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Brasil instaurou 155 inquéritos com base na Lei de Segurança Nacional em 20 anos, 26% deles com Bolsonaro

Apenas nos últimos 18 meses foram abertos 41 inquéritos com base na LSN, 26 em 2019 e 15 no primeiro semestre de 2020

Sede da Polícia Federal em Brasília (Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
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Igor Carvalho, Brasil de Fato - No dia 15 de junho, o ministro da Justiça, André Mendonça, pediu à Polícia Federal e à Procuradoria-Geral da República que investiguem o jornalista Ricardo Noblat com base na Lei de Segurança Nacional (LSN), por ter publicado uma charge do cartunista Renato Aroeira. A medida, que foi criticada por diversas entidades, tem sido cada vez mais comum no Brasil.

Dados da Polícia Federal, obtidos através da Lei de Acesso à Informação (LAI), via coletivo Fiquem Sabendo, mostram que nos últimos 18 meses foram abertos 41 inquéritos com base na LSN, 26 em 2019 e 15 no primeiro semestre de 2020. De janeiro de 2000 até 7 de junho de 2020, o Estado brasileiro instaurou 155 processos para investigar possíveis violações da lei. Em 2018, o expediente foi utilizado por 19 vezes, o recorde anterior.

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A atribuição de apurar os crimes determinados na LSN é da Polícia Federal, que pode ser provocada pelo Ministério Público Federal, o Supremo Tribunal Federal (STF) ou o ministro da Justiça. Marcelo Uchôa, doutor em Direito Constitucional e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), lembra que a lei foi criada ainda no período militar (1983) e que garante a “blindagem de autoridades públicas."

“É um absurdo que estejamos naturalizando isso. Do ponto de vista da esquerda, eu vejo muita gente comemorando o enquadramento de deliquentes como a Sara Winter na LSN, isso é um erro. Mais do que nunca, temos que denunciar essa lei. Aliás, uma lei quase morta passou à sobrevida, uma lei que tem em seu DNA a perseguição contra a oposição política”, afirma o jurista.

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Na manhã de 15 de junho deste ano, a Polícia Federal fez cumprir um pedido de prisão temporária expedido pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes, contra a bolsonarista Sara Fernanda Giromini, também conhecida como Sara Winter, no âmbito do processo que corre na Suprema Corte para apurar a organização de atos antidemocráticos. O magistrado emitiu o mandato com base na LSN.

Em setembro de 2019, o ex-ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro, Sérgio Moro pediu que a Polícia Federal usasse, também, a LSN para abrir um inquérito contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, após o petista afirmar, em um vídeo divulgado em suas redes sociais, que o governo atual seria “miliciano”:

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“A direita está tentando destruir tudo que fizemos. Aqui no Brasil nós vamos ter de levantar a cabeça e lutar. Não é possível que um país do tamanho do Brasil tenha o desprazer de ter no governo um miliciano responsável direto pela violência contra o povo pobre, responsáveis pela morte da Marielle, responsável pelo impeachment da Dilma, responsáveis por mentirem a meu respeito”, afirmou Lula. A Polícia Federal não aceitou o pedido e afirmou que não houve uma postura que “configure crime previsto na Lei de Segurança Nacional."

O Brasil de Fato compilou dados utilizando o critério de busca à Lei n º 7.170, de 14 de dezembro de 1983, que define os crimes contra a segurança nacional / Arte: Fernando Bertolo/Brasil de Fato

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Uso político

Juristas costumam criticar a lei por ser vaga e passível de interpretações diversas, o que autorizaria o uso de seu texto para “intimidações políticas”. “Ela é muito vaga nos conceitos, então permite que uma expressão contra o presidente da República seja interpretada como uma difamação. Ela permite, por exemplo, que uma manifestação pacífica se torne um crime”, explica Uchôa.

Em seu primeiro artigo, a LSN determina que estão sujeitos à penalidade os que “lesarem” ou expuserem “perigo de lesão” a integridade territorial e a soberania nacional, bem como os chefes dos poderes da União. Para Fernando Hideo, advogado criminalista, a lei deveria ser extinta.

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“É uma lei que dá margem para esse tipo de perseguição, pelo caráter aberto dos tipos penais, por não descrever adequadamente as condutas que poderiam atentar contra a existência do Estado de Direito. Essa legislação acaba, naturalmente, sendo manipulada para intimidação política. Ela é incompatível com a Constituição de 1988, ela não pode sobreviver em um Estado democrático de Direito”, explica o defensor.

Membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, a advogada Luzia Paula Cantal condena a “vulgarização desta quantidade exagerada de inquéritos” no período da gestão do atual presidente.

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“A partir do Governo Bolsonaro, especialmente durante o ano de 2020, presenciamos o uso intenso deste dispositivo legal, na tentativa de calar grupos políticos ou cidadão contrários ao Governo Bolsonaro. A LSN, não estabelece parâmetros precisos capazes de garantir o exercício à liberdade de expressão e a liberdade de manifestação. O Estado não pode utilizar a LSN para impor a restrição da liberdade de expressão ou a censura”, finaliza.

Os dados da Polícia Federal mostram que o número começa a subir em 2015, quando 13 inquéritos foram abertos com base na LSN. Hideo pondera que esse crescimento tem ligação com o animoso clima político do país e as frequentes manifestações de rua.

“Percebemos que desde junho de 2013, com os protestos populares que foram manipulados pelos setores hegemônicos, para desaguar nessa suposta luta contra a corrupção, que resultou na Lava-Jato, no impeachment da Dilma Rousseff e na prisão de Lula, mas fato é que essa crise política instaurada desde 2013 fomentou os protestos populares e a resposta à eles tem sido, frequentemente, a Lei de Segurança Nacional”, explica.

Histórico

Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 2000, nove agricultores do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) do Paraná e outros dois no Mato Grosso, foram enquadrados na LSN, por conta de uma série de ocupações de prédios públicos. O pedido partiu do ministro da Justiça à época, José Gregori.

Mas em 2006 veio o inquérito mais emblemático, quando o Ministério Público Federal propôs um inquérito contra 116 militantes do Movimento pela Libertação dos Sem Terra (MLST), quando o grupo ocupou as galerias da Câmara dos Deputados e entrou em confronto com os seguranças da Casa.

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