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Giselle Mathias

Advogada em Brasília, integra a ABJD/DF e a RENAP – Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares e #partidA/DF

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Perpetuadoras da espécie

O patriarcado é apenas uma construção cultural, humana, intelectual que nos dividiu entre superiores e inferiores, sem considerar a completude de todo ser humano, e pode, deve ser modificado

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Atualmente passamos por tantas questões complexas como a ascensão do fascismo, do neoliberalismo, pobreza extrema, falta de oportunidades e tantas outras que é difícil, ao menos para mim, decidir sobre o que escrever.

Então, decidi falar sobre o patriarcado, visto que esse é um dos pilares do capitalismo, como foi do Império Romano, do feudalismo, da Revolução Industrial, e de outros tantos tempos e civilizações, cada um a seu modo com radicalismo, agressividade, imposição e dominação.

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O patriarcado estruturante, termo muito conhecido e repetido atualmente, tem sido debatido em várias esferas, assim como a todo instante aparecem expressões ou comportamentos que são classificados como característicos do machismo, que é uma consequência do patriarcado.

Mas essas expressões e comportamentos que são divulgados e típicos do machismo, não reduzem o que é o patriarcado e as suas consequências na vida cotidiana das mulheres, e, também dos próprios homens.

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O patriarcado se perpetua através de todas as nossas estruturas sociais, e enquanto não questionarmos as suas mínimas expressões e buscarmos a desconstrução dessa forma de viver e atuar no mundo, não conseguiremos construir uma nova sociedade, uma nova forma de pensar, ver o mundo e o outro.

Não devemos nos culpar por essa perpetuação enquanto processo consciente, mas é preciso compreender que o perpetuamos inconscientemente, e buscar compreendê-lo significa poder alterá-lo.

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Passo aqui a falar enquanto mulher e como determinadas atitudes e comportamentos podem fortalecer e manter essa estrutura patriarcal, que tentamos combater, mas muitas vezes sem conhecer todos os seus meandros e sutilezas.

A reprodução do patriarcado não é exclusiva dos homens, nós mulheres também o reproduzimos, em algumas circunstâncias agressivamente. Reproduzimos porque nos comportamos e exigimos essas atitudes estabelecidas na cultura do patriarcado de outras mulheres, e também dos homens.

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É fato que tivemos muitas conquistas, mas não conseguimos o principal, que é sermos consideradas como um ser completo, como individuo, como cidadã, sem sermos colocadas como inferiores ou sub-humanas, perpetuadoras da espécie humana. 

Nesse momento muitos e muitas não concordam com o que eu disse até aqui, afinal somos uma sociedade ocidental avançada, e talvez essas questões se refiram apenas a uma classe social mais baixa, e que a mulher com independência financeira ou uma posição de chefia no trabalho não sofre essas opressões do patriarcado.

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Refletindo sobre várias situações vividas por mim e por outras mulheres, resolvi fazer uma provocação para observar a reação masculina diante de uma fala que o objetifica, assim como o reduz a um mero reprodutor, instintivo, e, portanto, um ser sujeito a irracionalidade e partido, sem poder de decisão sobre sua individualidade.

Então, simplesmente, disse a um bom amigo que sua masculinidade se resume a um “pau duro” (seu órgão sexual ereto, pronto para ejacular o sêmen e, somente, fecundar – pensamento que me veio à cabeça, mas não foi verbalizado), a irritação veio instantaneamente, não queria sequer ouvir a explicação para minha afirmação.

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Após insistir para justificar a minha fala, ele disse que a ouviria, apesar de entendê-la agressiva, mas antes me disse que também faria uma consideração, e, portanto, reduziria a feminilidade a procriação.

Bingo!

Ele me deu o que eu precisava para complementar a provocação que tinha feito.

Vamos a explicação!

Antes um resgate histórico, sociológico, religioso, patriarcal e o que mais quiserem acrescentar.

A mulher sempre foi vista como o receptáculo, o útero, aquela que acolhe, cuida, alimenta e procria. Afinal, somos nós que engravidamos, ficamos prenhas e parimos. É a natureza da fêmea entre os mamíferos.

Assim, lhe disse que a feminilidade está vinculada a procriação e por este motivo a sexualidade da mulher é vista como apartada, separada, destacada do ser feminino, e isso nos torna seres incompletos, inferiores, objetificados e até sub-humanos. Enquanto os homens são seres racionais e completos em toda a sua integralidade. A masculinidade, é o racional, é o afeto, é o sexo, é o todo, é o ser-humano soberano e superior sobre os demais.

Dias depois com outro amigo, fiz a mesma provocação, a reação foi mais amena, mas o argumento que me trouxe foi sobre a diferença biológica entre homens e mulheres, a qual traria a mulher o instinto da maternidade, algo que os homens não possuem, pois os hormônios femininos imperariam sobre a racionalidade da mulher e a impulsionariam a ter filhos. Seria a preponderância do instinto animal sobre a racionalidade humana, a qual só é integral e plena no universo masculino.

Ainda somos vistas como perpetuadoras da espécie humana, inferiores na intelectualidade porque ainda sujeitas aos instintos animalescos da procriação, sem que a racionalidade e anseios de vida sejam levados em conta quando o relógio biológico da procriação grita.

O fato de ainda sermos vistas em algum grau como instintivas da procriação, e, portanto, com capacidade intelectiva inferior ao masculino, determina a regulação de nossos corpos, comportamentos, anseios e desejos, pois ainda não somos seres completos e inteiros no desenvolvimento do ser humano, por isso nossos corpos e mentes devem ser tutelados pelo Estado e pelo homem que está ao nosso lado, seja o pai, o irmão, o marido ou até mesmo o filho.

Essa forma partida de ver a mulher se expressa em várias situações, até mesmo nós mulheres muitas vezes nos sentimos e agimos dentro dessa lógica, que é a lógica da invisibilidade, da despersonalização da mulher quando se torna esposa, mãe e avó.

Nos colocamos sempre à disposição do homem, da família, dos filhos e do trabalho, sempre em uma tentativa de entrega total e de anulação de si mesma, pois assim a mulher é vista na sociedade patriarcal, mesmo no mundo ocidental. E assim nos comportamos, porque somos ensinadas a agir de acordo com o processo de dominação do patriarcado.

É evidente que existem outras questões que poderiam ser aqui abordadas que também são reflexo desta construção (o estupro corretivo é uma delas), a qual hoje está tão introjetada no pensamento humano que é tida como natural, mas isso não é verdade.

O patriarcado é apenas uma construção cultural, humana, intelectual que nos dividiu entre superiores e inferiores, sem considerar a completude de todo ser humano, e pode, deve ser modificado para a real perpetuação da espécie humana, com qualidade de vida, igualdade e liberdade.

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