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Paulo Henrique Arantes

Jornalista há quase quatro décadas, é autor de “Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil”

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Projeto do governo não resolve o caos tributário

O bom-senso nos leva a sermos favoráveis a algum nível de tributação de lucros e dividendos, desde que haja um ajuste na alíquota da pessoa jurídica. A questão simbólica também é importante, e também a efetivação da justiça tributária

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Quem não se queixa de pagar impostos? A reclamação é livre, mas não pagar significa recusar-se a participar da construção da nação, a despeito da qualidade dos serviços públicos dados em retorno. O problema maior surge quando o sistema tributário pesa mais sobre quem tem menos condição contributiva – os mais pobres. É o caso brasileiro. A injustiça arrecadatória nacional revela-se por diversas faces, seja a da infinidade de impostos indiretos – incidentes sobre o consumo, e que oneram pelos mesmos percentuais todas as classes sociais –, seja a do caráter pouco progressivo com que se taxa a renda, que o projeto de lei em apreciação no Congresso não corrigirá.

Quase ninguém discorda da necessidade de se simplificarem os tributos sobre o consumo no Brasil. Porém, há uma questão que gera debates acalorados entre especialistas: não é consenso que se possa dar caráter progressivo a esse tipo de imposto. De todo modo, a simplificação, que constava do projeto elaborado por Bernard Appy e bastante debatido em 2018, está passando longe do debate atual.

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A tributação sobre consumo é voltada à arrecadação, que por sua natureza é regressiva, onerando mais pesadamente aqueles que têm menos poder aquisitivo. Se não houver um nível correto de incentivo fiscal, como isenção ou não-tributação de bens de primeira necessidade, qualquer imposto sobre consumo será regressivo. 

Especialistas como Maria Helena Zockun, diretora de Pesquisa da Fipe-USP, considera os tributos sobre o consumo naturalmente regressivos, mas não acha que a isenção de itens básicos resolva o problema. Os governos reduziriam demais a cesta básica, mas ao fazerem isso desoneram tanto para o pobre quanto para o rico, o que não resolveria nada.

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A origem da regressividade dos impostos indiretos, entende Zockun, é a extrema desigualdade de renda do país, que leva a um perfil de consumo muito diferenciado das famílias ao longo de sua estrutura de renda. 

Para Vanessa Canado, integrante do grupo de Appy, o CCiF, e que deixou recentemente a equipe de Paulo Guedes, a principal causa do caos tributário é a tributação do consumo. No Brasil, ela aponta, vigoram três impostos da União (PIS, Cofins e IPI), o ICMS, que é dos estados, e o ISS, dos municípios. Há uma fragmentação não só entre os entes federativos, mas uma fragmentação da base tributária. Então, em vez de tributar tudo que é consumido, pede-se para o município tributar serviços, o estado tributar mercadorias e o Governo Federal tributar faturamento e produtos industrializados. No dia a dia, é muito difícil fazer essa segregação, entende Canado.

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Por conta desse “caos”, segundo ela, as empresas ficam numa disputa por classificação fiscal, para saber o que estão fazendo, o que têm que pagar, e essa diversidade de entes federativos que cobram faz com que haja múltiplas regras.

Economistas mais progressistas, contudo, observam que a unificação de competências e a exclusão de estados e municípios ofendem o pacto federativo, porque retirariam dos estados e dos municípios a capacidade de obter receita de forma autônoma. Além disso, retirariam dos entes federativos a possibilidade de fazer política tributária com os impostos que são de sua competência, e que deixarão de ser. Elimina-se a capacidade de se utilizar o tributo para fins de desenvolvimento regional, econômico e social.

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A proposta do governo é de taxar dividendos em 20%. No Brasil e na Estônia, e em nenhum outro país do mundo, a distribuição de lucros e dividendos a acionistas de empresas não é taxada. A benesse foi concedida em 1995 pelo governo Fernando Henrique Cardoso sob a justificativa de possuir o condão alavancar investimentos. A questão parece simples de resolver: se é injusto como está, taxe-se. Se é correto, mantenha-se a isenção. Mas há questões delicadas envolvidas.

Na verdade, o modelo de tributação dos lucros da empresa pode ser estruturado de diversas formas. A mais comum é o sistema misto, pelo qual tributa-se o lucro quando distribuído à pessoa física e, antes, tributa-se a empresa. Dessa forma, pode-se onerar menos a empresa em nome do reinvestimento. O modelo, contudo, tem armadilhas: as pessoas podem não distribuir os lucros e, aí, não pagam a segunda parte do imposto. Porém, se não há divisão e tributa-se tudo na empresa, como acontece no Brasil, compromete-se a capacidade de reinvestimento da empresa e o país sai perdendo do ponto de vista competitivo.

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Quem defende a não tributação de lucros e dividendos diz que a pessoa jurídica já paga, então ocorreria bitributação. E quem defende a tributação de lucros e dividendos diz caminhar no sentido da justiça, porque as pessoas físicas que mais recebem não estariam sendo tributadas, o que configuraria caráter regressivo. O bom-senso nos leva a sermos favoráveis a algum nível de tributação de lucros e dividendos, desde que haja um ajuste na alíquota da pessoa jurídica. A questão simbólica também é importante, e também a efetivação da justiça tributária.

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