ele está disposto a aceitar também o programa reacionário.

Frente a uma pergunta imbecil do Valor ("O senhor acha que a esquerda custa a aceitar teses já pacificadas no resto do mundo em relação à Previdência?"), Aldo não se dá ao trabalho nem mesmo de citar a luta atual dos comunistas e da esquerda francesa., para demonstrar que não há nada de "pacífico" na questão previdenciária, em nenhum lugar do mundo.

Pelo contrário, ele capitula integralmente aos pontos de vista da direita: "Já passou da hora de a esquerda aceitar a discussão da idade mínima e da convergência de regras para homens e mulheres na Previdência. A agenda da esquerda não pode se limitar ao multiculturalismo". 

Multiculturalismo!!!???

Ouviram, camaradas?

Se alguém ainda não entendeu qual o lugar do povo neste plano, Aldo deixa escapar que "todo esse debate só pode ser enfrentado de forma eficiente por um governo que receba o verniz do voto". 

Verniz!!!!

Aldo Rebelo é um quadro importante do PCdoB. Mas o PCdoB, como o PT, tem correntes internas. A diferença é que no PCdoB elas não são organizadas. 

Mas é visível que há vários anos Aldo se converteu na cabeça mais visível de um setor do PCdoB que repete a maneira de pensar de um setor do velho PCB.

Vide seus elogios a José Bonifácio e Roberto Simonsen, bem como sua defesa de uma solução que englobe o povo, a classe média e a elite

Assim, tudo junto e misturado.

Este jeito de pensar, típico do velho partidão, tem vários defeitos.

Um deles é colocar como objetivo central, não recuperar o apoio do povo, mas sim recuperar o apoio do "centro".

Acontece que neste momento o centro foi tão à direita, que o preço de um hipotético acordo com o centro seria apoiar medidas programáticas que nos distanciariam ainda mais do povo.

Isto na melhor das hipóteses.

Na pior das hipóteses, não haveria nem mesmo pacto. Apenas desmoralização e uma derrota ainda mais profunda. 

Não há caminho positivo, no curto prazo, que não passe por articular a luta contra o golpismo no Senado, com a luta contra as medidas do governo golpista. 

Se tivermos êxito em recuperar a presidência, precisaremos aplicar um programa distinto daquele que prevaleceu no início deste mandato de Dilma. Agindo assim, poderemos tentar criar as condições não apenas para obter bons resultados em 2016 e uma vitória em 2018, mas também para a realização de uma Constituinte.

Se não tivermos êxito em recuperar a presidência, precisaremos continuar articulando a luta contra o governo golpista, com a luta contra o programa reacionário do golpismo. Neste contexto, a defesa de um plebiscito e da antecipação das eleições provavelmente será uma das opções. 

Não para reduzir o mandato de um governo legítimo e legal, não para dar verniz a um pacto, mas sim para reduzir o mandato de um governo ilegítimo e ilegal.

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