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Paulo Moreira Leite

Colunista e comentarista na TV 247

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TRF-4 quer transformar o Brasil numa grande Honduras?

“Caso o TRF-4 mantenha a condenação de Sérgio Moro contra Lula, estará contribuindo para transformar o Brasil numa republica gelatinosa, onde funciona uma democracia de resultados onde o voto popular só é preservado quando interessa a quem controla o Estado”, escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247. “A democracia de Honduras nunca mais foi restaurada após o golpe de 2009, laboratório para deposição de Dilma em 2016”. PML lembra que uma condenação de Lula, sem provas, representará “a falta de legitimidade do sistema político em seu ponto máximo, contribuindo para alimentar o cinismo e desfazer qualquer ilusão que a maioria dos brasileiros possa ter sobre a isenção do Judiciário”

“Caso o TRF-4 mantenha a condenação de Sérgio Moro contra Lula, estará contribuindo para transformar o Brasil numa republica gelatinosa, onde funciona uma democracia de resultados onde o voto popular só é preservado quando interessa a quem controla o Estado”, escreve Paulo Moreira Leite, articulista do 247. “A democracia de Honduras nunca mais foi restaurada após o golpe de 2009, laboratório para deposição de Dilma em 2016”. PML lembra que uma condenação de Lula, sem provas, representará “a falta de legitimidade do sistema político em seu ponto máximo, contribuindo para alimentar o cinismo e desfazer qualquer ilusão que a maioria dos brasileiros possa ter sobre a isenção do Judiciário” (Foto: Paulo Moreira Leite)
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Nesta quarta-feira, quando o TRF-4 der início ao julgamento da sentença de Sérgio Moro que condena Lula a 9 anos e meio de prisão, o país estará diante de uma rota de passagem que leva a dois destinos. Tanto pode reforçar uma ditadura a partir da tutela do Judiciário, como abrir caminho para um retorno necessário à democracia, com respeito absoluto pelas eleições marcadas para outubro de 2018.

Neste momento, não deve haver dúvida sobre uma questão. O simples risco de que Lula venha a ser impedido, por decisão judicial, de disputar uma eleição para a qual é o grande favorito já coloca a falta de legitimidade de nosso sistema político no ponto máximo.  Envolve o mais popular presidente da história da República, o homem público que abriu, para as grandes maiorias, as portas de um sistema oligárquico e fechado. Não é difícil compreender que um ataque dessa natureza irá abrir caminho para candidaturas que dificilmente escaparão da condição de origem, como fantoches beneficiários de uma escolha resolvida fora das urnas e da Lei, permanecendo assim na posição de reféns de forças que conspiram de modo permanente contra a soberania popular.

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A perspectiva, neste caso, é de uma gelatinosa democracia de resultados, que aceita a voz das urnas quando convém, mas recorre ao tapetão e a truculência quando lhe faltam votos. O exemplo típico dos tempos atuais é Honduras, a pequena república da América Central -- 5% da população brasileira, PIB na mesma proporção -- que até hoje não se recuperou da ruptura institucional de 2009 – o primeiro laboratório que levou ao impeachment sem crime de responsabilidade de Dilma em 2016, quando um presidente constitucional foi levado ainda de pijamas para fora do país.

Há um mês, após um pleito que institucionalizou uma fraude escancarada contra uma vitória da frente de oposição a ditadura, a repressão aos protestos implicou em 34 mortes denunciadas pela oposição, o embarque de lideranças a caminho do exílio e violência contra jornalistas.

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Num ambiente que os brasileiros experimentam desde a posse de Michel Temer, a população que sobrevive e abaixo da linha de pobreza cresceu -- 3,1% apenas no último ano. A desmoralizante falta de escrúpulos também é notória.

Se há sete anos Manoel Zelaya foi deposto sob acusação, nunca demonstrada, de manobrar para disputar a reeleição, proibida pela Constituição do país, o presidente atual, conhecido pelas iniciais JOH, operou na Suprema Corte reconfigurada pelo o golpe pelo direito de disputar um segundo mandato consecutivo.

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Outra avaliação possível do drama brasileiro envolve a perseguição a Lula e a caçada a Juscelino Kubitschek em 1964. Já debati as semelhanças e diferenças entre os casos num texto anterior. Para a discussão de hoje, cabe registrar uma diferença fundamental.

JK apostou todas as fichas numa negociação com o novo regime. No Congresso, chegou a pedir votos a favor do Marechal Castello Branco logo após a queda de Goulart.

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Lula decidiu unir sua candidatura à luta pela democracia, o que transforma sua campanha numa resistência de massa, com apoio nos comitês e impulso nas caravanas.

JK foi cassado num golpe único, uma decisão do Comando Militar.  

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Apoiado na mobilização popular, Lula planeja ir até o fim, recurso após recurso, até o momento da eleição. A consciência de uma população que o define como melhor presidente da história garante apoio do povo nessa aposta. 

Sabemos que já em 2004 – apenas um ano depois da posse de Lula no Planalto --, quando escreveu o artigo “Considerações sobre Manni Pulitti,” a operação judicial que revirou a política italiana de 1990, Sérgio Moro especulava sobre a possibilidade de se produzir uma ação semelhante no Brasil. Naquele momento -- antes do Bolsa Família, do pré-Sal, de três reeleições inéditas de Lula-Dilma na maioria dos países  democráticos -- o artigo estimulava a necessidade de “deslegitimação do sistema político brasileiro”, como observei aqui (21/1/2015).

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Não era difícil imaginar que uma operação semelhante fosse ocorrer no Brasil e era até fácil encontrar quem ficasse animado com possíveis resultados. 

Mas não era aceitável permitir que a “forma horrenda de populismo” praticada pela Lava Jato, na definição do mestre italiano Luigi Ferrajoli, um dos grandes juristas do planeta, tivesse apoio na cúpula do Judiciário, colocando de pé um descalabro institucional que implica em novo ataque à democracia.

No país de olhos voltados para o TRF-4, a exclusão antecipada do candidato que hoje reúne a maior porção das intenções de voto dos brasileiros implica em pré-definir o resultado da eleição, numa decisão que ignora a liberdade e o direito de escolha.

Tudo será definido por uma sentença jurídica que, se for aprovada, só irá contribuir para alimentar o cinismo e desmontar qualquer a ilusão que os brasileiros possam cultivar sobre a isenção do sistema judiciário e sua capacidade de assegurar formas de vida mais elevadas, de acordo com nosso grau de civilização.

Sempre preciso em suas preocupações com o Brasil, que estuda desde a carta de 1988, Ferrajoli também dia que “estamos diante de uma patológica gravíssima, que é a jurisdição de exceção”.

Uma das vozes mais ativas e respeitadas no debate Judiciário, o professor Lenio Streck, procurador aposentado, refere-se à máquina que pretende passar Luiz Inácio Lula da Silva no moedor de carne nos seguintes termos: " jurista lava-jato funciona como o novo tipo-ideal do Direito: aponta o culpado e depois sai buscando narrativas (pós-verdades) para cobrir o gap entre o fato e a versão construída finalísticamente”.  

Quem aguardava pela exibição da prova de recebimento de propina a Lula é obrigado a reconhecer que o último fiapo que poderia ligar seu patrimônio à Lava Jato foi para o lixo depois que a juíza Luciana de Oliveira, de Brasília, determinou a penhora do triplex do Guarujá pela OAS.

A certeza de que a sentença foi construída a partir de um recurso retórico enganoso, as falácias, técnica narrativa que desde a Grécia Antiga ajuda a transformar o falso em verdadeiro, está bem demonstrada pelo professor Euclides André Mance, que lecionou Filosofia na mesma Universidade Federal do Paraná onde Sérgio Moro dá aulas até hoje.  De volta ao tema essencial em discussão – a propriedade – o professor afirma que, em vez de afirmar de forma categórica aquele crime pelo qual Lula deve ser condenado, corrupção, Moro refere-se a propriedade do imóvel em termos vagos, impróprios para quem deve ser condenado a 9 anos e meio de prisão, como “disponibilizar, conceder, atribuir”.  

É inegável que o peso de críticas objetivas a Lava Jato atingiu tal profundidade que, mesmo no plano retórico, seus protagonistas e aliadas se atrapalham, exibindo fraquezas e contradições que seria preferível evitar.

Respondendo a um questionamento da defesa de Lula que envolvia pagamentos de suborno da OAS em função de operações na a Petrobras, o próprio Sérgio Moro deu uma resposta que coloca em dúvida a essência das acusações: "Este juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela construtora OAS nos contratos da Petrobras foram usados para pagamento indevido para o ex-presidente”.

Quando se descobriu que o triplex do Guarujá fora penhorado, medida que coloca uma intransponível barreira jurídica entre o imóvel e o patrimônio de Lula, o colunista Merval Pereira, do Globo, saiu em defesa de Moro com o seguinte argumento: “a acusação contra o ex-presidente não é de que a propriedade formal seja dele. Ao contrário, ele seria o proprietário de fato, e essa situação é encoberta através de artifícios justamente para esconder o produto de um crime. Por isso está sendo condenado também por lavagem de dinheiro”.

O argumento poderia fazer sentido se estivesse acompanhado por outros elementos. Um eventual “contrato de gaveta”, acerto informal pelo qual a propriedade de Lula estaria assegurada. Ou se o argumento fosse acompanhado por um rastreamento de contas capaz de corroborar uma suspeita. Sem tais elementos, o que se tem é uma hipótese de trabalho, que precisa investigada e comprovada antes de punir pessoas inocentes.   

Essa é a diferença.

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