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Pedro Simonard

Antropólogo, documentarista, professor universitário e pesquisador

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Pesquisa Datafolha expõe a polarização política no Brasil

Que a esquerda desenvolva estratégias que sejam capazes de mostrar para as camadas populacionais mais pobres e para as camadas médias que quem defende seus interesses é ela e não a direita

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Pesquisa realizada pelo Datafolha e publicada na Folha de S.Paulo neste domingo, 5 de janeiro, expõe a polarização política no Brasil. Antes de mais nada, é bom não nos esquecermos que a polarização não é de hoje e o país já está polarizado desde que a extrema direita se apropriou das manifestações de 2013. É interessante notar que quem fala contra a polarização são os mesmos que a iniciaram com a demonização da esquerda em 2013.

Voltando à pesquisa, sua pergunta básica solicitava aos entrevistados que expusessem seu nível de confiança em relação aos nomes de doze políticos presentes em uma lista apresentada pelos pesquisadores: Sérgio Moro, Lula, Jair Bolsonaro, Hamilton Mourão, Luciano Huck, Ciro Gomes, Fernando Henrique Cardoso, Marina Silva, João Dória, Rodrigo Maia, Manuela D’Avila e Davi Alcolumbre. O grau de confiança deveria se materializar em notas de 0 a 10 onde de 0 a 5 demonstraria baixa confiança, de 6 a 8 média confiança e de 9 a 10 alta confiança.

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Marcante é a constatação de que Ciro Gomes vai precisar de muito mais para se caracterizar como o candidato “contra tudo isto que está aí”, a esquerda e o fascismo bolsonarista. Bater no Lula como ele vem fazendo tira dele os votos da esquerda e não os substitui pelos da direita nem pelos do centro. 

Outro fato interessante é o nível de confiança alcançado por Luciano Huck entre os menos escolarizados e os nordestinos. Pelo visto o assistencialismo e o entretenimento baratos promovido em seu programa de televisão exibido nas tardes de sábado lhe dá uma razoável visibilidade. Mas será que o percentual dos que depositam alta confiança em Huck se deve apenas a sua exposição midiática?

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O fato mais importante, contudo, é a polarização entre Moro e Lula. 

A curva de aceitação de Sérgio Moro mantém-se estável entre novembro de 2015 e fevereiro de 2016 quando começa a registrar uma ascensão rápida e constante que coincide com o início do ataque mais direto a Lula. Em março de 2016 teve o episódio da “condução coercitiva” do ex-presidente para “prestar depoimento” no âmbito da Operação Lava a Jeito, ops, me desculpem, Lava Jato. Operação esta que corria em sigilo de justiça o que não impediu, por exemplo, que o deputado federal pelo Paraná, Fernando Francischini, evangélico e ex-delegado da Polícia Federal, e o então deputado federal pelo Rio de Janeiro, Jair Bolsonaro, estivessem na porta da sede da Polícia Federal em Curitiba munidos de fogos de artifício para comemorar a prisão do Lula. Entre fevereiro de 2016 e dezembro de 2019, a confiança em Moro subiu de 14% para 33%, alçada pelo estardalhaço midiático da Lava Jato e por sua nomeação como ministro do governo Bolsonaro.

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A curva referente à confiança em Lula, se comparada com a de Moro, expõe claramente que a polarização se intensifica com a perseguição política de Moro a Lula. Entre dezembro de 2009 e fevereiro de 2016, a aceitação de Lula despenca de 52% para cerca de 20% e começa a aumentar em fevereiro de 2016, justamente no momento em que Moro começa a atacá-lo com mais força. A confiança em Lula vem crescendo constante e firmemente até alcançar 30% em dezembro de 2019.

Parece que a força de Moro está em se caracterizar como o inimigo número um de Lula e a força de Lula está em relacionada aos ataques de Moro. Se esta análise está correta, Moro se encontra em uma encruzilhada porque precisa atacar o Lula, mas quanto mais ele o ataca, mais Lula se fortalece. O bem contra o mal; quem é o bem quem é o mal depende do viés ideológico do eleitor.

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A ascendência do Lula é muito mais significativa do que a do Moro. Este está sob os holofotes da mídia corporativa que lhe dedica páginas e mais páginas diárias nos jornais e nas revistas e horas e mais horas nos telejornais e nos programas de rádio, tecendo-lhe loas e divulgando positivamente seus “grandes feitos e vitórias” na “luta contra a corrupção”, apesar do ex-juiz federal fazer parte de um dos governos mais corruptos da história do Brasil marcado pelos escândalos das rachadinhas, do Queiróz, do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco, pela a amizade com as milícias e o crime organizado, pelos 14 milhões de reais em gastos pessoais com o cartão corporativo, escândalos estes que atingem toda a família Bolsonaro - menos, por enquanto, o 04 - sobre os quais Moro não fala nada nem procura apurar. Ele age como um cão de guarda, protegendo e blindando - juntamente com o “terrivelmente evangélico” Advogado-geral da União, Pastor André Mendonça, e o Procurador Geral da República, Augusto Aras - o clã Bolsonaro e outros membros do governo fascista.

Os escândalos denunciados pela Vaza Jatos não têm forças para derrubar a avaliação de Moro porque ficam restritos às mídias alternativas de esquerda ou a alguns programas de rádio e televisão e páginas da imprensa corporativa que para cada informação contrária ao Moro divulga muitas outras mais favoráveis a ele no intuito de reduzir os impactos negativos que as notícias da Vaza Jato poderiam causar à reputação do ex-juiz.

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Enquanto Moro é blindado pela mídia corporativa, Lula é massacrado por ela e é isto que faz com que o nível de confiança que ele goza seja mais significativo. Os processos contra ele continuam tramitando na “justiça” e contando com grande cobertura midiática, mas ele cresce e se fortalece. O massacre diário promovido pelos blogs de direita não lhe dá tréguas, mas ele cresce e se fortalece. As pregações cotidianas contra ele em igrejas evangélicas perduram, mas ele cresce e se fortalece. Parece imparável e se consolida, cada vez mais, como o candidato da esquerda e de setores nacionalistas nas eleições de 2022. O que pode pará-lo e impedi-lo de concorrer à Presidência da República em 2022? O cancelamento dessas eleições pelo endurecimento do governo por meio de um golpe de Estado ou uma nova prisão e/ou cassação dos seus direitos políticos. Neste caso, ele teria que transferir seus votos para um candidato que seria, segundo a conjuntura atual, Fernando Hadad que já demonstrou que não tem brilho próprio ao ser derrotado em duas eleições em que teve que concorrer por conta própria, a reeleição para prefeito de São Paulo e a eleição presidencial em 2018; o outro seria Flávio Dino que vem ganhando força entre os eleitores de esquerda por fazer um bom governo no Maranhão. Contra este pesam o fato de ser governador de um estado com pequeno cotingente eleitoral, o que o obrigaria a realizar um enorme trabalho para ampliar sua base eleitoral, e o fato de seu partido, o PCdoB, ter tomado algumas atitudes que foram mal avaliadas pelos eleitores de esquerda, cuja mais significativa foi o voto favorável ao Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST) que concedeu o uso do Centro de Lançamento de Alcântara, localizado no Maranhão, aos estadunidenses.

É interessante se notar também que a alta confiança tanto em Lula quanto em Moro está na casa dos 30%, mostrando que há um empate técnico entre eles. Em pesquisa realizada a alguns anos atrás o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, recém-falecido, mostrava que a esquerda e a direita detinham um percentual de eleitores cativos em torno de 30%, ou seja, aqueles que votam sempre na esquerda ou sempre na direita independentemente dos fatos, dos candidatos, da conjuntura ou o que quer que seja. Cabe os candidatos de cada um desses segmentos políticos cativar os 40% de eleitores voláteis, aqueles que, dependendo da conjuntura política, podem votar na esquerda ou na direita. A pesquisa Datafolha mostra que ambos, Lula e Moro, parece já terem atingido o patamar dos seus eleitores cativos ou estariam os apoiadores do Moro entre os voláteis e os de direita com o capitão? Se esta hipótese for verdadeira, isto indicaria que, na hora do vamos ver, a extrema direita poderia fechar com o Moro e se juntar aos 30% que o apoiam. O fato é que a pesquisa não possuiu um fator de exclusão e é possível que entre os 22% que têm média confiança em Bolsonaro podem estar alguns dos 30% que afirmam ter alta confiança em Moro e não acrescentariam nada significativo à aprovação deste. Ou mesmo que os 22% que têm alta confiança em Bolsonaro também depositem alta confiança em Moro o que também não acrescentaria nada significativo à aprovação deste. Resta ao Lula conseguir angariar o maior percentual possível dos eleitores voláteis.

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Por último, os dados desta pesquisa esboçam a luta de classes no Brasil. Lula tem seu grande contigente eleitoral entre os eleitores que estudaram até o Ensino Fundamental. As pesquisas no campo da educação demonstram que há relação direta entre anos de estudo e renda familiar. Sendo assim, Lula seria o candidato dos trabalhadores menos qualificados, com renda salarial mais baixa (o curioso é que a maioria dos que depositaram alta confiança em Luciano Huck também estão nesta classe social). Moro é o candidato dos setores conservadores aqueles que ganham mais de 10 salários mínimos e aqueles que possuem 60 anos ou mais o que se traduz em trabalhadores mais qualificados e aposentados.

No que concerne à polarização, esta indica que, cada vez mais, esquerda e direita terão que expor seus princípios programáticos para se diferenciarem claramente, visando seduzir os eleitores voláteis e para tentar conquistar alguns cativos do outro espectro político. 

Que a esquerda desenvolva estratégias que sejam capazes de mostrar para as camadas populacionais mais pobres e para as camadas médias que quem defende seus interesses é ela e não a direita. 

Os eleitores evangélicos estão, em sua maioria, entre os mais pobres e as propostas da esquerda precisam seduzi-los se esta quiser se consolidar eleitoralmente entre eles. A coluna Painel de hoje, dia 5 de janeiro, na mesma Folha de São Paulo, informa que Lula solicitou ao PT que crie “núcleos evangélicos nos estados para buscar apoio nas bases religiosas”. Na avaliação de evangélicos ligados ao partido, não será uma tarefa fácil porque a direita chegou primeiro e “fidelizou” estes eleitores. A maioria das lideranças evangélicas é refratária ao discurso da esquerda e será preciso disputar as bases com estas lideranças. Esta posição do Lula é um bom sinal porque mostra que a esquerda, pelo menos o PT, começou a se mover para reconquistar seus eleitores perdidos. No processo de sua formação, o PT contou com amplo apoio de padres e fiés ligados à Teologia da Libertação. Ao assumir o poder, fez alianças com evangélicos fundamentalistas, abandonou o trabalho de base e perdeu acesso a este público. É preciso reconquistá-lo.

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