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Gustavo Conde

Gustavo Conde é linguista.

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Reforma da previdência é o pré-sal do mercado financeiro

O editor e colunista do 247 Gustavo Conde afirma que a reforma da Previdência nos termos do bolsonarismo desalmado é a expressão máxima de uma regressão política e social sem precedentes, uma máquina de pobreza, uma usina de morte e desprezo pela história, pela vida, pelas pessoas e pelo futuro; Conde ressalta: "é um escárnio, um serviço grotesco que, se aprovado, deverá ser desfeito, como no Chile"

Reforma da previdência é o pré-sal do mercado financeiro
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O noticiário parece uma máquina enguiçada. Cai uma peça, gira em falso, explode o motor. A história está enguiçada. A gente assiste a tudo quase como expectadores o desfile da monstruosidade gerencial de Bolsonaro. O Brasil é uma grande Sapucaí, carnavalizado pela própria impossibilidade de ser feliz.

Nesse meio tempo, as coisas vão se ‘normalizando’, ‘naturalizando-se’. Lula preso, Bolsonaro presidente, judiciário tutelado, militares se multiplicando no governo como uma piracema indigesta, declarações grotescas a rodo de ministros-aberração, incoerências putrefato-oportunistas de ex-juízes.

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Achar que caixa dois é o pior dos crimes de corrupção e depois dizer que não é nada grave, extirpando a concepção anterior de um projeto para apreciação pública é o suprassumo da mediocridade. Mas quem está ligando, fora as pessoas de sempre, que sempre avisaram sobre tudo-isso-aí-que-está-acontecendo-agora?

Na verdade, todos os prognósticos feitos pelo segmento democrático da sociedade brasileira foram conservadores. A realidade bolsonariana superou em muito as previsões tímidas de que o mundo iria acabar. Com Bolsonaro o mundo não acabou, porque acabar seria bom demais para o mundo. Com Bolsonaro, o mundo (da realidade social brasileira) se transformou em um eterno suicídio, processo muito pior do que a extinção pura e simples (porque é um processo que ‘dura’).

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O bolsonarismo é a pseudo politização de um grupo social que jamais conseguiu participar do processo democrático.  Que sempre viveu à margem da política, sempre bebeu na fonte da tortura, do assassinato, da eliminação do outro e do gozo doentio das catástrofes alheias.  

É a ode à ‘família miliciana’, aquela que mata e gosta de matar. Para se ter uma ideia, no Brasil, as taxas de violência e assassinato domésticas são parelhas com as da violência urbana, igualmente uma aberração social (taxas de países em guerra). O seio da família brasileira real, desassistida agora de todo e qualquer movimento de humanização, é a mola mestra da violência que significa e legitima esse governo.

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Lula e o PT subverteram essa lógica e por isso, Lula está preso e o PT está ainda em modo ‘reorganização e reação’. A incredulidade diante de tudo isso é paralisante.

O caso Bebianno é um desses avisos de ‘para tudo que eu quero descer’. Há uma hipocrisia geral em todos os lados que ainda acredita em processos políticos de ‘fritura’ subscritos no passado recente.

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Não. Não há mais ‘fritura de ministro’. Tudo vira produto, diversionismo, instrumento.

O Brasil se re-fragmentou em agentes de Estado e expectadores do processo novamente de maneira muito rápida, com a chancela da classe média inercial e orgulhosa da própria ignorância.

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E a grande prova de integridade e inocência de Lula e do próprio PT – que alguns setores da esquerda ainda insistem em criminalizar, num processo suicida sem fim – é justamente ele, Lula, estar ‘apartado’ deste processo a-histórico de perseguição ideológica que potencializa ainda mais os significados de sua prisão.

É um fenômeno “ao contrário” que a história real ainda vai explicar: Lula preso é a prova absoluta de sua inocência diante de um Estado corrupto, de uma elite omissa e de um povo acuado e novamente viciado no silêncio, vício que traduz-se em encarnar com gosto o expectador do próprio aniquilamento.

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Um dado emblemático desse silêncio é o fechamento da Ford em São Bernardo do Campo. Três mil empregos. A montadora brasileira para de produzir caminhões e quatro modelos de automóveis. Isso é inédito. Nos governos democráticos de Lula e Dilma, os estados brigavam para disputar a planta de uma montadora - e isso era tratado como ‘problema’ pela imprensa.  

Silêncio neles.

A manifestações sindicais estão acontecendo, no entanto – à revelia da espiral do silêncio que se reinstalou no país. Centrais estão lutando contra a reforma da Previdência.

O governo, por sua vez, sofreu uma derrota humilhante na abertura dos trabalhos no Congresso – que a imprensa, tradicional ou não, mal noticiou – mas, diante da inanição e da apatia de um segmento democrático que gosta de se sentir bonzinho e civilizado demais (falo da população que deveria monitorar o Congresso, não dos eleitos), a máquina da chantagem política temerista pode voltar a funcionar, por inércia – e, assim, lentamente, legitimar o governo Bolsonaro, por ora, ilegítimo, em todos os sentidos, até na prática política tradicional.

Vamos deixar isso acontecer?  Vamos deixar Bolsonaro se ‘naturalizar’?

Tudo isso – todo esse suicídio coletivo de um país – certamente vai gerar um levante violento e maciço da população. Mas pode demorar. A desorganização do Estado brasileiro foi tão brutal que paralisou as possibilidades de mobilização no mundo do trabalho.

Some-se isso a tentativas de criminalização das manifestações (terrorismo), às usinas de fake news de Carlos Bolsonaro, à apatia da imprensa tradicional e à busca por likes da imprensa progressista.

Na ditadura militar, caras-pálidas, ainda havia uma esperança de que, no futuro, ela morreria decrépita e na lama da vergonha, como morreu. Mas, cadáveres do horror podem voltar à carga, como nós estamos assistindo neste momento.

O Haiti é aqui, amigos. Três dos quatro ministros palacianos foram comandantes da força de paz do Brasil no Haiti (quando o Brasil era uma democracia e exportava seu humilde quinhão de civilização).

Roger Waters – caros roqueiros progressistas - disse que Lula só foi preso porque ganharia a eleição. Não. Ele foi preso porque ele representa a única possibilidade de civilização para o país. Porque ele representa o perdão, o amor, o orgulho, a garra, a democracia, a estabilidade.

Nós temos uma chance, lívidos leitores. O Congresso Nacional não é como o bolsonarismo podre nem como o judiciário tutelado. O Congresso Nacional é heterogêneo, múltiplo, diverso, pouco domesticável, por incrível que pareça.

Pressionado pelo povo - vejam vocês - ele pode ser o fiel da balança por uma volta à democracia.

Agricultores, por exemplo – notem a ironia –, não sabem o que está acontecendo. Votaram em Bolsonaro para impedir o PT e agora se veem em podres lençóis. Não se davam conta de que as políticas para o setor demandavam competência e compreensão dos mercados de fato (não essa baboseira do Paulo Guedes que é um tecnocrata a la tucanos e nunca viu de perto uma pessoa do povo na vida).

O país empobrece, desapercebidos colegas. Vai faltar dinheiro em todos os setores. Temer e PSDB devastaram a estrutura de governança.

Mas o Brasil é imenso e cheio de vocativos.

A reforma da Previdência mobiliza uma cifra de chamamento social que pode ser definida em uma palavra: barbárie. O volume de hipocrisia subscrito na publicidade informal paga em jornais tradicionais acerca da reforma da Previdência é qualquer coisa de catastrófico.

É decorrente da renovação e do contraste ainda vicejante entre esquerda e direita, mas não uma esquerda do século 20, ou uma esquerda tradicionalista, romântica, fetichizada até pelos ultraconservadores que não têm um conteúdo teórico sequer para chamar de seu. Trata-se da esquerda lulista, a esquerda que pensa, versus a direita bolsonarista, a direita que mata.

E o contraste entre esses dois segmentos é simples de contemplar: um dispõe de uma lógica acumulacionista, são acumuladores compulsivos, desumanizados, violentos. Outro, preza o ‘movimento’, a circulação da riqueza, a produção e a inovação.

O que, afinal de contas, caracteriza uma sociedade, pacientes leitores?

A diferença entre direita e esquerda é realmente essa: a esquerda faz o dinheiro circular (porque isso gera riqueza, distribuição e avanço social) e a direita sempre busca represar o dinheiro (porque isso a enriquece, a empodera e promove o avanço apenas do seu entorno direto).

Talvez seja a hora de inventar um sistema novo, um sistema que aproveite esse ímpeto suicida da direta de querer toda a riqueza para ela e o canalize para outro papel, como uma armadilha técnica e histórica necessária (já que eles não entendem nada).

Se deixar Lula solto, ele encontra esse sistema rapidinho. Aliás, minto: ele já encontrou. A grande engenharia social teórica hoje é isso: encontrar fórmulas que produzam ciclos virtuosos de distribuição de renda com geração de riqueza.

O menor pedágio alcançado através de licitações inteligentes, o Bolsa-Família, o Minha Casa Minha Vida, o Luz para Todos, o Prouni, o Fies, o Pronatec, o cadastramento do empreendedor individual... Todos esses programas são dispositivos de uma compreensão poderosa de Estado, de sociedade e, é claro, de economia.

A sociedade produz muita riqueza, o mundo todo pode ter um padrão de vida espetacular, é só colocar a inteligência para funcionar.

O paradigma da direita é o paradigma do perdedor, do perdedor preguiçoso. Para eles, parece que a possibilidade de produzir riqueza é, paradoxalmente, um crime.

Essa é a diferença da esquerda de Lula e da direita deles: eles não sabem produzir riqueza, nem material, nem monetária, nem intelectual. É um assombro.

A reforma da previdência, o teto de gastos, as políticas de arrocho, de endurecimento de lei, de extermínio de leis trabalhistas são a contrapartida dos programas virtuosos de geração e distribuição de riqueza. Ela empobrece tudo, o país, as pessoas e os sonhos.

Lembremos o caos vicejante do presente governo e da presente inanição da imprensa: cada deputado do centrão vai custar 10 milhões para aprovar a reforma. Objeções?

Diante desse volume de trapaças e canos fumegantes, eles vão produzir uma catástrofe social. É política de extermínio.

Um país rico como o Brasil pagar 400 reais para os idosos?

Menos dinheiro na praça, menos dinheiro no futuro, menos dinheiro circulando, menos investimento, menos comércio, menos entretenimento, menos vida.

É a lógica da pobreza, de dinheiro e de espírito.

Enquanto isso, a imprensa agoniza, passiva, inercial, burra, paralisada.

Eles celebram. A mudança de regras vai gerar um mercado gigantesco de previdência privada (os jornalistas têm patrões, mas os patrões dos jornalistas também têm patrões). É mais e mais gente para ser explorada. São milhões. O mercado de previdência mais suculento do mundo. É o pré-sal para a exploração, não de petróleo, mas de gente.

Explorar gente dá muito mais lucro que explorar petróleo, diga-se.

E como a população brasileira foi privada da racionalidade com o golpe e com o ódio ao PT e à civilização, esse debate está praticamente interditado.

O governo não tem votos para aprovar a reforma, mas vai querer comprar. E tem muito dinheiro para isso, claro, porque a reforma abre um mercado privado de muitos bilhões.

Vamos deixar isso acontecer? Vamos assistir tudo de camarote, pela internet? Vamos aceitar esse fanatismo político podre e assassino? Esse desvario incessante, essa pistolagem grotesca, esse gás paralisante de um noticiário enguiçado?

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