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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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Quem tem medo de Bolsonaro?

"Depois de muitas cambalhotas, Bolsonaro parece ter se lembrado dos tempos em que era deputado. Assim, banhado, escanhoado e 'tranquilo', conseguiu à base da troca que tanto condenou na campanha, o apoio de 206 deputados do centrão, e até arrefecer o azedume do ministro Celso de Mello", escreve a jornalista Denise Assis

Bolsonaro, em evento no Planalto, em Brasília 17/6/2020 (Foto: REUTERS/Adriano Machado)
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Por Denise Assis, para o Jornalistas pela Democracia 

Até meados de março os empresários davam de ombros e faziam muxoxos, cada vez que ouviam o nome de Jair Bolsonaro. Aquele sem modos, ruidoso, bronco e de má fama, deviam falar aos botões de suas camisas, Ermenegildo Zegna. Até então, convicto de que a qualquer hora que lhe apertassem o calo, poderia lançar mão do artigo 142, da Constituição, e enquadrar todo mundo, Bolsonaro era só bazófia, arroubos e desaforos. Cercado de militares por todos os lados, ele não ouvia ninguém a não ser a série de 01,02 e 03, que por sua vez retransmitiam o que lhes passava o autoproclamado “filósofo” esbravejante da Virgínia.

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Enquanto isto, a turma de poderosos da Paulista, postava os olhos aos gestos de Paulo Guedes, onde identificavam alguma semelhança com a política ao gosto da Fiesp. Este sim, os representava. Apesar do corte – ou a ausência de – do cabelinho à lá tio Patinhas de almanaque, viam nele alguma proximidade com o que podiam chamar de “um dos nossos”.

Ao mesmo tempo, Bolsonaro continuava dando coices e rabos de arraia nos demais poderes, a quem culpava por tudo, sem admitir a sua total falta de projeto, falta de conhecimento de como funciona a máquina governamental, e de até onde podia avançar sem criar “marolas” e encrencas. Criou todas. Com a imprensa, com o STF, com a Câmara e, até mesmo, com Davi Alcolumbre, o seu aliado no Senado.

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Brigou com a sombra, o próprio partido que o elegeu. Ficou na chuva e se irritou a ponto de chutar o balde de forma quase irreversível. Naquele momento, isolado, continuava tendo algo em torno de 30% de apoio popular, o que fazia tremer o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. A esta altura chegavam os primeiros pedidos de impeachment até a sua mesa, mas ele adiou. “Não era a hora”.

Não? Não tínhamos as limitações da pandemia. Bolsonaro já havia perfilado crimes de responsabilidade e a imprensa atacada todos os dias no chiqueirinho do Alvorada, começava a dar mostras de irritação e retirava apoio. O quadro perfeito para balançar o pé de fruta. Faltavam apenas dois detalhes: um líder para puxar o grito nas ruas e o presidente da Câmara concordar. Não tivemos nem uma coisa nem outra.  E veio o isolamento social. A tragédia que já beira os 65 mil mortos.

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Depois de muitas cambalhotas, Bolsonaro parece ter se lembrado dos tempos em que era deputado e, apesar de não prestar atenção no modo de se fazer política – passou 28 anos dentro do Congresso com atuação pífia, sem apresentar projetos relevantes -, aconselhado pelo golpista Michel Temer, cuja “habilidade” ninguém pode negar, abandonou as falas ásperas no chiqueirinho. Convencido de uma vez por todas da real finalidade do artigo 142 da Constituição – e não é para dar golpes -, recolheu a sua turma de coturnos e desistiu de chantagens e ameaças. Ninguém mais tem medo do bicho-papão. Vergado ante processos seus e dos filhos, culminando com a prisão do antigo aliado da Comunidade de Rio das Pedras, vestiu o modelito discreto e buscou pontes com os poderes vizinhos. Não está mais “de mal”.

Assim, banhado, escanhoado e “tranquilo”, conseguiu à base da troca que tanto condenou na campanha, o apoio de 206 deputados do centrão, e até arrefecer o azedume do ministro Celso de Mello que, ao que parece, deixou de achar urgente o depoimento de Bolsonaro. Adiou o assunto para depois do recesso. É possível que o dispense de fazê-lo pessoalmente. Uma pena, porque “o corpo fala”. Fez elogios a Toffoli, conversou com Rodrigo Maia e com Alcolumbre e, o mais importante do ponto de vista dele: recebeu afagos do PIB paulista.

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Uma vez, no final dos anos 80, fui designada para entrevistar um grande empresário carioca, em seu gabinete. O senhor de meia idade, com má fama nas conversas femininas, me recebeu com uma bala na boca, jogada contra os dentes, o que fazia um ruído irritante enquanto ele falava, girando em sua cadeira de espaldar alto. No subtexto estava implícito: sou poderoso, rico e por isto posso ter maus modos. Quem tem que manter os modos aqui é você. Continuei fazendo o meu trabalho com naturalidade, até que este senhor tirou os sapatos e esticou os pés sobre a mesa, quase no meu rosto. É claro que a entrevista acabou ali. Com cordialidade, mas era o meu limite.

Isto, para dizer que enquanto Bolsonaro portou-se como eles se portam sem, contudo, integrar a turma deles, não era bem-vindo. Somente os muito ricos podem esticar o pé sobre a mesa. Agora que resolveu ter modos, eles até aceitam os seus convites. Afinal, a política de Guedes continua a mesma. Aquele decano da política, o “príncipe” que os representa, já disse que tolerará Bolsonaro até 2022, nas “eleições”. Não se espantem se até oferecer um vice para formar chapa.

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Então, é hora de compor as peças no tabuleiro. O empresariado almoçou feliz no Palácio da Alvorada, juntamente com os demais poderes, com direito a declaração apaziguadora de Dias Toffoli e do empresariado. Para eles, “o pior da crise causada pela pandemia de Covid-19 já passou”. Para nós, ela está no auge, mas quem se importa?

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