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Carlos Carvalho

Doutor em Linguística Aplicada e professor na Universidade Estadual do Ceará - UECE.

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Quando os piores assumem o poder

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Os gregos nos legaram uma infinidade de termos e expressões, que adicionamos ao nosso vocabulário e usamos sem nem lembrarmos suas origens. Entre inúmeras, “caquistocracia” é uma das que são menos usadas por nós. Significa “o governo dos piores” e é formada a partir da junção dos termos kákistos (mau, feio, pior) e kratos (poder, governo). O surgimento da palavra em questão remonta ao século XVII, tendo sido utilizada como forma de descrever a tomada de poder por pessoas inescrupulosas, desqualificadas, incompetentes, amorais e antiéticas. Não raro, criminosas. Assim, compreende-se como caquistocracia toda e qualquer forma de governo ou de poder cuja liderança está nas mãos das pessoas com as piores qualidades.A palavra “caquistocracia” ainda não está presente na maioria dos dicionários em língua portuguesa, mas já começa a ser definida e contextualizada em páginas na Internet. Mesmo sendo uma famosa desconhecida para a maioria das pessoas, uma busca breve na Internet (na Wikipedia, por exemplo) indica que seu primeiro uso data, como dito, do século XVII, notadamente nos escritos de Paul Gosnold, publicados por volta de 1644. Há ainda menções ao seu uso na obra The Misfortunes of Elphin (1829), de Thomas love Peacock (1785-1866), e ainda em William Harper (1790-1847) e James Russell Lowell (1819-1891). Mesmo prenhe de uma carga semântica pra lá de poderosa, a palavra caquistocracia ficou por muito tempo relegada ao limbo das línguas e da política. Chegado o século XXI, a palavra caquistocracia foi resgatada quando da ascensão ao poder de políticos como Donald Trump e Jair Bolsonaro, cujos governos são exemplos da mais perfeita tradução do termo. Sobre tal questão, nosso texto dialoga com o artigo “Government by the worst”   https://mondediplo.com/2020/08/12government, de Ibrahim Warde, disponível também em português em https://diplomatique.org.br/a-caquistocracia/.

Há, nas caquistocracias, uma obsessão pelo desmonte das instituições democráticas, bem como o recorrente ataque ao Estado Democrático de Direito. Neste contexto, ampliam-se os projetos necropolíticos, com atentados aos direitos humanos, ao meio-ambiente e à incansável tentativa de desacreditar especialistas, notadamente intelectuais e cientistas. O resultado que advém de tudo isso é, entre inúmeros outros, o avanço nefasto do negacionismo, bem como o empoderamento de determinados líderes populistas que, de tão à vontade que estão, nadam de braçadas na lama da mais completa impunidade. Os cargos em administrações desse tipo são geralmente preenchidos pelos piores nomes, os quais não possuem as qualificações requeridas, mas são bem quistos pelos que detém a caneta, como se escuta dizer por aí.

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O jornalista Alexander Nazaryan analisou, conforme Warde, as qualificações de alguns dos membros que compunham o governo Donald Trump. Para surpresa de ninguém, Nazaryan identificou que havia ali uma série de figuras anacrônicas, cujas preocupações eram apenas os próprios interesses e, como mencionado, sem a menor competência para as funções que estavam exercendo. A isso, Nazaryan denominou de “an orgy for first-class kleptocrats”, ou seja, “uma orgia para cleptocratas de primeira classe”. Nesse sentido, notam-se determinadas aproximações do governo Trump com o governo Bolsonaro, quando ambos transformaram o serviço público no inimigo número um a ser combatido, desacreditando os serviços, perseguindo trabalhadores, sucateando e aparelhando universidades, e atacando instituições. Aos que ousam se posicionar contra a caquistocracia e, consequentemente, a cleptocracia que lhe vem a reboque, resta a perseguição e a intimidação, sendo comumente acusados de estarem a serviço do deep state, ou seja, o Estado profundo, que tem como objetivo impedir que o tal político governe.

E assim agem os governos dos piores, como se o universo inteiro conspirasse contra eles. Para tanto, tentam esconder sua corrupção, seus desmandos e suas incompetências sob o manto tecido com as linhas das notícias falsas, da pós-verdade e da necropolítica. Contudo, quando são postos diante de algo que requer a tomada de decisão de um líder, como uma pandemia, por exemplo, esse “algo” os devora pois já não conseguem se esconder da realidade, uma vez que não são nada mais que fraudes. É por razões assim que minam e tentam destruir o Estado democrático de Direito, para que possam agir sem que sejam incomodados no exercício da sua incompetência. Por fim, cabe lembrar a pergunta que o poeta James Russell Lowell fez, em 1877, ao colega Joel Benton (1832-1911): “... é o nosso 'governo do povo pelo povo para o povo', ou é antes uma Caquistocracia, em prol dos cavaleiros à custa dos tolos?". 

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