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Roberto Bueno

Professor universitário, doutor em Filosofia do Direito (UFPR) e mestre em Filosofia (Universidade Federal do Ceará / UFC)

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Tempo de exílios e o fim da ilusão da democracia

O Deputado Jean Wyllys é uma das vozes da resistência, e o seu exílio significa o corte exato e momento preciso a partir do qual já não há mais como o povo brasileiro manter a ilusão da vida sob regras democráticas posto tratar-se de um mandato político legitimamente outorgado pela população

Tempo de exílios e o fim da ilusão da democracia (Foto: Cleia Viana - Câmara)
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Quando um país começa a observar que os seus nacionais rumam para o exterior já não mais na qualidade de turistas mas na condição forçosa, e forçada, de exilados, então, há sérias e negativas repercussões sobre a democracia que precisam ser analisadas. A ideia de exílio implica deslocamento ou expatriação forçada, e quando ele ocorre devido a iminente atualização da capacidade ofensiva e de extermínio das autoridades instaladas nas altas esferas de poder do Estado tendo como alvo indivíduos ou grupos de seus nacionais, então, este cenário é constitutivo de uma das mais sérias versões de ameaça a democracia. Sob este cenário podemos afirmar que deparamos com mais uma prova inarredável de que o Estado de direito ruiu.

O Estado de direito pode operar ainda mesmo em uma democracia de baixa voltagem, entendendo a esta última como operativa em um sistema em que a qualidade da democracia é baixa. Nesta condição os direitos e garantias não estão plenamente instalados, eis que ameaças a opositores políticos e as garantias à integridade física são virtualmente incompatíveis com o nível básico de uma democracia.

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Neste dia 24 de janeiro de 2019 o Deputado Federal Jean Wyllys (PSOL) oficializou o abandono de mandato parlamentar que lhe foi concedido por expressivo número de cidadãos brasileiros. Quando um Presidente da República e um filho recentemente eleito Senador da República vem a público manifestar-se com desprezo e malsã ironia degenerada relativamente ao fato de que um representante do povo se encontre inseguro a ponto de buscar o exílio presenciamos um fato inaceitável mesmo para uma democracia de baixa voltagem. O fato expõe com absoluta clareza e transparência que o grupo político que controla o núcleo do poder despreza absolutamente o processo eleitoral, deixando claro que não se interessa e nem respeita a democracia, sequer neste aspecto essencial que é o resultado da decisão política expressa nas urnas. Colocando-se em posição de desprezar os eleitos a ponto de compactuar com intensas ameaças capazes de levar um parlamentar a abandonar o seu mandato, em suma, evidencia a clara intenção de romper com os pressupostos de um regime democrático. E o fazem.

Para um regime democrático seria uma ignomínia que um opositor tivesse de retirar-se do país por falta de segurança, mas não para uma ditadura, não para personagens menores que tem o seu ego insuflado por ocupar a posição de submissão do império. O abandono de um mandato em face de que o representante sinta-se objetiva e diretamente ameaçado por círculos de poder ligados à Presidência da República configura a fotografia representativa a pura e bem acabada violação da democracia. Mas se ainda alguma dúvida pudesse restar sobre o sentido deste processo, o ocaso da democracia é expresso pelo fato de que nem o Presidente da República nem as superiores autoridades do Estado se manifestaram para assegurar as garantias ao Deputado Jean Wyllys – assim como tampouco estiveram em garantir a segurança da professora Débora Diniz, que igualmente abandonou o Brasil –, ao passo que não assumem a preocupação central de punir o conjunto dos que estão a ameaçar a população na figura de um de seus representantes. A posição presidencial que mescla ironia e ofensa temperada pela ameaça e o silêncio geral constitui o tecido pantanoso em que as garantias constitucionais de liberdade política francamente inexistem. Definitivamente, quem mantinha qualquer dúvida de que no Brasil não mais vigora uma democracia e nem os termos mínimos de sua Constituição, a partir de hoje, já dispõe de irretorquível carga de razões para mudar a sua avaliação.

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O Brasil foi golpeado e as eleições serviram como densa e imensa cortina de fumaça para dar aparência de legitimidade a um projeto de entrega das riquezas nacionais operado sob a farsa neoliberal, e que está a transformar a estrutura do Estado sem que as urnas tenham apoiado tal projeto que não foi apresentado durante o período eleitoral, pois o candidato não dispõe de condições intelectuais de apresentá-lo e defendê-lo. Sob este cenário a Constituição precisa ser alvo de violação, a ponto de que hoje estejamos a viver em um país que encarna as piores versões de desprezíveis ditaduras sob o tacão dos piores e mais medíocres e pacóvios homens autoritários sempre gozosamente dispostos a ocupar indigna posição de submissão ao império. Rigorosamente, o Brasil abandonou a relevância geopolítica em escala mundial que teve sob o governo do PT em que postulou e quase ocupou uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU e sob um aríete sem horizonte nem mente não foi capaz de ocupar sequer as cadeiras em que deveria conceder uma modesta entrevista coletiva à imprensa no recente Fórum Econômico Mundial de Davos. As montanhas de Davos foram mágicas para a literatura premiada de Mann, e formou o contraponto de fundo à figura ordinária daquele minúsculo homúnculo.

É preciso reanimar e revigorar o povo vilipendiado pela oligarquia a percepção de que continua dispondo de força para escolher os rumos do país, mesmo quando o seu território se encontre colonizado por forças estrangeiras atuantes por intermédio de nacionais operando como corretores das riquezas da nação entregues a preço vil. O Deputado Jean Wyllys é uma das vozes da resistência, e o seu exílio significa o corte exato e momento preciso a partir do qual já não há mais como o povo brasileiro manter a ilusão da vida sob regras democráticas posto tratar-se de um mandato político legitimamente outorgado pela população. A partir deste instante os discursos políticos pronunciados sob este pressuposto não podem ser entendidos senão como um exercício de ficção política, e nesta condição, impeditivos da reação e triunfo sobre o adverso mundo do real, que hoje se constitui orientado pela inspiração da violência política. A compreensão precede a ação.

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