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Cláudia Vieira Gonzalez

Advogada, mestra em Direito Público pela UFAL, assinante da TV247 e membro do canal 247

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O tempo e o moinho daqui de baixo

Então eu me dei conta de que a vida da maioria das pessoas daqui de baixo se resume a algumas pequenas, árduas tarefas: trabalhar, consumir e construir família e, assim, manter o ciclo

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Então eu me dei conta de que a vida da maioria das pessoas daqui de baixo se resume a algumas pequenas, árduas tarefas: trabalhar, consumir e construir família e, assim, manter o ciclo. Essa é a vida da humanidade daqui de baixo, representada pelas classes financeiras mais precárias na nossa sociedade capitalista.

A pandemia de COVID-19 deu à humanidade o tempo. Sim, porque a humanidade daqui de baixo vive para trabalhar e consumir, construir família e manter o cronômetro do moinho. Mas o que fazer com esse tempo que nos é dado? Se aqui embaixo estamos, na maioria, acostumados àquele ciclo de trabalhar, consumir, construir família e manter a roda do moinho girando, o que fazer com essa dádiva de tempo? Do tempo que é o recurso que nos permite cair em contemplação e criar? Então eu me dou conta de que esse ciclo é um moinho de moer vidas humanas – aquelas que consomem as demais espécies do planeta para manter o ciclo – e não-humanas. Um sistema quase perfeito, já que é limitado porque se esgota de recursos humanos e não-humanos. Também me dou conta de que a humanidade daqui de baixo, na sua maioria, não conhece o tempo. Na verdade, não o reconhece. Não reconhece esse companheiro de longa data, esse companheiro de vida e de morte, o tempo. Nossa humanidade daqui de baixo passa os dias afirmando que não tem tempo para nada, exceto para trabalhar para poder consumir, e manter e construir família. Assim, quando um ser microscópico faz o cronômetro do moinho parar de contar, a humanidade lá de cima se empenha para manter girando o moinho de vidas humanas e não-humanas, reverberando o discurso da necessidade de que a humanidade daqui de baixo mantenha a engrenagem em movimento, a fim de sobreviver. Ora, a fim de quem sobreviver? E a humanidade daqui de baixo escuta as vozes lá de cima com atenção e, voluntariamente, mantém-se em sua servidão, porque essa é a contagem de tempo que conhece, a do cronômetro do moinho de vidas.

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De fato, o que fazer com a dádiva do tempo é uma questão para poucos, porque apenas poucos de nós, que pertencemos à humanidade daqui de baixo, entendemos ou reconhecemos tal dádiva. Para a maioria de nós daqui de baixo, o tempo é o do relógio, das horas contadas, das horas em trânsito ou no trabalho, das horas parcas de sono profundo, do sexo às pressas, da comida corrida e não-natural. Para a maioria de nós, o tempo é o passar dos dias até que chegue o fim de semana; das semanas, para que passem os meses e, assim, conclua-se mais um semestre ou um ano de estudos, de contratos de trabalho, para que, finalmente, venham as férias e as festas religiosas ou mundanas, durante as quais a humanidade daqui de baixo se regala em pequenos prazeres e se larga permitindo-se consumir com mais voracidade. Ah! É também o momento do cronômetro em que um tal espírito natalino ajudará os mais esmagados do moinho de vidas a consumirem algo ou um pouquinho mais. E nessa época em que o cronômetro do moinho doa “um tempinho” à humanidade daqui de baixo, esta talvez se torne mais sensível aos comandos de crescer e multiplicar. E, nessa sina, as mulheres dessa humanidade se maravilham com a possibilidade de reproduzir e, assim, produzir mais trabalhadores e consumidores para o moinho de moer vidas.

E, então, dou-me conta de que permanecem algumas perguntas. A mais pungente é “Que fazer com a dádiva do Tempo”. A partir desta, remanescem “Perdemos a capacidade de contemplação?”, “A arte nos salvará?”, e “Em que falhou a humanidade (daqui de baixo e de lá de cima)?”. Sim, esta última é cabível porque se pergunto em que falhou Deus, não seremos capazes de, como criaturas, julgar quem nos criou. É melhor permanecermos no questionamento sobre o erro humano mesmo. Mais ainda, “Que é a dádiva do tempo, para os que vivem no moinho de vidas e o alimentam, senão uma maldição?”, “Saberíamos girar o moinho ao contrário?”, “E de que nos valeria?”, “Poderíamos pará-lo?” e “A quem afetaria?”.

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Como parte da humanidade daqui de baixo, entendo que a natureza é viva na dádiva do tempo; e que a humanidade à qual pertenço “vive” no ritmo ensurdecedor do cronômetro do moinho de vidas.

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