CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
Luis Felipe Miguel avatar

Luis Felipe Miguel

Professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB). Os textos reproduzidos nesta coluna são postados originalmente no Facebook do autor

87 artigos

blog

Qual democracia?

"Os ataques de Bolsonaro à Folha são, sem dúvida, condenáveis demonstrações de autoritarismo. Mas a solidariedade que o jornal merece, mesmo com todos os seus muitos vícios, é freada pela repulsa à sua tentativa desavergonhada de se promover como mártir da democracia brasileira", escreve o professor de Ciência Política da UnB Luis Felipe Miguel

(Foto: Marcos Corrêa/PR | Webysther Nunes)
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

Por Luis Felipe Miguel 

(artigo originalmente publicado no site A Terra é Redonda)

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Do começo de 2014 ao final de 2018, o jornal Folha de S. Paulo disputou, com todo o resto da grande imprensa brasileira, o título de “Diário Oficial da Lava Jato”.

Exaltou Sergio Moro e Deltan Dallagnol como salvadores do Brasil, embarcou alegre em qualquer denúncia que atingisse Lula, fez tabelinha com policiais e procuradores para criminalizar o PT e a esquerda. Foi mesmo precursora daquilo que hoje se conhece como “doutrina Gebran da propriedade”, com os infames “furos” de reportagem sobre os pedalinhos e o “iate de lata”.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Quando a sua campanha pela vitória daquele homem santo, Aécio, não deu certo, a Folha aderiu imediatamente à ideia de um golpe.

Diante de Bolsonaro, hoje, a Folha diz: é preciso contê-lo. Diante de Dilma, ela dizia: é preciso derrubá-la.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Basta comparar os noticiários de uma e outra época. Quem lia a Folha nos últimos anos de Dilma via um país a caminho do caos. Moeda desvalorizada, carestia, desemprego, crescimento econômico pífio – e um governo envolvido em escândalos de corrupção.

Hoje temos moeda desvalorizada, carestia, desemprego e crescimento econômico pífio, mas a Folha não retrata a economia como estando à beira do abismo. Ao contrário, não cansa de exaltar a política econômica de Guedes. Os escândalos de corrupção são noticiados, mas de forma intermitente. E o envolvimento da cúpula do poder com a criminalidade comum é praticamente escamoteado do noticiário.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Quando o golpe de 2016 logrou êxito, a Folha saudou o governo Temer. Fiel a seu estilo, com críticas pontuais, mas apoiando fortemente o congelamento do gasto social, a entrega do patrimônio nacional, a redução dos direitos trabalhistas. Nunca descuidou de negar o golpismo do golpe e manifestou simpatia às tentativas de censura de quem tentava debater o caráter ilegítimo da derrubada de Dilma.

A Folha endossou a condenação forjada e a prisão inconstitucional de Lula. Sua adesão às regras da democracia mostrou-se tão lassa que se dispôs a participar de uma fraude eleitoral – o afastamento ilegal do candidato favorito – para garantir uma legitimação de fachada para o golpe que apoiara.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Nas eleições de 2018, insistiu na tese ridícula dos “dois extremos”, equiparando o amigo de milicianos e entusiasta de torturadores Jair Bolsonaro a um político de credenciais democráticas irretocáveis (e além disso bem palatável para os grupos liberais), Fernando Haddad. Continua batendo nessa mesma tecla, aliás, como mostra o lamentável artigo de Hartung, Lisboa e Pessôa, com chamada de capa na edição do dia 01 de dezembro, cujo título, na edição digital, é “Brasil vive entre riscos de extrema direita e recaída lulista” – e cujo resumo é que o país “precisa retomar diálogo para evitar radicalismos”.

Com Bolsonaro no poder, a Folha trabalhou ativamente para cercear a discussão sobre as políticas destrutivas de Paulo Guedes.

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

A “democracia” que o jornal defende é compatível com a interdição da participação da classe trabalhadora no debate público e o cerceamento de suas organizações.

É a mesma Folha, não esqueçamos, que até hoje não foi capaz de fazer sequer um mea culpa hipócrita de seu apoio, inclusive material, ao golpe de 1964 e à ditadura militar. Ela fará mea culpa de sua participação ativa na destruição da ordem definida pela Constituição de 1988? Certamente não.

Os ataques de Bolsonaro à Folha são, sem dúvida, condenáveis demonstrações de autoritarismo. Mas a solidariedade que o jornal merece, mesmo com todos os seus muitos vícios, devido ao princípio da liberdade de expressão que nós gostaríamos de ver estendido também aos grupos historicamente silenciados, é freada pela repulsa à sua tentativa desavergonhada de se promover como mártir da democracia brasileira.

Como eu já escrevi outro dia: se é para dar dinheiro em favor da pluralidade de informação, que seja para os portais alternativos, para a Rede Brasil Atual, para o Brasil de Fato, para a TVT. Quanto à Folha, que seja bancada por aqueles a quem ela quer dar voz: a burguesia “ilustrada” paulista, a direita “civilizada”, os conservadores “descolados”. Que, aliás, têm condições materiais mais do que suficientes para manter seu órgão de imprensa, caso desejem.

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Carregando os comentários...
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO

Cortes 247

CONTINUA APÓS O ANÚNCIO
CONTINUA APÓS O ANÚNCIO