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Jeferson Miola

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Villas Bôas mostra Exército como facção partidária antipetista

"As Forças Armadas brasileiras, em especial o Exército, se arvoram o direito de tutelar as instituições civis e o sistema político, participando diretamente da atividade político-partidária como se fossem um partido político", escreve o colunista Jeferson Miola sobre a confissão do ex-comandante do Exército

(Brasília - DF, 13/12/2018) Palavras do Comandante do Exército, General-de-Exército Eduardo Villas Bôas. (Foto: Marcos Corrêa/PR)
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A confissão do general Villas Bôas sobre o ultimato do Alto-Comando do Exército à Suprema Corte para impedir ilegalmente a liberdade e a candidatura presidencial do Lula em 2018 é acompanhada de revelações que evidenciam a deturpação da atuação do Exército.

A geração de generais no comando nos últimos anos, originária das turmas AMAN 1971 a 1980, se caracteriza pela atividade conspirativa e pela condução do Exército não como instituição permanente de Estado, mas como um órgão faccional, politizado e partidarizado.

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O livro-confissão “General Villas Bôas: conversa com o comandante” [Celso Castro/FGV, 2021] evidencia a intoxicação do Exército Brasileiro pelo pensamento reacionário, antipetista e ultraliberal.

A Intentona Comunista [1935] é um fantasma cultivado por quase um século na formação das sucessivas gerações militares. “Esse episódio foi determinante para a consolidação do sentimento anticomunista entre os militares” [pág. 160], reconhece Villas Bôas.

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O general distorce a história do golpe de 1964 para encobrir a intervenção inconstitucional das Forças Armadas na escalada da ditadura. Ele diz, cinicamente, que com as agitações sociais do início dos anos 1960, “sob o pano de fundo da Guerra Fria, mais uma vez, a esquerda empurrou os militares para uma postura anticomunista” [pág.161].

Para os guardiões armados da dominação capitalista, o antipetismo é a versão contemporânea do embolorado anticomunismo. Villas Bôas não esconde que “O sentimento antipetista era principalmente dirigido ao ex-presidente Lula” [pág. 217].

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Invocando o poder arbitrário de substituir a soberania do voto, o general acusa Lula com grosseria: “Ele cometeu um grande estelionato com a população, que havia depositado as esperanças nas suas propostas. […] Ele, pessoalmente, produziu uma derrocada material. Contudo, o mais sério foi a destruição moral do país. Em suas manifestações constata-se que se manteve inalterado o descompromisso para com a verdade” [pág. 217].

Villas Bôas diz que “havia uma forte rejeição ao PT” [pág. 218], e que houve “o crescimento de um sentimento até de aversão ao partido” [pág. 177]. Colocando-se outra vez como o árbitro – ou o tutor – da democracia com poder de substituir o voto popular, ele pretexta a corrupção, a situação econômica e a Comissão Nacional da Verdade como motivos para golpear o PT [pág. 177].

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O sentimento de rejeição e aversão a Lula, também constatado na perseguição obcecada do Moro, Deltan e Globo, é uma barreira instransponível para os militares; uma linha da qual não aparentam estar dispostos a recuar tão cedo.

Indagado se o Exército aceitaria a volta do PT ou do Lula, a resposta do general pode ser um mau presságio sobre a decisão do STF, tutelado pelos militares, acerca da suspeição do Moro e da devolução dos direitos políticos sequestrados do Lula: “Quando converso com pessoas de esquerda, questiono até quando o PT vai se manter aferrado à defesa de Lula” [pág. 218].

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Como que prenunciando uma nova ruptura em 2022 caso não garantam a continuidade do projeto fascista-militar mesmo numa eleição que poderá ser por eles fraudada, Villas Bôas avisa, com o costumeiro tom de ameaça disfarçado de cordialidade: “Me preocupa uma eventual volta ao poder pela esquerda e que ocorra o que disse Tayreland sobre os Bourbon: ‘Não aprendem e também não esquecem’” [pág. 158].

A pergunta que se faz é se, numa eventual volta da esquerda ao poder, esse pensamento subjacente [a respeito do Exército] não poderá vir à tona e materializar-se na forma de ações concretas”, disse ele [pág. 176].

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Na descrição elogiosa que faz da carreira, do modo de vida e da “cultura” castrense, Villas Bôas enaltece a “família militar”, o ambiente e os laços de camaradagem e destaca o que considera ser a “excelência” da formação [sic], com especial reconhecimento do papel da AMAN.

Estas menções, muitas delas frívolas, têm enorme valor etnográfico, pois ajudam a decifrar a subjetividade da instituição militar enquanto organização política complexa e singular.

O processo de formação nas escolas militares é uma vivência significativa porque enseja “o estabelecimento de laços de camaradagem desde o início das carreiras” [pág. 174].

Os companheiros de turma vivem nos mesmos “aglomerados de prédios”, “intensificando as amizades entre as famílias e a camaradagem nas intensas atividades de instrução” [pág. 68]. “Ademais, tratar com camaradagem os irmãos de arma e com bondade os subordinados faz parte do primeiro juramento prestado quando se ingressa no Exército” [pág. 147].

A condição de camaradas, amigos, companheiros e partidários é um valor muito cultuado pelo general no livro. Citando o general Cardoso, ele sobrevaloriza: “camaradagem é tão importante que deveria constar da Constituição Federal” [sic] [pág. 74]. Para ele, a camaradagem precede até mesmo “os comprometimentos para com a instituição Exército”; e, também, “os comprometimentos endereçados aos valores da profissão militar” [pág. 74].

A AMAN funciona como a fábrica do cimento ideológico e doutrinário das gerações que se sucedem no comando do Exército a partir da mesma matriz de pensamento. “É desnecessário dizer que aí [na AMAN] se forjam fortes e duradouros laços de camaradagem. Com os cadetes das turmas de 1978 e de 1981, tive a satisfação de ter ombreado alguns deles no Alto-Comando do Exército durante meu período à frente da Força” [pág. 67], disse ele.

As Forças Armadas brasileiras, em especial o Exército, se arvoram o direito de tutelar as instituições civis e o sistema político, participando diretamente da atividade político-partidária como se fossem um partido político.

Além da conspiração para derrubar a presidente Dilma e manter a prisão ilegal do ex-presidente Lula, generais da reserva e da ativa coordenaram a campanha do Bolsonaro. Villas Bôas confessa com espantosa naturalidade que “o pessoal da reserva e uma parcela importante da família militar tomava parte” das manifestações de rua contra o PT [pág. 189].

A filha do general Villas Bôas, Adriana Haas Villas Bôas, por exemplo, nomeada em cargo de confiança de mais de 10 mil reais no ministério bolsonarista de Direitos Humanos, foi fervorosa militante da campanha do Bolsonaro nas redes sociais: “#HaddadNão”; “#PTNão”, “Presidiário mandando em um país.. só por que é do PT, né?” etc, escreveu ela.

Como órgão armado de defesa do Estado que deveria assumir a missão profissional exclusiva de proteger as fronteiras e a integridade do país contra agressões externas, o Exército jamais poderia se envolver na política, que é o território de resolução dos conflitos e das contradições sociais pelas palavras, pelo convencimento e pela hegemonia, mas não pela imposição das armas.

Em que pese o Brasil possuir a extravagante quantidade de mais de 60 partidos políticos registrados, no livro-confissão Villas Bôas cita somente o PT! E numa perspectiva antipetista. No calhamaço de 301 páginas, não há uma única menção a nenhum outro partido político; menos ainda veto, rejeição e aversão como Villas Bôas menciona em relação ao PT.

Villas Bôas melhor teria feito à sua biografia, à dignidade e à honradez que não teve no cargo que lhe foi confiado pela presidente Dilma, se tivesse levado a sério a opinião que ele diz ter recebido de um interlocutor de esquerda: “Ouvi de um deles que Lula era a única pessoa com o poder de unificar o país” [pág. 218].

Villas Bôas, porém, como comandante do Partido Militar, optou pela barbárie, e jogou o Brasil no precipício em que o país se encontra.

Este exército é incompatível com a democracia e com o Estado de Direito, e absolutamente inepto para a defesa da soberania nacional. Não é razoável que o povo brasileiro sofra sérias privações enquanto destina mais de R$ 110 bilhões por ano do orçamento nacional para sustentar forças armadas partidarizadas, que traem o país e oprimem o próprio povo que o sustenta.

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