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Gustavo Conde

Gustavo Conde é linguista.

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Parabéns, presidente Lula!

O colunista Gustavo Conde disseca a representação de Lula para o povo trabalhador brasileiro no momento em que a América Latina passa por uma gigantesca transformação social. Ele diz: "Lula é a síntese do Brasil, mas não do Brasil fraudulento das elites seculares. Lula é a síntese da resposta que o povo brasileiro produziu diante dessas elites, num misto de paciência, generosidade, inteligência, sacrifício, resiliência e apetite por soberania"

A interdição de Lula e a última ilusão (Foto: Stuckert)
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De todas as qualidades de Lula, o seu apreço pela democracia é o mais impressionante. Quando decidiu combater a ditadura militar e as injustiças seculares que emperravam o desenvolvimento social de um país inteiro, Lula não organizou uma guerrilha, nem um exército paramilitar. Ele fundou um partido político. 

É por isso que sua figura não fica muito confortável no panteão dos chamados maiores revolucionários de esquerda da história: Fidel, Mao, Lenin, Che, todos tinham uma visão romântica do poder. Era pegar em armas, rechaçar o inimigo e promover a manutenção do novo sistema à força. 

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Muita gente ainda acha hoje que esse é o caminho e, confesso que o Brasil, com sua imensa paciência de Jó, às vezes me faz pensar se não seria o caso.

A síndrome do totalitarismo, infelizmente, habita também os corações repletos de boas intenções – e a batalha semântica que daí decorre permanece atiçando os neurônios de muita gente que se diz progressista, incluindo os deste missivista. 

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Mas o assunto é Lula e Lula é muito mais assunto do que tudo isso. A revolução que Lula promoveu nada tem a ver com as revoluções consagradas da esquerda romântica. Lula é muito maior do que todas elas juntas. 

Sem dar um tiro, sem usar a força, sem sequer usar a retórica da intimidação, Lula promoveu uma revolução muito mais profunda que as insurreições rudimentares subscritas no rol das soluções rápidas de turno. 

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Lula fez uso do instrumento mais democrático da história do mundo do trabalho: a greve – este dispositivo tão demonizado por nossa elite e por nosso jornalismo de cativeiro. 

A partir das greves, Lula construiu um partido político, o único partido real de massas do país e um dos mais importantes do mundo. Goste-se ou não do PT, trata-se de um patrimônio brasileiro, tão imponente quanto a nossa música popular ou como as 160 línguas indígenas aqui faladas. 

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Não bastasse, Lula mergulhou sua trajetória na odisseia do voto popular. Foi candidato a governador. Perdeu. Foi candidato a deputado constituinte. Ganhou. Foi três vezes candidato a presidência da República, perdeu. Insistiu e ganhou duas. No conjunto da obra, obteve mais de 280 milhões de votos dos brasileiros, somando-se eleições e turnos. 

Não há notícia de líder político com mais votos, a se julgar a proporção da população brasileira. 

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Isso sem contar a imensa quantidade de prefeitos, deputados e governadores que se elegeram às custas de sua imagem ao longo de 30 anos da extinta democracia brasileira. 

Lula ainda foi além na compreensão de republicanismo democrático e recusou o terceiro mandato. Foi a antítese de FHC, que deu um golpe comprando o seu segundo mandato. Fica relativamente fácil de perceber por que FHC tem inveja mercurial de Lula e por que a nossa elite tende à histeria sôfrega quando o nome de Lula é pronunciado pelo povo. 

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No mundo, só Mandela e Gandhi poderiam reivindicar posição similar à estatura histórica de Lula. 

E se você estranhou, praguejou ou pigarreou lendo a sentença acima, é porque seu complexo de vira-lata, caro leitor, ainda não foi totalmente superado. Porque é exatamente o complexo de vira-lata que produz a sentença invertida, tão popular nas hostes progressistas de grife: ‘Lula é tão grande quando Mandela e Gandhi’. 

Na verdade, trata-se do contrário: ‘Mandela e Gandhi são tão grandes quanto Lula’. 

Autoestima é isso. É não continuar a achar que o estrangeiro é sempre melhor, não importa se no enquadre etnocêntrico ou não. 

Hoje, ademais, é dia de Lula. Hoje e sempre. Este homem merece ter sua verdadeira dimensão reconhecida pelo mundo, até porque ele permanece generoso e humilde, com seus hábitos simples e sua lealdade à democracia. 

Lula é o produto mais extraordinário da somatória de toda a complexidade humana que estrutura essa ideia chamada Brasil. Nem a literatura foi capaz de produzir uma personagem tão complexa e tão representativa de nossa multiplicidade cultural, étnica e política. 

Lula é a síntese do Brasil, mas não do Brasil fraudulento das elites seculares. Lula é a síntese da resposta que o povo brasileiro produziu diante dessas elites, num misto de paciência, generosidade, inteligência, sacrifício, resiliência e apetite por soberania. 

Lula é a razão pela qual o Brasil ainda não explodiu em violência como tantos outros países portadores de elite genocida pelo mundo. 

Ele não foi Fidel, não foi Mao, não foi Lenin. É essa ambiguidade que faz a elite latejar em histeria permanente diante da monumentalidade de Lula: é graças a ele, Lula, que essa elite ainda não foi dizimada por uma revolta popular violenta. Paradoxalmente, Lula municia o país de diálogo e política, com todos os corolários que esse gesto pode desencadear, até o próprio sufocamento, como a prisão política tentou lhe impor até aqui. 

Mas Lula é fênix. Sua capacidade de se reinventar é tão grande que derrotas são transformadas em vitórias num piscar de olhos. Ele já deu essa aula e o hábito o coloca mais uma vez na condição de professor. 

Por outro lado, a América Latina entra em ebulição, também na esteira das injustiças cometidas contra Lula. 

Se Lula fosse argentino e estivesse na condição de preso político, a população daquele país já teria incendiado todas as ruas e praças. Se fosse chileno, já estaria nos braços do povo. Equatoriano, idem. Se fosse boliviano, já teria saído do cárcere político e conquistado, inclusive, o acesso ao mar. 

Aliás, que ninguém nos ouça, se Lula fosse argentino, já teria ganho o Nobel da Paz, porque soberania e autoestima coletiva aparentemente fazem parte do efeito de respeitabilidade internacional pressuposto na concessão daquele prêmio.  

Em tempo: o imaginário subserviente brasileiro costuma fazer piada do ego argentino buscando um efeito compensatório: diante do nosso complexo de vira-lata, a autoestima do vizinho assusta. 

Toda essa engrenagem das reações embutida na monumentalidade de Lula e no caráter macunaímico – e anímico – do brasileiro pacifista de si mesmo não significa apenas manifestar a frustração de não poder participar de uma insurreição inflamada pró Lula, mas significa, entre outras coisas, que Lula jamais seria apenas argentino, chileno ou equatoriano.

Lula é cidadão do mundo.

Mas, estruturalmente, Lula é um brasileiro de origem pobre. Sua luta é travada em uma outra dimensão, na dimensão das palavras, dos gestos, dos tempos, dos sentidos, da espiritualidade, da memória, da arte, do sonho, do amor e do exercício da inteligência. 

É por isso que América Latina e Lula se complementam. Os países latino-americanos precisam de Lula justamente por Lula ser diferente. Lula, por sua vez, precisa da América Latina, pois ela verbaliza a defesa clássica que se faz da soberania dos povos. 

Convém, nesse ínterim, não esquecer de uma coisa: Chile, Argentina, Uruguai e países irmãos não têm uma Rede Globo para massacrar sua soberania. Isso faz uma diferença considerável. A imprensa desses países pode ser mentirosa, violenta e subserviente aos EUA, mas nada se compara à Rede Globo que, a rigor, também é fruto de uma singularidade: é a representação perfeita da elite mais subdesenvolvida do planeta, potencializada pelas dimensões de um país continental.

Essa também é parte da explicação para o fato de Chile, Equador e Argentina se revoltarem contra o neoliberalismo desalmado: sem Globo, fica mais fácil. 

Mas o assunto é Lula. Lula e a América Latina. Brasil e América Latina. O que ocorre no Chile é, em grande medida, a resposta que os brasileiros não puderam-quiseram dar ao golpe de Estado contra a ex-presidenta Dilma Rousseff. 

O golpe no Brasil devastou o continente e a resposta chegou antes nos países vizinhos. O que vemos agora é o a América Latina sendo repovoada por governos soberanos de esquerda, à exceção miserável do Brasil que, por sua vez, caminha para o mesmo e irresistível destino. 

O povo latino-americano ama Lula. O povo latino-americano se inspira em Lula. O povo latino-americano sente a dor de Lula. O povo latino-americano precisa de Lula. 

Nós, brasileiros, precisamos dessa complementariedade. O momento é absolutamente alvissareiro para que, de uma vez por todas, o continente se una para produzir muita democracia e muita soberania. 

Sozinho, o Brasil é uma eterna jabuticaba. As singularidades deste país e o espírito democrático de Lula podem encontrar sua cara-metade política e aprofundar ainda mais os laços que foram construídos pelos governos soberanos do passado recente. 

Não é à toa que um dos primeiros sinais emitidos pelo novo presidente argentino seja o gesto Lula Livre, pois a Argentina precisa muito de Lula para enfrentar o desafio de lidar com herança maldita deixada por Maurício Macri. 

São essas e outras razões que me fazem, de maneira sentida, dar os parabéns a essa emanação da natureza chamada Luiz Inácio Lula da Silva. 

Lula, caros leitores, faz apenas 74 anos. Joe Biden tem 76, Roger Waters, 76, Gilberto Gil, 77, Bernie Sanders, 78 e Pepe Mujica 84. Ele é o caçula. Um caçula disciplinado que cuida da saúde como poucos. 

Dar os parabéns ao Lula é saber que ele estará presente, em vida e na política, pelos próximos 20 anos, com extrema disposição. Alguém aqui já viu um nordestino que passa dos 90 anos em ação? Tentem ver. Eles cultivam a terra, cuidam da família e apreciam tudo o que há de melhor nesta vida, da cachaça à poesia, da cantoria ao amor.  

Parabéns, Lula! Celebrar sua chegada a este mundo é celebrar o próprio mundo. 

Assista a última Live do Conde, sobre Lula e América Latina: 

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