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Nívea Carpes

Doutora em Ciência Política e mestre em Antropologia Social

27 artigos

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Uma esquerda acanhada

Por que, depois de todos os acontecimentos dos últimos anos no Brasil, a esquerda ainda foge de apresentar uma proposta clara de funcionamento do Estado e das suas instituições?

Uma esquerda acanhada
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A competência de convencimento do capitalismo que captura a alma, os sentidos, os desejos e a razão do indivíduo é inegável. Da mesma forma que a enorme massa de convertidos oferta sua energia de vida a fazer o projeto capitalista ter a dinâmica a que se propõe, pouco se questiona sobre a debilidade dos resultados obtidos. Nesse sentido, também pouco discutimos sobre o modelo de Estado burguês que se coloca em prática, primando cada vez mais ganhos financeiros do mercado virtual, aquele mercado que não reverte em produtos que se direcionem em benefício da vida cotidiana da população em geral. Mesmo assim, o processo segue, cada dia mais feroz.

Em decorrência disso, no Brasil, parte da sociedade coloca-se à disposição de um não projeto, em termos sociais, ao eleger Bolsonaro, não encontrando qualquer proposição na direção de reduzir as taxas de desemprego, nada que se proponha a diminuir o endividamento das pessoas e nem se fala em aquecimento de mercado interno, ficando apenas em problemas que afetam diretamente a saúde financeira do cidadão. E não é uma exclusividade da campanha para o governo federal, também nos níveis estadual e municipal, políticos elegem-se propondo economia e redução de gastos, sem que a população relacione os impostos que paga com um retorno, através de bons serviços prestados pelo Estado. Cada dia é mais comum encontrarmos quem afirme que o Estado nada deveria oferecer além de uma estrutura mínima, entregando todas as necessidades que movimentam uma sociedade à dimensão privada, inclusive áreas estratégicas. Estaríamos voltando a pagar o rei por viver nas suas terras?

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A aderência a esse discurso deixa claro que a imersão na lógica existencial capitalista impede a reflexão como perspectiva crítica ao seu funcionamento, uma vez que o bombardeio massivo de suas ideias é incessante, sem que se permita espaços de questionamento. O dia a dia é invadido por marketing de consumo, por mídia uníssona e por entretenimento alienante eivado de preconceitos, um pacote de acomodação e reprodução diária das condições necessárias à manutenção desse modelo econômico que se define nas demais dimensões da vida. Com essa configuração, as populações estão expostas a um contexto que se impõe roubando subjetividade e tempo, o que é essencial para sua manutenção.

Diante deste triste quadro, não seria papel das esquerdas assumir o discurso de um modelo de Estado, fazendo proposições claras nesse sentido? Não precisamos estabelecer uma agenda própria, fugindo da agenda ditada pelo stablishment, que nos impede de colocar em questão o modelo de Estado a que estamos submetidos? Não seria de nos questionarmos sobre por que as direitas estão à vontade para propor um Estado mínimo que parece bem aceito por muitos dentro da sociedade, enquanto mantemos o melindre de sermos interpretados como revolucionários? Discutir o modelo de Estado, reposicionando as prioridades dentro dessa estrutura, não permitiria aos cidadãos compreender o confronto objetivo de proposições?

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Estamos em cheque pela conquista de espaço do fascismo no Brasil. Perdemos tempo quando não produzimos oportunidades para a consciência de classe quando se pôs em obra um projeto político popular. Além de termos aprendido que o flerte com dimensões que nunca aceitarão os estratos da base social dentre as prioridades do Estado serviu apenas para desviar a rota. O empresariado, o agronegócio, os financistas, os profissionais liberais e as classes médias liberais e fascistas estão nos levando ao encontro de um projeto para 20% da população, com apoio dos próprios prejudicados.

Por que, depois de todos os acontecimentos dos últimos anos no Brasil, a esquerda ainda foge de apresentar uma proposta clara de funcionamento do Estado e das suas instituições? Por que aceitamos a destruição dos partidos sem confrontar com um discurso que demonstre a importância de se exercer democracia através de partidos? Por que a esquerda vai ficando acanhada em seus posicionamentos, quando do outro lado já chegaram às armas?

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Se Gramsci estivesse vivo seria incisivo cobrando-nos um projeto claro de Estado, cobrando-nos convencimento dos trabalhadores, cobrando-nos o investimento nos intelectuais orgânicos capazes de colocar em movimento as ideias de esquerda e cobrando-nos a criação de ferramentas eficientes para a disputa direta das narrativas, recursos sem os quais não consolidaremos outro modelo de sociedade.

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