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Igor Corrêa Pereira

Igor Corrêa Pereira é técnico em assuntos educacionais e mestrando em educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Membro da direção estadual da CTB do Rio Grande do Sul.

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Ter amigos é coisa de adulto?

Se você assistiu Sessão da Tarde nessa época, deve se lembrar da história dos quatro adolescentes de cidade pequena que se meteram em altas aventuras para investigar o desaparecimento de um adolescente que havia sumido na mata há mais de três dias.

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Os noticiários brasileiros e mundiais voltam a falar em rusgas entre Estados Unidos e Rússia. A mim, causa o gatilho da nostalgia, essa volta aos anos oitenta e esse clima de guerra fria. Gostava tanto quando os Estados Unidos tentava nos convencer de que era humano para competir com os soviéticos. 

Essa fase rendeu filmes que marcaram minha infância, quando a vida era mais simples e eu podia assistir Sessão da Tarde. Já que comparar Estados Unidos e Rússia voltou à moda, vou comparar aqui um filme estadunidense e um filme soviético que tratam da mesma temática. A amizade surgida na infância, mas com abordagens completamente distintas.  

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Talvez seja de valia ao leitor essa comparação, pois sabemos que na mesma medida em que é acessível a nós toda uma filmografia de Hollywood, os filmes soviéticos são pouco acessíveis. Eu mesmo só pude acessar o filme soviético que vou comentar pela iniciativa da União Municipal de Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES) que está disponibilizando em seu canal no You Tube filmes soviéticos e russos. Feita essa necessária menção, vamos aos filmes. 

O estadunidense, como falei antes, foi fartamente exibido pela Rede Globo na Sessão da Tarde nos anos noventa, quando este autor era uma criança. Trata-se do filme "Conta Comigo".  é um filme americano de 1986, do gênero drama, dirigido por Rob Reiner, que marcou a emoção de todo o guri da minha época, tendo como trilha o clássico "Stand By Me", de Ben E. King. 

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Se você assistiu Sessão da Tarde nessa época, deve se lembrar da história dos quatro adolescentes de cidade pequena que se meteram em altas aventuras para investigar o desaparecimento de um adolescente que havia sumido na mata há mais de três dias. 

A amizade dos personagens principais (Gordie Lachance, Chris Chambers, Teddy Duchamp e Vern Tessio) em sua jornada de autodescoberta nessa aventura que acompanhamos durante todo o filme, parece mais importante do que o objetivo ao qual se propõem, que é a investigação do sumiço do adolescente.  O filme soviético também fala de amigos em jornada. Mas ao invés da aventura se desenrolar na infância, ocorre na idade adulta. 

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O filme, traduzido para o português com o título "Amigos Verdadeiros", foi feito em 1954 e dirigido por Mikhail Kalatozov. A primeira cena do filme mostra os personagens na infância, em um subúrbio de Moscou. 

Os garotos (Bora, Sashka e Vaska) fazem um solene juramento de quando adultos viverem juntos grandes aventuras. Trinta anos se passam, e eles se tornam adultos bem sucedidos. Bora tornou-se o famoso cirurgião Tchizhov; Sashka, o professor de pecuária Lapin; e Vaska, o doutor em arquitetura Nestratov. Lembrando-se da promessa dada um ao outro quando crianças, eles partem em uma jangada pelo rio Volga e passam por muitas aventuras. Como falei anteriormente, os dois filmes abordam a amizade que se forma na infância. 

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Nos dois filmes, os personagens aparecem na infância/adolescência em um ambiente humilde. Mas a aventura dos personagens do enredo estadunidense ocorre na infância, e a aventura dos personagens soviéticos ocorre na idade adulta. É interessante essa diferença, e como ela é justificada em cada trama. 

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Em "Conta Comigo", a história é narrada pelo personagem Gordie Lachance já adulto. Ele também é bem sucedido. É um escritor famoso, que escreve num computador em plenos anos oitenta, para ter a ideia do quanto ele é rico. Mas o motivo pelo qual a aventura de amizade que ele narra ocorre na infância é justificado pelo próprio autor no final do filme. Ele fala que nunca mais teve amigos como os três que o acompanharam na aventura. Mas também fala que a amizade não continuou na vida adulta, que ele perdera o contato com seus amigos.

 Ao final, ele chega a conclusão que as amizades da infância são inigualáveis e impossíveis na vida adulta. O filme termina mostrando a luxuosa casa do escritor, e seus dois filhos impacientes por ele estar demorando para levá-los a alguma diversão prometida.  

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Já a trama soviética se desenrola trinta anos após a infância dos personagens. Bora, Sashka e Vaska já são adultos, e tem profissões de destaque. No entanto, nada disso pareceu um empecilho para que pudessem se encontrar e viver a aventura que haviam jurado na infância. Ou seja, neste filme, ser adulto não parece incompatível com ter amigos e viver essas amizades. 

No percurso de sua travessia do Rio Volga, os amigos se encontram com uma União Soviética em construção, exalando alegria em festas da classe operária pelo cumprimento de metas de produção, e se deparando com as contradições desse processo, que se manifestam em burocratas descolados do interesse dessa classe. A jornada serve para que os personagens não só fortaleçam seus laços de amizade, mas também compreendam melhor sua própria integração naquela sociedade em transformação.  E

ssa comparação entre as duas obras cinematográficas permite revelar como a amizade pode ser vista no mundo capitalista e no mundo socialista? Eu desconheço a sociedade do lado de lá da muralha de ferro, por isso não consigo responder essa pergunta. Mas conheço um pouco como o capitalismo pauta as relações e afetos humanos aqui no fim do fundo da América do Sul. A obra "Conta Comigo" não fala nada que seja estranho a nossa forma social de viver as amizades. 

Vamos olhar nossas vidas, olhar ao redor. Quantos de nós podem efetivamente viver suas amizades na vida adulta? A amizade é considerada sim uma coisa infantil, imatura. Ser adulto tem a ver com ter uma família tradicional, um emprego. Isso em geral é quase incompatível com manter amigos de infância. Passamos a nos relacionar com os colegas do trabalho, quando muito. 

Com os amigos em comum de nosso companhia amorosa. Com os pais dos nossos filhos, se os tivermos. Mas raramente temos tempo ou mesmo vontade para nutrir laços de afeto que não sejam ligados diretamente a vida que vivemos no presente. Isso muitas vezes acaba por nos afastar dos afetos que vivemos antes da vida adulta.  

Assistir o filme soviético mostrando três personagens adultos que param toda a sua vida profissional simplesmente para viver uma amizade de infância foi uma experiência revolucionária. 

Quando o extraordinário se torna cotidiano, então é a revolução, nos ensinou Che Guevara. Talvez eu não veja transformações profundas na sociedade ao longo da vida. Mas eu gostaria de morar num país onde a amizade fosse mais importante. Uma sociedade que permitisse usar nosso tempo simplesmente sendo amigos de nossos amigos. 

Como é triste ter que aceitar a normalidade de que ter amigos não combina com ser um adulto bem sucedido.

 É triste, mas não tem que ser visto como normal. Cabe a nós também fazer esses exercícios de desnaturalizar o que é normal. Por que mesmo que tem que ser assim? Por que temos que associar a maturidade com a separação dos amigos?

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