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Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

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Passaporte para o nada

Jair Bolsonaro (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil | REUTERS/Ueslei Marcelino)
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A reunião de Jair Bolsonaro com os embaixadores estrangeiros – e a sucessão de acontecimentos que a sucederam – deixou uma sensação de que algo devastara o país e seu dirigente. Alguém havia sugerido o tal encontro, um de seus assessores, responsável, em seguida, pelo desastre em que se transformara com suas repercussões no plano nacional e internacional. As autoridades no Planalto escondiam mal a sensação de devastação que parecia ter contaminado gestos e expressões do nosso mandatário, com desabafos e receios (não de todo infundados) de que, perdendo as eleições, aguardava a ele e aos filhos prisão e cumprimento de pena. Sem carreira diplomática, sobrou-lhe um passaporte para o nada, o máximo que conseguiu com suas gestões, junto a representantes estrangeiros.

Não seria a primeira vez que um Chefe de Estado, na teia de aranha em que se revelam às vezes as peripécias de seu autoritarismo, perde a razão. Tais manifestações costumam se fazer acompanhar de gritos, paranoias de perseguição e ordens tresloucadas que o grupo em seu em torno custa a executar, tal a dimensão de seu descontrole. Roma conheceu Nero, o Haiti, na revolução que libertou os escravos e declarou sua independência, teve Henri Christophe, um Imperador que se auto coroou e governou com mão de ferro, construindo palácios à beira de penhascos. Suicidou-se com uma bala de prata. O grande escritor cubano Alejo Carpentier o retratou no romance O reino deste mundo.

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Bolsonaro ainda não chegou tão longe. Devaneou, sem dúvida, com situações de grandeza semelhantes. No entanto, não acumulou prestígio, força militar ou poderio econômico para um legado de tais proporções. É apenas um presidente de pequenos recursos mentais no qual, além de (mau) temperamento, sobra-lhe pouco para sair do cercadinho de admiradores e seduzir adeptos na política oficial ou fora dela. Já havíamos assistido a cenas junto a jornalistas quando as perguntas lhe excediam as expectativas. Impaciente e facilmente resvalando para a estupidez, destratava os agentes da imprensa pouco se lixando para as repercussões na mídia. A repetição de tais vociferações contribuíu para a expressão que lhe marcou as rugas do rosto, cada vez mais tenso e infeliz. Ele gosta de armas e munições. Não se crê, porém, que, como o haitiano Christophe, guarde uma bala de prata para apontá-la contra a testa na hora dos acertos finais. De qualquer forma, não parece envergar o luto da tragédia, como Getúlio Vargas, manchando mais uma vez nossa história de sangue. O sucessor que desponta nas pesquisas não é um vingador. Em suas noites de insônia, não pensa nele. Pensa, por certo, na quantidade de processos que deverá enfrentar pelo que andou fazendo, protegido por cem anos de relatórios secretos, talvez, oportunamente, abertos.

Assistir ao desenrolar dos acontecimentos como testemunhas costuma se mostrar perigoso. Por causa de uma ordem mal dada, quem assegura que não teremos tanques nas portas de casa? Bons comentaristas afirmam que não, que nossos militares têm bom senso. Esperemos que sim. Temos um nome a zelar. Que venham as eleições e que as balas fiquem onde estão: nos depósitos dos desatinos, à espera de que não a achem em seu esconderijo e nos poupem do seu potencial de tragédia.

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