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Brasil

Ambientalistas preocupados: 'guru ambiental' de Bolsonaro aprova exploração estrangeira na Amazônia

Tido como "guru ambiental" do presidente Jair Bolsonaro, o engenheiro agrônomo Evaristo Eduardo de Miranda, diretor da Embrapa Territorial, disse à Sputnik Brasil nesta sexta-feira (26) ver com bons olhos o anúncio feito pelo ex-capitão a respeito da abertura da biodiversidade brasileira para a exploração em parceria com estrangeiros

Jair Bolsonaro em Manaus - AM em encontro com indígenas.
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Sputnik Brasil - Tido como "guru ambiental" do presidente Jair Bolsonaro, o engenheiro agrônomo Evaristo Eduardo de Miranda, diretor da Embrapa Territorial, disse à Sputnik Brasil nesta sexta-feira (26) ver com bons olhos o anúncio feito pelo ex-capitão a respeito da abertura da biodiversidade brasileira para a exploração em parceria com estrangeiros.

Um dia antes, em Manaus, Bolsonaro declarou que o país está pronto para conversar com países que estejam dispostos a explorar a biodiversidade em parceria com o Brasil. E neste cenário a Amazônia aparece como a "joia da coroa" da riqueza natural nacional.

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"Tenho mostrado, falado para o mundo, que qualquer país que por ventura queira, em parceria, explorar a nossa biodiversidade, estamos prontos para conversar com esses países. Tenho dito a mesma coisa em relação à exploração mineral", afirmou Bolsonaro em discurso de abertura da reunião da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa).

À Sputnik Brasil, Miranda declarou considerar o anúncio do presidente "excelente", uma vez que poderá estimular o ambiente acadêmico de pesquisa, hoje "quase impossível" de se trabalhar devido ao que ele chamou de excesso de regras e burocracia que transformam pesquisadores em "criminosos" no Brasil.

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"Vou dar só um exemplo: se você vai fazer uma pesquisa na Amazônia para procurar plantas de interesse, você tem que dizer antes que plantas você vai pesquisa. Aí você fala: como é que eu posso dizer que eu vou pesquisar se eu estou indo para lá justamente para descobrir alguma coisa? Como é que eu posso dizer de forma antecipada o que eu vou coletar?", declarou.

O anúncio de Bolsonaro nesta semana não é uma novidade. Em abril, o presidente brasileiro revelou que tratou do tema da exploração da biodiversidade brasileira – e mais especificamente da Amazônia – em sua primeira visita oficial aos Estados Unidos, quando se encontrou com o presidente Donald Trump.

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"Quando eu conheci Trump, eu disse a ele, entre outras coisas, que eu quero abrir para eles explorarem a Amazônia em uma parceria", revelou Bolsonaro em uma entrevista à rádio Jovem Pan.

Para o diretor da Embrapa Territorial, a ideia de Bolsonaro visa romper com os últimos 15 anos, quando, de acordo com ele, houve uma burocratização das pesquisas acerca da biodiversidade no país "em nome do combate à biopirataria", o que derrubou as pesquisas na bacia Amazônia, ao passo que países vizinhos teriam crescido no mesmo período.

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"Nós somos incapazes de trazer todo esse conhecimento, toda essa troca de recursos, até porque para você chegar em uma molécula você gasta US$ 5 milhões, US$ 10 milhões. Isso aí a gente perdeu, temos um atraso nos últimos anos nisso muito grande", avaliou Miranda, que ainda ironizou que, ainda hoje, a ciência brasileira lida mais com "bioadversidade" do que com biodiversidade.

"Nós vamos ganhar muito. Nós vamos ganhar em esforço conjugado, vamos chegar a resultados muito mais rápidos, vamos ter o poder para tratar dessas coisas, enfim, transformar isso em riqueza e benefício para a população da Amazônia, então a notícia é muito boa. E eu vi o próprio ministro [da Economia Paulo] Guedes dizer como ajudar para que Manaus se torne realmente um local dessa temática em torno do carbono, da biodiversidade, e você avançar muito lá", previu.

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Miranda é o autor do livro 'Tons de Verde', editado com apoio de 15 instituições do agronegócio, segundo informações da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), também conhecida como Bancada Ruralista. Ele é chamado de "guru ambiental" de Bolsonaro porque o presidente, seus filhos e aliados utilizam dados da publicação para defender que "o Brasil é o país que mais preserva o meio ambiente", algo desafiado por pesquisadores e ambientalistas, e desmentido por dados oficiais.

Desconfiança e preocupação de ambientalistas

Em outra frente, o anúncio de Bolsonaro trouxe preocupação aos ambientalistas. Ouvido pela Sputnik Brasil, o geógrafo Miguel Scarcello, secretário-geral da ONG SOS Amazônia, afirmou que a iniciativa do governo deve ser vista com bastante atenção, destacando que é preciso conhecer os detalhes sobre como seria essa parceria com outros países.

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"A intenção de fazer uso da biodiversidade para fins econômicos já é uma intenção antiga não só deste governo, mas os outros já tinham [feito] esse aceno, tanto que foram construídas as estruturas de pesquisa lá em Manaus para isso, mas não evoluiu. A gente sabe que há um potencial econômico enorme, mas fazer isso exige muita precaução, muito planejamento, muita integração com as comunidades locais, com os governos locais, para que o que venha a ser feito e desenvolvido em matéria de se explorar recursos naturais ou desenvolver produtos com base tecnológica para que sejam meios ou matéria-prima para outros produtos em escala em outros países, é preciso que a sociedade tenha clareza em como será feito isso. Tem que ter um ordenamento jurídico claro", analisou.

Scarcello citou os EUA, a Inglaterra, a China, o Japão e a Alemanha como países que teriam o conhecimento tecnológico para desenvolver ativos com a rica biodiversidade amazônica, com claros fins econômicos, segundo o ambientalista. Ele alertou, porém, que há riscos para os quais o Brasil precisa se atentar antes de fechar qualquer parceria neste sentido.

"Não acredito na visão que o presidente esteja defendendo fazer a [simples] exploração, explorar e recolher produtos da floresta por extrair, em quantidade para fazer cosmético, como é hoje a produção extrativista. É mais para você se apropriar e ter conhecimento químico e biológico do que as espécies têm. Então, eu acho que a gente tem de estar muito atento a como será a apropriação desses princípios que vão ser identificados nessas plantas, que provavelmente serão pesquisadas e exploradas", comentou.

"Os grandes países estão de olho é nisso, e isso vão ser ativos para outros produtos, porque a grande indústria é a da biodiversidade no futuro, para ter mais remédios, mais produtos químicos, drogas finas, de fato como é hoje, a maior parte delas é retirada de vegetais. Há muitos vegetais na Amazônia que não se conhece", acrescentou.

O secretário-geral da ONG SOS Amazônia também ressaltou a importância da participação da sociedade civil no processo de construção dessas parcerias exploratórias da biodiversidade brasileira, relembrando que muito do que se sabe a respeito de espécies da Amazônia repousa nas comunidades tradicionais da região, como os indígenas.

"Quanto desse lucro vai para eles [indígenas]? É para isso que temos de estar atentos, sabe? Porque nem o Brasil mesmo, quando os pesquisadores brasileiros vão a campo para encontrar plantas medicinais, eles vão a partir disso, desse conhecimento tradicional, seja de povos indígenas ou de outros povos tradicionais que sejam da região, que viveram aqui há anos, séculos, e que foram identificando nessas plantas o uso mais apropriado. Não reconhecer isso é um problema, é muito grande, na nossa legislação já está mencionado que é preciso haver esse reconhecimento e pagar às comunidades por esse serviço, para que não exista esse roubo, de geração de patentes, de produtos que tradicionalmente são usados e com os quais se ganha muito dinheiro dentro da propriedade dessas patentes", ponderou.

Desenvolvimento x preservação

O debate sobre o desenvolvimento sustentável e a preservação do meio ambiente no Brasil é anterior ao governo Bolsonaro, mas segue causando divisões. No presente, o cenário tem ruralistas de um lado, e ambientalistas de outro. Em comum, ambos se mostram contrários a uma desregulamentação total da exploração da Amazônia.

"Não é desregulamentação no sentido absoluto, mas você ter [cuidados ambientais] como em outros lugares, e não partir para isso. Muitas pessoas podem falar sobre esse tema, não é a minha especialidade, acompanho e vejo drama de colegas que foram multados pelo Ibama, que estão sendo processados em uma coisa que parece ser uma casquiana (piada). É inacreditável que pessoas sejam submetidas a isso no Brasil", disse Evaristo Eduardo de Miranda.

O diretor da Embrapa Territorial reproduziu um discurso proferido antes pelo próprio Bolsonaro, criticando o fato da Amazônia ser rica em minérios e não ser possível que o país usufrua de tais riquezas, tudo por culpa da legislação. Além das parcerias com estrangeiros, o presidente quer legalizar os garimpos na região, outro tema que causa polêmica.

"Eu acho que essas coisas têm que passar por gente que entende, gente que é do ramo, pesquisadores mesmo, com apoio jurídico, com apoio institucional, e isso não é feito assim. E isso pode entrar no âmbito de outros acordos de cooperação que nós já temos. Sugestões para isso existem, e programas já existem de trabalhos conjuntos, mas agora eles podem ser nitidamente, se o governo deseja isso, serem desburocratizados", afirmou.

"Tem bons centros de pesquisa já na Amazônia e a gente vê alguns deles com muita dificuldade, desatualizados em termos de equipamentos e laboratórios. Pode ser que isso traga uma ação para todos, e eu tenho certeza que tanto a ministra da Agricultura, quanto o ministro de Ciência e Tecnologia e o ministro do Meio Ambiente, em particular a nossa ministra Tereza Cristina, são capazes de levar isso adiante com muita responsabilidade, mas sendo e buscando a efetividade e o benefício à população brasileira, em particular àquela que vive na Amazônia", completou o engenheiro agrônomo.

Já para Miguel Scarcello a preocupação com o formato de tais parcerias permanece, sobretudo diante da postura do governo Bolsonaro a respeito de temas ambientais, seja questionando o aquecimento global – como já o fez o chanceler Ernesto Araújo –, ou sendo acusado pelo desmonte de órgãos de fiscalização, crítica voltada ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

"Acho que essa forma de como a coisa vai acontecer é que nós temos de estar muito atentos, e que eu acho que o governo brasileiro tem que permitir que exista um espaço para a população, para setores da ciência, pesquisadores e da sociedade civil, das comunidades tradicionais, se posicionem, saibam como vai ser isso, como vai se estabelecer. O que me preocupa é não haver mais espaço de diálogo e discussão, de diálogo, para se chegar a um denominador comum para se saber como será feita essa exploração. Esse é o problema", opinou.

O ambientalista também espera que, definidos os regramentos e bases jurídicas e garantidas as remunerações às populações locais, é preciso que a sociedade exija a devida transparência a respeito das eventuais parcerias que venham a ser fechadas. Só assim, segundo ele, será possível atestar benefícios reais ao país como um todo.

"Depois de patenteado e, dependendo de quem for o proprietário da patente, o benefício vai ficar mais para eles do que para que originalmente tinha o conhecimento. Então a gente tem de estar resguardado nesse aspecto. E acho que, para que isso possa funcionar de maneira a resguardar ao que falei, é criar um espaço público, um ambiente, um conselho, em que haja participação da sociedade, do governo e dos atores interessados, para que se estabeleçam essas regras, que se construa uma normativa que garanta benefícios para a sociedade brasileira, não só para as empresas, mas sim para quem vive nessas comunidades, com essa floresta e que sabem a importância que os vegetais, as espécies e os recursos naturais têm, porque, como falei antes, é a partir desse conhecimento que vai haver exploração de recursos naturais na Floresta Amazônica", finalizou o secretário-geral da ONG SOS Amazônia.

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